Onde tudo começou...

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Não espero que acreditem em tudo que estou contando, aliás, que humano em plena consciência acreditaria na história de um gato? Mas não importa. A verdade é que isso realmente aconteceu. Meu nome é Plutão. Como muitos gatos pretos, sou visto como mau presságio por alguns humanos, mas nunca me importei muito com isso. Afinal, sempre tive uma boa casa e ótimos donos. Meu dono, em especial, é a pessoa de quem mais gosto. Ele comanda a casa e me faz sentir seguro. Mas ultimamente, algo mudou. O cheiro de álcool tomou conta da casa, e as sombras passaram a acompanhá-lo a cada volta. Essas sombras eram espessas e escuras, e com elas vinham sua raiva. A partir disso, ele começou a bater em sua própria esposa, minha querida e amada dona.

Dia após dia, eu via ela chorando, seu corpo sempre com novas manchas, mas eu não sabia como ajudá-la. Então, tentei pensar em maneiras de acalmar seu agressor. Talvez, se eu fosse um gato mais comportado, ele melhorasse:

Fazer xixi na areia, não no tapete;

Comer só ração, sem exigir atum;

Evitar o sofá, para não deixar pêlos por lá;

Me lambuzar mais nos banhos diários;

Ficar mais perto dele... quem sabe estivesse sentindo minha falta.

Até pensei em pedir uma dose extra de carinho, mas sabia que ele não iria gostar.

Então, comecei a colocar o plano em prática, dia após dia, mas algo estava errado. Ele não parecia melhorar. Na verdade, ele fugia de mim, seus olhos cheios de uma raiva que eu não entendia. Ainda assim, pensei que fosse uma fase. Todos passamos por momentos difíceis, certo? Mas logo desisti da minha lista, porque ela não trazia os resultados esperados.

Em uma noite, cansado de ficar em casa, decidi visitar Mel, minha vizinha tão charmosa. Porém, enquanto atravessava o jardim, meu dono apareceu de repente. Me pegou rápido – instintivamente, arranhei ele! Não podia me sujar antes de ver Mel, claro! Mas aí estava meu erro. Não percebi que as sombras o acompanhavam, sussurrando coisas terríveis. Elas o envolveram tão densamente que pensei, por um instante, que seria meu fim. Eu vi aquilo se espalhar nele, uma coisa escura, profunda. E então soube que minhas sete vidas não seriam suficientes para escapar dessa.

O tempo parecia se arrastar enquanto ele me segurava com força. Seus olhos, antes tão familiares, agora eram cheios de ódio. Antes que eu pudesse reagir, ele empunhou um canivete, frio e mortal. E então, em um movimento lento e cruel, ele o cravou em meu olho, arrancando-o de mim com uma precisão terrível.

A dor era insuportável. Gritei, um grito não apenas de dor, mas de traição. Como ele pôde? O humano que eu mais amava, que me fazia sentir seguro... Agora, eu só tinha um buraco vazio no rosto como prova de sua crueldade. Preferia ter encontrado Mel sujo, coberto de poeira, do que perder meu olho para aquele que eu tanto confiava e que agora gargalhava do meu sofrimento, de forma maléfica.

Sangue cobria minha visão.. Desespero e medo tomaram conta de mim, corri. Corri para longe, para me salvar. 

Plutão - O gato pretoOnde histórias criam vida. Descubra agora