Capítulo 1

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Sentia-se exausta. Os olhos esverdeados pesavam com o sono, e mesmo que ainda tivesse tarefas para terminar, era como se fosse impossível levantar do conforto de seus lençóis.

- ALGUÉM FAZ ESSA GAROTA CALAR A BOCA? - O resto de paz foi retirado do interior da menina com o grito estridente de seu pai.

Ainda que exercesse a função de síndico do condomínio por anos, o homem de estatura alta e cabelos morenos nunca havia dado sequer uma multa, sobrando sempre para a garota de cabelos laranja.

Levantou-se, arrastando o corpo sonolento para fora do apartamento, avistando o elevador no final do corredor escuro, mas os barulhos repentinos pareciam vir de outro local, era o vizinho do número 92.

A campainha soou e quarenta segundos foram o máximo que Alice aguardou. Girando os calcanhares prestes a voltar para sua querida cama, as duas portas foram abertas em sincronia, e ela recuou, olhando para a figura encostada no batente de madeira.

- Oi? - um sorriso de lado estava estampado no rosto de um rapaz aparentemente mais velho, que vestia um moletom e tinha seus cabelos loiros ajeitados em um topete. Além de seus olhos azuis, que a fitavam curiosos, provavelmente pensando o porquê de alguém tocar a campainha a essa hora, mas afinal, quem estava gritando não era Alice. Mas espera, não era uma garota gritando?

- V-Vocês poderiam, p-por gentileza, diminuir o barulho? Eu tenho aula amanhã e meu sono é leve, não consigo dormir - tentou dar o sorriso mais simpático possível. Sem saber para onde olhar achou que seus pés estavam bem mais atraentes que em qualquer outro momento de sua vida.

- É o meu trabalho, eu não posso fazer muito por isso, mas posso tentar diminuir o volume, é só isso que você queria mesmo? - segurou a maçaneta visivelmente apressado para voltar ao seu, agora rotulado, trabalho, seja lá o que ele fosse com aqueles gritos, Alice realmente não gostaria de saber do que se tratava.

- Ah, era sim. Obrigada de qualquer forma, boa noite!

O resto das horas dormidas foram tranquilas, e era possível ouvir os pequenos barulhos da rua, fazendo com que nada pudesse atrapalhar o descanso da menina.

Como num piscar de olhos, o dia clareou, as janelas se encontravam todas abertas, seu pai apoiava o celular no ombro enquanto se servia de café e sua mãe, com sua delicadeza matinal, acabava de dar uma banana amassada para a pequena bolotinha sentada em seu colo, o irmão menor.

Três dias haviam se passado desde que o silêncio pairava no apartamento de número 92. Três dias desde que, Alice, conseguira dormir deliciosamente sem ao menos despertar. A garota singela já estava considerando até, ir agradecer o dono dos olhos azuis e cabelos perfeitamente alinhados.

Riu sozinha e logo despertou de seus devaneios ao avistar a porta de seu elevador, escancarada. Adentrou o mesmo e tocou no número 9, o número de seu andar. De relance, e como costume, a garota virou-se para o espelho e se arrumou, depois de checar tudo, murmurou um "ok" e voltou-se para a porta por saber que já estava chegando em seu andar. O elevador parou e então a ruiva o deixou. Logo ela podia avistar o apartamento de número 91, que por acaso, era o seu. E o de número 92.

Alice olhou curiosa e como um flashback lembrou-se da noite de três dias atrás, onde, naquela porta, revelou-se o dono da voz tão estridente. Como outro flashback, lembrou-se do garoto dizendo que o excesso de barulho, era devido ao seu trabalho. Simplesmente não entrava na cabeça da garota, que um garoto de, no máximo, dezenove anos, pudesse trabalhar em algo que o fizesse gritar de uma forma ensurdecedora.

Voltou à realidade encarando a porta de seu apartamento. Virou-se e apanhou as chaves que estavam em seu bolso esquerdo. Com delicadeza girou-as e logo fora revelada sua moradia. Jogou brutalmente sua mochila em qualquer canto e desconectou os fones de seu celular indo em direção à cozinha, apertada, porém aconchegante, de sua casa.

The Neighbors || CellbitOnde histórias criam vida. Descubra agora