The dark side of personality

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"Por detrás da alegria e do riso, pode haver uma natureza vulgar, dura e insensível. Mas, por detrás do sofrimento, há sempre sofrimento. Ao contrário do prazer, a dor não tem máscara."

Ler uma das citações dispostas no livreto que Klaus me dera já havia se tornado um hábito matinal. Era automático. Ao acordar, minhas mãos iam diretamente para o livro, quiescente na mesinha de estudo do quarto. A frase do célebre britânico Oscar Fingal O'Flahertie Wills Wilde, ou simplesmente Oscar Wilde, havia sido a afortunada do dia. Interpretá-la seria algo realmente fácil, não era necessário ser um gênio para fazê-lo.

O que mais me preocupava era o fato de que as frases ali contidas sempre conseguiam, de uma certa forma, relacionar-se com os acontecimentos da minha vida. O que o futuro estava reservando para mim dessa vez? Eu precisava conversar com Klaus o mais breve possível. Tinha a necessidade de questioná-lo sobre os possíveis poderes mágicos contidos entre aquelas páginas. Era inevitável passar a imaginar se tal capacidade premonitória teria se manifestado para ele também.

Já eram sete horas, e eu continuava trancafiada no que era o meu quarto – por iniciativa própria, é claro. Ally, pontual como sempre, deveria estar saindo para o trabalho nesse minuto. E eu fico muito triste em dizer isso, mas não fazia nenhuma questão de esbarrar com ela naquela manhã.

Na noite anterior, logo que cheguei da minha frustrada visita à Clifton Suspension Bridge, fui obrigada a ouvir um longo sermão da minha amiga. Ela estava irritadíssima por não ter nenhuma de suas chamadas atendidas ou retornadas, e eu até entendia a sua posição. Não deveria ser nada agradável ficar pensando em mil coisas que poderiam acontecer com a sua hóspede desaparecida, que não conhece praticamente nada da cidade. Sei que deveria estar contente por ser agraciada pela vida com um ser que se preocupa tanto comigo. Porém, caso trocássemos de lugar, tenho certeza que você se sentiria da mesma forma que eu.

Veja bem, tinha 26 anos e não apenas 6. Por um lado, compreendia que fora uma irresponsabilidade minha não ter recarregado a bateria do celular antes de sair de casa, mas, pelo outro, uma vez que o leite foi derramado, não havia mais nada que pudesse ser feito. Sinceramente, eu não merecia ser repreendida pelo ocorrido.

Permanecendo calada, somente escutei todo o seu falatório por um bom tempo. Nós duas não chegamos a discutir, até porque não seria justo que eu pleiteasse com ela. Mas, para finalizar toda a questão, acabei soltando um "Relaxe, Ally, você não é mãe ainda". O que, da minha parte, era uma tremenda grosseria, visto que eu sabia o quanto aquela simples frase poderia afetá-la. Primeiro, minha amiga era completamente tomada por um instinto protetor e estava só temerosa sobre o que poderia ter acontecido comigo. Segundo, eu estava hospedada na casa dela, não deveria abrir a boca para absolutamente nada. Terceiro, Ally havia sofrido um aborto espontâneo três anos atrás, antes de deixar New York, e eu havia sido uma vaca ao fazê-la lembrar daquilo, mesmo que indiretamente.

Imediatamente, eu havia tentado reparar a minha fala. No entanto, ela logo respondeu que estava tudo bem e que eu tinha razão, recolhendo-se para o seu quarto em seguida. Eu era uma estúpida, uma péssima amiga.

Deixando os pensamentos sobre o dia anterior de lado, retirei-me do quarto e segui para o banheiro, como de costume. Com o fim do mês de fevereiro se aproximando, o clima passava a tornar-se mais ameno, então me arrisquei a usar apenas um vestido de mangas longas. Ainda que ele fosse feito por um material mais pesado e grosso, propenso a ser usado em temperaturas mais baixas, continuava sendo ousado e incômodo deixar as pernas expostas. A mesa, mais uma vez, estava pronta e coberta de alimentos. Agradeci mentalmente Ally por seu feito, e não perdi tempo para sentar-me e começar a degustar cada iguaria a minha disposição.

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