3 - A ORAÇÃO COLETIVA

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Embora transportado à maneira de ferido comum, lobriguei o quadro


confortante que se desdobrava à minha vista.


Clarêncio, que se apoiava num cajado de substância luminosa, deteve-


se à frente de grande porta encravada em altos muros, cobertos de


trepadeiras floridas e graciosas. Tateando um ponto da muralha, fez-se

longa abertura, através da qual penetramos, silenciosos.


Branda claridade inundava ali todas as coisas. Ao longe, gracioso foco de luz dava a idéia de um pôr do sol em tardes primaveris. A medida que avançávamos, conseguia identificar preciosas construções, situadas em


extensos jardins.


Ao sinal de Clarêncio, os condutores depuseram, devagarinho, a maca


improvisada. A meus olhos surgiu, então, a porta acolhedora de alvo


edifício, à feição de grande hospital terreno. Dois jovens, envergando


túnicas de níveo linho, acorreram pressurosos ao chamado de meu


benfeitor, e quando me acomodavam num leito de emergência, para me


conduzirem cuidadosamente ao interior, ouvi o generoso ancião


recomendar, carinhoso:
- Guardem nosso tutelado no pavilhão da direita. Esperam agora por mim. Amanhã cedo voltarei a vê-lo.


Enderecei-lhe um olhar de gratidão, ao mesmo tempo que era conduzido a confortável aposento de amplas proporções, ricamente mobilado, onde me ofereceram leito acolhedor.


Envolvendo os dois enfermeiros na vibração do meu reconhecimento,


esforcei-me por lhes dirigir a palavra, conseguindo dizer por fim:


- Amigos, por quem sois, explicai-me em que novo mundo me encontro... De que estrela me vem, agora, esta luz confortadora e brilhante?


Um deles afagou-me a fronte, como se fora conhecido pessoal de


longo tempo e acentuou:


- Estamos nas esferas espirituais vizinhas da Terra, e o Sol que nos


ilumina, neste momento, é o mesmo que nos vivificava o corpo físico. Aqui, entretanto, nossa percepção visual é muito mais rica. A estrela que o Senhor acendeu para os nossos trabalhos terrestres é mais preciosa e bela do que a supomos quando no círculo carnal. Nosso Sol é a divina matriz da vida, e a claridade que irradia provém do Autor da Criação.


Meu ego, como que absorvido em onda de infinito respeito, fixou a luz


branda que invadia o quarto, através das janelas, e perdi-me no curso de


profundas cogitações. Recordei, então, que nunca fixara o Sol, nos dias


terrestres, meditando na imensurável bondade daquele que no-lo concede


para o caminho eterno da vida. Semelhava-me assim ao cego venturoso, que abre os olhos para a Natureza sublime, depois de longos séculos de escuridão.


A essa altura, serviram-me caldo reconfortante, seguido de água muito fresca, que me pareceu portadora de fluidos divinos. Aquela reduzida porção de liquido reanimava-me inesperadamente. Não saberia dizer que espécie de sopa era aquela; se alimentação sedativa, se remédio


salutar. Novas energias amparavam-me a alma, profundas comoções


vibravam-me no espírito.

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