O reencontro

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   Sábado... o dia do grande reencontro entre mãe e filha. O dia que terei que relembrar muitas coisas que passarão na minha mente quando eu vê-la. Coisas que eu, se pudesse, nunca mais voltaria a lembrar, coisas que eu jamais conseguiria perdoar. Jamais...

   Espero Aaron pacientemente, que prometeu ir comigo, para podermos ir logo, e voltarmos o mais rápido possível. Não pretendo ficar mais que o necessário, pois mal consigo olhar pra ela nos ultimos anos. Não depois de saber...

   Depois de alguns minutos de espera, Aaron chega, e vamos direto pra lá, sem trocar uma palavra sequer sobre assunto algum. Acho que ele percebou o meu rosto de poucos amigos nesse dia, pois todos os meus sentimentos ficam estampados em minha face, não consigo esconde-los, por mais que eu tente. E então chegamos... ao Internato para Alcoólicos e Dependentes Químicos, ou simplismente I.A.D.Q.

   Entramos, e vamos em direção á recepção. E digo:
  
   -Oi. Vim para a visita eventual de Samanta Winters. Meu nome é Kaylee... Kayle Winters.
  
   -Claro, ela está lhe esperando, quarto 13. -Ele responde- Quer que eu solicite a presença de seguranças?

  -Não será necessário. Sei onde fica. Vamos Aaron.

   Passamos por um corredor totalmente branco, onde ficam os pacientes violentos, internados contra sua própria vontade, com solicitação medica, e lá é onde ela fica. As portas são totalmente fechadas, apenas com uma minúscula janela para circular ar, e um espaço no meio da porta, provavelmente para o transporte de alimentos. E então, no final do corredor sem saída, vejo o quarto 13. E fico paralisada, tomando coragem, fôlego, sem saber ao certo o que fazer agora. E então, Aaron me abraça, do nada. Seus abraços são confortantes, quentes, macios. E ele diz:
   -Está tudo bem, eu estou aqui. Não vou deixar nada acontecer.
Me sinto sortuda por ter trago ele comigo, aliás, me sinto sortuda por ter conhecido ele. E com essas palavras, tomo impulso e entro, para dar de cara com a mulher que me fez ter horríveis pesadelos.

[...]

   -Olá querida. Quem é seu novo amigo? -Diz a pessoa que se entitula ser minha mãe.

   -Ele não é só um amigo. Seu nome é Aaron. - respondo, sem olhar para ele, pois não queria que visse meu rosto agora. - Aaron, esta é minha... é Samanta. Minha mãe. - completo, com um tom amargo.

   -Oi. Prazer. -Diz Aaron, por mais educação do que por vontade própria.

   -Contou pra ele, não foi? - pergunta Samanta

   -Não foi necessário. Mas vou falar. - Antes que ela implorasse que não, que estava arrependida, e tudo mais, eu termino - Ela assassinou meu pai. A única pessoa da família que realmente me aceitava, me amava do jeito que sou. -Aumento o tom de voz agora - E tudo isso só porque achou que ele a traia, e o pior é que estava errada. - Estou gritando agora, solto insultos contra ela. - Maldita, você merece ser presa, eu te odeio, você nunca será minha mãe. Todos os seus aniversários eu venho por pena, pena de quem você é. - Solto berros -Não sinto nada além disso. Só pena. Você nunca me amou, nem amará, sempre tinha seus amantes para dar atenção, e comprava meu silêncio com bonecas, e um simples toque na cabeça, que era o máximo que você chegava de carinho.
   "Sempre tinha os seus amantes para me substituir, e quando achou que o papai tinha uma, o matou, e nunca te pegaram. Mas eu estava lá, sei a verdade. E um dia, eu prometo, vou lhe entregar para a polícia. Desgraçada."

   Um segurança chega, provavelmente porque ouviu meus berros, e nos manda se retirar imediatamente. Não faço isso. Vou pra mais perto dela, e ela me olha com um ar de sorriso irônico no rosto, aquele olhar que eu conheço bem. O olhar de "Você não é nada pra mim". E então, cuspo nela, e digo
   -Você jamais vai ser nada para mim.
   Viro as costas, e vou embora.

[...]

   -Eu sinto muito por tudo que você passou. - diz Aaron, sentado em meu sofá.

   -Não sinta. - respondo - Você é a razão de eu conseguir falar o que falei. Obrigada. Eu realmente precisava dizer aquilo, não aguentava mais.

   -Eu não fiz nada, apenas despertei um outro lado seu que você mesma não conhecia. -Ele responde, e sorri de lado.

   Tantas coisas se passam na minha cabeça nesse momento, comigo sozinha com Aaron, me lembro agora quando ele falou que gostava de mim, e hoje, quando o apresentei como mais que um amigo. Ele é realmente mais do que um amigo agora não é? É como ele disse uma vez... com o tempo irei saber... Outra coisa que passa na minha cabeça agora são todas as coisas que falei para Samanta hoje, mas não me arrependo de nada do que disse, apenas penso no quão confiante me senti durante aquele pequeno tempo, no quão radical foi a minha mudança de uns tempos pra cá. Graças a Aaron, o rapaz misterioso a quem sinto que devo minha vida agora, pois ele está mudando a minha, e sinto que ainda tenho muito o que mudar.

   -Entendi os seus motivos pra não ser a fã número um da sua mãe.      
   -Diz Aaron, claramente mudando o clima das coisas. -Tenho novidades sobre nosso "amiguinho" Taylor.
Peço para que ele diga tudo. E ele responde:

   -Irei começar a observar a rotina dele, coisas que gosta, que não gosta, alergias, doenças, namoradas, entre outras coisas que ele pode ter. E quando ele estiver sozinho, estaremos lá o esperando.

   -Sempre com ideias inovadoras. -Elogio.

   E passamos algumas horas conversando sobre como iriamos fazer, e sempre entrando em um desacordo, e decidimos então que terminariamos de falar sobre isso amanhã, na casa dele, onde vou pela primeira vez.

[...]

   Na porta, me despeço de Aaron e o vejo partir, toda hora olhando para trás sorrindo para mim. E estou prestes a fechar a porta quando o perco de vista, até que ele aparece... Não era Aaron... eu o vejo, alto, com um capuz cobrindo seu rosto com a sombra, e ele está lá, parado do outro lado da rua, sei que olha para mim. Usava as mesmas roupas daquela noite... eu começo a tremer. Como é possivel? Não pode ser, não tem como... isso é impossível. Deve ser alguem brincando comigo. Mas então, ele atravessa a rua, fica frente a frente comigo, e sussurra em meu ouvido. Com sua voz fria, trêmula, porem ao mesmo tempo firme:

   -Olá doce Kaylee. Quanto tempo. Você não faz ideia do quanto eu espero isso... Há alguns anos já... não é mesmo?

   Fecho a porta em desespero, espantada. Não podia ser, isso é impossível. E então ouço a sua gargalhada única, e nessa hora, tenho certeza que é ele. E ele diz, do outro lado da porta:

   -Não será esta noite querida. Até mais.

   E vai embora. E eu, vou me deitar para dormir. E quando pego no sono, começam os pesadelos, me lembrando do que fiz. E do que vou fazer.

Os AnônimosOnde histórias criam vida. Descubra agora