Morgana

Cinco

Ana

Cara, como isso poderia ser tão estranho? Estava sentada na minha cama
agora, pensando que tipo de bilhete posso deixar para meu pai. Ele não sabe
que minha mãe é uma bruxa, tampouco que eu sou.
— Oh, céus!!! — disse me jogando de costas na cama.
Fly tinha dito que minha aparência ia mudar, ou melhor, já estava
mudando. Caminhei devagar até a parede de espelhos que ia do chão ao
teto. Quando finalmente me encontrei diante dele, não acreditei na imagem
ali refletida. A garota que me encarava dali de dentro tinha a minha pele,
a minha boca, o meu nariz, os mesmos cabelos levemente ondulados, mas
agora esses cabelos estavam brancos, não grisalhos, literalmente brancos.
Meus olhos, se é que eu podia dizer assim, estavam... roxos. Continuei a
me olhar, eu não era o tipo de ser que daria medo às crianças, acho que
elas facilmente me confundiriam com uma princesa — sorri com a ideia —
modéstia à parte eu estava linda.
Logo em cima da escrivaninha no meu quarto estava alguns papéis que
eu usava para desenhar, peguei um deles e uma caneta azul, a cor que
significava que eu estava bem, e comecei a inventar algumas desculpas.
Dex disse que ele não pode saber a verdade.
~ Oi, pai. Não sei como lhe dizer isso, mas preciso de um tempo para
mim. Essa sua mania de colocar cada dia uma mulher diferente em casa
não me agrada muito. Preciso de um tempo para entender o porquê você
é assim, para entender onde me encaixo nessa história. A culpa não é sua,
sei que precisa de um escape desde que mamãe se foi e eu quero respeitar
isso, por isso tenho que entender, e aqui não vai dar, com essas mulheres na
minha casa não vai dar. Caneta azul, lembra? Significa que eu estou bem.
Ana ~
Talvez não fosse certo falar assim com ele, mas essa era uma boa desculpa
para justificar minha saída de casa. Fui dura com ele, eu sei, mas ele sabe
que isso nunca me agradou, e se tem um motivo que me faria sair assim, era
esse, com certeza.
— Espero que seja o suficiente — respirei fundo.
Ainda estava com a roupa que tinha ido ao Weapon. Calça jeans e botas.
Troquei a blusa por uma mais grossa, não sei como é o clima lá, coloquei uma
blusa de frio. Meus cabelos brancos já passavam da cintura, me perguntava
quando iam parar de crescer. Peguei o bilhete e coloquei sobre minha cama.
Olhei para o meu quarto, não sei quando ia vê-lo outra vez, pisquei algumas
vezes para não chorar. “Morgana, seja corajosa”. Saí pela janela.

Fly

Exatamente quando o sol ameaçava sair, Ana saiu do jardim. Seu cabelo
estava longo e branco, eu sabia que ele ia mudar. Ela parecia abatida, e apesar
de tudo senti pena dela.
— Vamos? — Ela disse com a voz firme.
De certa forma eu sabia que tudo aquilo era show, por dentro ela estava
destruída, mesmo que nunca tenha passado por essas “crises adolescentes”, sabia
que ela estava sofrendo, a traição da amiga e do namorado, ser uma bruxa, sair
sem saber quando volta, sem se despedir do pai. Muita coisa por um dia.
Como se não tivéssemos ouvido da primeira vez, ela repetiu, mais alto e
mais perto da gente dessa vez.
— Vamos? — Ela disse e Dex piscou várias vezes como se estivesse saindo
de um transe.
— Ahn... Vamos, claro!
— E como exatamente nós “vamos”? — Não sei se era em legítima defesa,
mas Ana estava alterada.
— Oh, meu Deus!!! Esqueci de chamar a carruagem! — disse ironicamente.
Ela me fuzilou com os olhos. E acho que, com certeza, não estou no topo
da lista das criaturas preferidas de Morgana. Mas tudo bem, ela também não
estava na minha.
— Fly, por favor? — Dex resmungou. — Somos seres fantásticos, Morgana,
não teria graça se isso não significasse um pouco de magia.
Dex pegou sua varinha e sussurrou o feitiço, depois começou a girar a
varinha em sentido horário cada vez mais rápido, até que a luz que dela
saía formou um círculo por si só, foi quando o portal começou a surgir, era
gelatinoso e tinha uma cor rosa bebê. Quando finalmente o portal se firmou,
ele olhou para Ana que parecia perplexa.
— Gostou? — Ela olhou para ele e sorriu, ele sorriu de volta para ela, e isso tudo
já estava me dando azia.