Parte III

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Com quarenta anos, Aline Moraes dominava os palcos. Uma estrela, como diziam os jornalistas. Por onde passava, ela irradiava uma luz de simpatia e talento. Nem mesmo a recente viuvez pôde eclipsá-la. Porém, nos últimos dias, Aline estava em apuros. De forma assustadoramente rápida, a estrela estava colapsando. De estrela para buraco negro, tragando tudo o que estiver ao redor... Era a analogia perfeita para as gazetas matinais, caso soubessem de tudo.
As lembranças de um passado distante voltaram. Um antigo monstro adormecido despertou das cinzas como uma fênix avassaladora. Aline não conseguia nem mesmo dormir, pois, ao fechar os olhos, um terrível pesadelo a consumia. Seu agente estava certo, fugir só pioraria as coisas.
Eu o criei. Ele só existe por minha causa.
Só eu posso mandá-lo embora.
Após passar mais uma noite num hotel qualquer da cidade, Aline resolveu acabar com aquele joguinho de chantagem. Sair correndo foi uma ideia estúpida. Como antes, ela usaria sua inteligência para virar a mesa, já o tinha derrubado uma vez há anos. Posso fazer de novo. Aline não permitiria que o monstro destruísse seu recente império, por isso formulou um plano e telefonou para seu agente, orientando-o sobre os passos difíceis que os dois tomariam nas próximas horas. Logo depois, fez outra ligação e marcou o encontro que iria pôr fim em toda aquela desventura.
— Sei que você me procura há tempos, Patrícia.
— Não acredito — a voz do outro lado da linha ficou estridente. — A grande Aline Moraes ligou para mim?! Meu Deus. Socorro. Desculpe, estou excitada.
— Sei que você passou os últimos anos da sua vida me procurando.
— Meu Deus, não estou acreditando que estou falando com a Moraes.
— Acredite, sou eu. Liguei porque preciso da sua ajuda.
— Diga. Faço qualquer coisa. Eu até mato por você.
— Estou contando com isso.
Silêncio.
— Diga. Eu faço.
— Os detalhes eu conto pessoalmente, mas já adianto o básico por aqui. Preciso que amanhã você vá até minha casa... Espere, vou passar o endereço...
— Não precisa — a voz ficou quase muda — Quero dizer, eu descobri há alguns dias. Desculpe. Tenho ido lá, mas nunca te encontro. Como não respondia minhas cartas, telefonemas, resolvi contatá-la de forma direta. Eu sei que sou insistente, mas é porque te amo. Ai, estou falando demais. Desculpe.
— Não se preocupe. Só vá para lá.
— É...
— Você tem ido com muita frequência?
— Sim. Se eu aparecer lá de novo, talvez sua empregada até me mate.
— Estou contando com isso também.

O Retorno do MonstroOnde histórias criam vida. Descubra agora