Volta ao clube de teatro

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Mesmo que já tenha se passado mais de uma semana depois que tudo isso aconteceu, e tivesse decidido que eu voltaria para o clube, ninguém mais tocava mais no assunto comigo. Eu sentia uma certa paz, talvez seja porque eu não tive mais nenhuma perturbação da parte do Rodrigo, mas eu não sei, eu deveria estar feliz, porém eu não estou, é como se tivesse faltando algo em mim.
Bia- Jú, Júlia, Juúliaaa- Bia está me chamando.
Júlia- O que foi Bia?- demoro um tempo até respondê-la.
Bia- Faz um tempo que estou te chamando, estou do seu lado, mas você parece tão distante. Você está bem?
Júlia- Sim, estou bem, o que você queria mesmo?
Bia- Eu queria sua régua emprestada.
Júlia- Tudo bem, está dentro da minha mochila, vou pegar- me viro para pegar a régua, mas percebo que estou abrindo a mochila de outra pessoa.
Rodrigo- O que você está fazendo?
Júlia- Desculpa, eu ainda estou dormindo, confundi com a minha mochila- dou uma risada sem graça.
Rodrigo- Tudo bem- ele fala tão calmamente.
Depois de alguns dias, essas foram as nossas únicas palavras. Nunca fomos amigos de verdade. Mas, era estranho, não parecia a mesma pessoa com quem eu vivia brigando a semana passada. Éramos completamente desconhecidos, mais do que antes. Mas, por que eu estou me preocupando com isso? Eu deveria estar feliz por ele não estar mais me perturbando?
Bia- A régua? Você vai me emprestar?
Júlia- Sim, é claro- entrego distraidamente.
Bia- Jú, você nem começou a fazer os exercícios, já estamos na metade da aula- Bia pega meu caderno e olha espantada.
Júlia- Eu já vou fazer.
Bia- Agora, fala sério, aconteceu alguma coisa?
Júlia- Só estou com um pouco de sono- esfrego a minha mão nos meus olhos.

Logo passa a primeira aula, e na segunda, o professor de português pede para eu buscar alguns livros na biblioteca, e Marcos se oferece para ir junto comigo.
Marcos- Você está bem?
Júlia- Sim. Só estou um pouco distraída hoje, acho que talvez seja sono.
Marcos- Ou talvez esteja preocupada com alguma coisa.
Júlia- Acho que é aquele livro na direita, o primeiro da lista- tento mudar de assunto.
Marcos- Esse mesmo... Mas, o que aconteceu?
Júlia- Não está dando para disfarçar mesmo?- dou um leve sorriso sem graça.
Marcos- Não, sua cara não mente. Bia também percebeu.
Por que ele está se preocupando comigo? Será que foi a Bia que pediu para ele me animar? E, outra, ele senta do meu lado, provavelmente deve ter percebido que estou mal, e como um bom amigo está me ajudando. Mas, se não for isso? E, se ele realmente se preocupa comigo?
Marcos- Você está pensando em algo de novo?
Júlia- Não, não é nada demais- fico vermelha.
Marcos- Mas, o que te incomoda tanto?
Júlia- Você não vai me deixar em paz até eu te falar, né?- estou sorrindo.
Marcos- Não, então me conte- ele sorri de volta.
Júlia- É sobre o clube... Eu, desiste, mas decidi voltar... Quero deixar meu orgulho de lado, porém alguns dias já se passaram eu não falei mais sobre isso, ninguém também não me falou nada. Parece que estou vivendo como se nada tivesse me acontecido.
Marcos- Por que simplesmente não volta?
Júlia- É embaraçoso voltar depois de tudo o que aconteceu.
Marcos- Mas, se não fizer isso, não estará sendo orgulhosa?
Júlia- Sim, mas eu não posso mudar de um dia para o outro- falo alto.
Bibliotecária- Crianças, se forem ficar conversando, voltem para sala- ela fala brava.
Marcos- Desculpe, já estamos terminando de pegar os livros.
Júlia- Só falta mais esse, vamos voltar para sala.
Marcos- Sim... Júlia, volte para o clube.

