O paranormal não vem para nossa realidade de maneira fácil, ou pelo menos era assim que devia ser. Enfrentar aquilo que vem do outro lado da membrana não é uma escolha; é uma maldição.
Depois de todos os membros do grupo se reunirem, Edy começou a falar:
- Bem, vocês já sabem por que estão aqui. Se vieram, é porque acreditam em mim ou querem provar algo para alguém - ou para si mesmos. O plano é o seguinte: vamos invadir a escola agora para gravar um vídeo que mostre para a Júlia que não tem nada de sobrenatural lá - disse Edy, levantando uma pequena câmera.
- Pô... Po... Porra, velho. Agora mesmo? De noi... No... Noite, velho? Puta que pariu - disse Simão, indignado.
- E como a gente faria isso de dia, inteligentão? À noite é a única solução para não sermos vistos - retrucou Deniz, com os braços cruzados.
- Exatamente. Que bom que você consegue entender minha linha de raciocínio. Mas existe um porém: mesmo sendo à noite, ainda existe a possibilidade de sermos pegos. Então quero saber se vocês realmente estão dentro. Se não estiverem, estão livres para dar meia-volta e voltar para casa - disse Edy com um olhar muito sério.
Na minha mente, passavam todos os pensamentos das situações que presenciei nesses dias: a menina de cabelos negros... A névoa estranha... Aqueles papéis esquisitos do orfanato... Quem é Caim? Quem é a cobaia 01? Santo, labirinto, berço?
Os pensamentos me devoravam, mas por instinto minha boca se moveu sozinha, e dela saiu uma frase:
- Eu irei com você.
Um silêncio acompanhou as cabeças de todos ao me encararem. O vento zunia como um apito, rodando a praça, e junto com ele uma outra frase ecoou:
- Conte comigo - disse Stanley, estendendo o punho cerrado, esperando que todos nós fizéssemos o mesmo.
- Também irei - disse Daniel, aproximando-se e fazendo o mesmo gesto que Stanley.
- É o je... Jeito, né, velho? - Simão cedeu, estendendo o punho e roçando-o contra os de Daniel e Stanley.
Diper e Deniz não disseram nada, mas também encostaram seus punhos aos dos outros.
Ao ver essa cena, o sentimento de euforia - que mais se assemelhava a um fogo queimando toda a minha alma - voltou. Naquele momento, eu entendi: se nessa merda de cidade existe algum tipo de força maligna, só nós temos o potencial de erradicá-la da face da Terra.
Fecho meus punhos e os estendo, tocando-os contra os dos outros. Todos olhamos para Edy, esperando que ele, como líder, retribuísse o cumprimento.
- Nos campos de batalha, foram forjadas muitas frases. Mas, em meus estudos sobre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, uma me chamou mais atenção. Ela dizia: "Se ganhamos, ganhamos juntos. Se perdemos, perdemos juntos" - disse Edy, levantando seu punho.
O vento na praça nos cobria como um grande lençol. As árvores balançavam tão agressivamente que o barulho das folhas se assemelhava ao trote de soldados marchando para a glória eterna.
- Até provarmos para Júlia que não existe nada naquela escola, custe o que custar, aconteça o que acontecer... Somos "irmãos" de guerra - disse Edy, girando o punho nos nossos, retribuindo o cumprimento e selando a promessa.
- Irmãos de guerra - repetimos em uníssono, também selando a promessa.
Com essas palavras de nosso líder, seguimos em direção à escola.
Depois de uns 40 minutos de caminhada, avistamos um grande e velho portão que indicava que tínhamos chegado à frente da escola.
Edy foi até o portão e o balançou, verificando se estava trancado.
- É, está fechado. Vocês se garantem pulando o muro? - disse ele, olhando para o grande muro que cercava a escola.
- Se formos pular, devemos ir pelos fundos. Pelo menos tem menos chance de sermos vistos - disse Diper, começando a se dirigir para os fundos da escola.
Todos o acompanhamos, e logo chegamos até lá. Nos entreolhamos e balançamos a cabeça como um sinal de "É agora ou nunca".
Com a ajuda de Deniz, consegui me agarrar no topo do muro, me sentei e estendi a mão para ajudar os outros a subirem.
Deniz, Edy e Daniel conseguiram subir com muita facilidade. Já os outros foram um desafio completo.
Stanly e Diper só conseguiram chegar ao topo do muro com os esforços conjuntos meus e de Daniel. Nós dois os puxamos, um de cada vez, com todas as forças que tínhamos. Mas quando foi a vez de Simão, nem com ele pulando com toda a força conseguia alcançar nossas mãos. Deniz precisou descer e fazer cavalinho para Simão, que, com muito esforço, conseguiu chegar ao topo - apenas para cair desastrosamente para dentro da escola, empurrando a mim e a Daniel no processo.
- Ai! - exclamei, levantando do chão e colocando a mão na cabeça.
- Rapaz, eu não digo é nada - disse Daniel, levantando-se com uma expressão de ódio.
Ao mesmo tempo, Deniz chegava ao topo do muro e via a cena de nós três no chão.
- É nada! Kkkkkkkkkkkkk - gargalhou Deniz, descendo o muro para dentro da escola.
- Ra... Rapaz... Olha aonde eu... Eu... Tô me metendo. Era melhor eu ter ficado em ca... Ca... Casa assistindo Boku no Pico... o... o... não, quer dizer Boku no Hero - disse Simão, levantando-se e ficando vermelho de vergonha.
- Silêncio, rapaziada. Vamos logo. Pelo que eu sei, eles deixam a porta principal aberta. Vai entender por quê acham que ninguém vai roubar essa escola nesse fim de mundo - disse Edy.
Assim que nos recompomos, seguimos até a porta principal. E, realmente, ela estava aberta, com as luzes todas acesas.
Logo que entramos, Edy puxou a pequena câmera e começou a gravar. Andamos um pouco pelos corredores, registrando sala por sala.
A escola tinha a mesma aparência de sempre, mas a diferença era que, à noite, o vento zunia, nos deixando alerta a qualquer barulho.
Tudo parecia normal até chegarmos ao pátio da escola. Uma sensação de medo me tomou ao ver que um véu fino de neblina estava se formando aos poucos. Com ele, veio novamente a ardência nas cicatrizes.
- Não... Não... Parem de doer - disse eu, coçando agressivamente meus braços enrolados com ataduras.
- Paulo, aconteceu alguma coisa? - perguntou Edy, tocando de leve meu ombro.
E então, com um grande barulho, as luzes da escola se apagaram, deixando-nos em um enorme breu.
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Marcado pela morte
HororPaulo Cezar é um jovem com uma infância marcada por cicatrizes e memórias sombrias, vivendo em um orfanato pacato no interior de Minas Gerais. Quando a tranquilidade da pequena cidade é quebrada por uma presença inexplicável, ele descobre que o para...