Eu fico pensando no que Marcos me disse. Se eu deixar que as coisas que aconteceram me impedir de fazer o que eu quero, eu estaria sendo orgulhosa. E, por que eu fiquei esperando as pessoas virem me falar sobre isso? Também fui orgulhosa nesse ponto.
Se por um momento, eu parasse de pensar em tudo. Já estou ficando exausta.
Mal estava conseguindo comer meu lanche no intervalo.
Bia- É difícil você não estar com fome.
Júlia- Bia, por que a gente não conversou mais sobre o clube, desde aquele dia? Por que nem o Marcos?
Bia- Rodrigo nos pediu para não te atormentar mais sobre isso. Eu entendi o que ele quis dizer. Talvez, você precisasse de tempo para pensar, e não seria bom, as pessoas ficarem te pressionando.
Júlia- Muitas coisas aconteceram depois que eu entrei na escola. Mas, tomei uma decisão precipitada sobre o clube.
Bia- Você está pensando em voltar?
Júlia- Sim, eu decidi que vou voltar- falo confiante
Bia- Mas, por que não volta logo?
Júlia- Lembra que eu te disse que sou orgulhosa, talvez isso não me faça voltar.
Bia- Basta você se desculpar com o Rodrigo, e talvez ele te aceite de volta.
Júlia- Mas, talvez um pedido de desculpa não seja o suficiente, eu dei motivos para ele me odiar.
Bia- Você não tem certeza que ele te odeia.
Júlia- Mas, talvez seja impossível ele me aceitar de volta.
Bia- Deixa de dizer tantas vezes "talvez", e faça o que você acha que é o certo a fazer.
Tudo o que a Bia e o Marcos diziam pareciam ter lógica. Mesmo que ele não me aceitasse novamente no clube, eu teria alguma resposta. Mesmo que nada desse certo, pelo menos, a minha parte eu teria feito. Por mais difícil que fosse receber um não, pelo menos eu poderia saber a resposta. E, dessa forma, poderia seguir a minha vida para frente.
Júlia- Vou falar com ele- falo determinada.
Bia- Com o Rodrigo?
Júlia- Sim, vou agora- me levanto do banco.
Bia- Tudo bem, mas assim, tão de repente, eu pensei que você esperaria até acabar as aulas.
Júlia- Se eu esperar até mais tarde, talvez eu não tenha mais coragem. As vezes precisamos agir no impulso... Então, até mais- me retiro rapidamente.
O que estou fazendo? O que vou dizer a ele? Como vou me desculpar? E, se ele não aceitar minhas desculpas? E, se ele zombar de mim? O que vou fazer?
Procuro em todo lugar no pátio da escola, fui até a sala de aula, também o procurei no clube, mas nada, nenhum sinal dele. Perguntei a todos, mas ninguém sabia me responder. Já estava exausta, até que decidi descansar um pouco no jardim, no Recanto das Rosas.
Vi alguém deitado debaixo de uma árvore. Não vou me aproximar, não quero incomodar. Mas, tinha um banco perto, e decidir ir até lá, para sentar. De longe, não consegui reconhecer quem era, mas quando chego mais perto é o Rodrigo. Ele está dormindo, tão sereno, talvez assim, ele parecesse um pouco encantador. Nunca vi ele tão calmo. Quando eu percebo, já estou bem perto dele, quero tocá-lo, quero tocar o seu rosto, acariciar seu cabelo meio bagunçado. Por que? Por que estou me sentindo assim? Minhas mãos mais estão perto do seu rosto, estou quase tocando o, mas eu ouço o sinal da escola. Ele balança a cabeça e abre os olhos, e quando percebe que estou perto dele, ele se assusta.
Rodrigo- O que você está fazendo?
Júlia- Desculpa, me desculpa. Eu não sei- fico envergonhada e me levanto depressa.
Rodrigo- Você queria falar comigo?- ele está me encarando friamente como sempre.
Júlia- Sim, é sobre o clube. Mas, a aula já vai começar, depois a gente se fala.
Rodrigo- Tudo bem, pode falar agora. Se for sobre o clube, o professor não vai se importar de chegarmos arrasados.
Júlia- Bem, é que... É que eu não importo, de ser uma ajudante geral, não me importo de fazer isso no clube.
Rodrigo- Sim, eu entendi. Depois das aulas, você poderá começar a participar do clube... Então, era isso. Está resolvido- ele se afasta, indo embora, enquanto eu ainda continuo parada.
Júlia- Espere- eu falo inesperadamente.
Rodrigo- O que foi?- ele volta a atenção para mim.
Júlia- Me desculpe- falo bem baixinho.
Rodrigo- Hum- ele se vira e começa a ir embora.
Júlia- Me desculpe- eu grito dessa vez.
Rodrigo- Eu já tinha escutado- ele olha novamente para mim.
Júlia- Mas, eu queria dizer claramente... Você não sabe como é difícil para mim, mas eu quero me esforçar em deixar o meu orgulho.
Rodrigo- Já terminou?- novamente me encara com aquele olhar frio.
Júlia- Sim- respondo sem graça.
Eu deveria estar feliz por ter resolvido o problema, mas ainda me sinto mal. É, como se Rodrigo me aceitasse de volta, mas não me quisesse ali, era como se ele tivesse fazendo só como uma obrigação. Eu não entendo. Mas, talvez fosse melhor assim.

Júlia CapuletoOnde histórias criam vida. Descubra agora