Segunda Parte - Rubens

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Ricardo tinha razão. O inferno começou logo cedo. A cama era estranha. Dura. Não dormi bem. Acordei diversas vezes à noite, fiquei com vontade de sair lá fora para averiguar se as luzes não voltariam. Claro que nem se quer saí da cama.

A janela de meu quarto era voltada para o sul, e por isso fomos poupados da algazarra maior, pois as crianças já estavam na piscina, mas hoje, com crianças ou não, com Suzana e Ricardo ou não, eu iria nadar.

O barulho estava alto; muita conversa, muito ruído de pratos e copos; as risadas já eram incrivelmente altas, e a claridade já me incomodava. Decidi que era hora de levantar. Saí da cama e vi que Evandro dormia como um bebê. Troquei de roupa; estava quente. Coloquei minha sunga, um short jeans, uma camisa clara e fui ao banheiro. Na casa não havia movimento. A porta da cozinha estava aberta e de lá entrava todo barulho e toda luz. Quando saí do banheiro, a música começou. Tudo era muito alegre, mas eu estava sem paciência. Toda aquela barulheira logo cedo me incomodava. Uma porta se abriu atrás de mim. Era Ricardo.

- Já acordou? – disse ele com os olhos papudos de sono. – Eu disse que não dá para dormir.

Sorri de volta.

Fui para fora. A mesa estava pronta, com muitas frutas e sucos. Cumprimentei as pessoas que ali estavam, apesar de não conhecer ninguém. Alguns deles estiveram lá no dia anterior, porém eu nem se quer sabia os nomes. Sentei-me à mesa para tomar café. Olhei para esquerda e me certifiquei que as crianças já estavam nadando. Era cinco para as dez, e pelo movimento parecia ser três da tarde.

- Cadê os meninos? – perguntou Alberto, que já estava com uma latinha de cerveja na mão. – Vai lá acordar eles! – ele abanou a mão livre na direção da casa. Ele falava alto, na verdade quase gritava.

- Não, eles estão vindo aí – falei, sorrindo simpaticamente. Ele deu de ombros e se foi.

Ricardo chegou à mesa no exato instante que Suzana. Continuei comendo meu mamão. Estava com a cabeça longe quando voltei a pensar nas luzes. Elas eram estranhas, porém quando ficou de dia, as coisas mudaram, e eu comecei a achar que tinha exagerado um pouco. Tudo era tão claro e seguro; o céu era tão límpido e imaculado. Por nenhum momento eu duvidei do que vi, ou dei razão às explicações absurdas de Ricardo. Apenas achava que tinha valorizado demais. Talvez eu tivesse exagerado. Naquele momento as luzes não importavam mais. Estava de dia, e eu queria nadar.

Entrei na água, mesmo com as crianças. A piscina não era grande, porém cabia eu e elas muito bem. Apesar de não ser funda, dava para se divertir. Os moleques não gostaram da minha presença no começo, mas logo estavam pedindo para eu jogar a bola pra cá e pra lá. Minha relação com crianças não era ruim, porém eu tinha que estar de bom humor para lidar com elas. E naquela manhã de sexta-feira, meu humor estava ótimo.

Logo meu humor foi abalado. Vi o gol vinho de Mauricio trespassar a porteira. O priminho insuportável tinha chegado. Continuei a brincar com as crianças. Quando Mauricio me viu, acenou com a cabeça, e seus olhos miúdos exalavam superioridade. Ele quase erguia o nariz para me olhar do alto. Deixei-o passar, e o abstrai de minha cabeça.

A música estava mais alta que nunca. Da churrasqueira saía a fumaça das primeiras carnes que ali queimavam. As mulheres estavam sentadas na mesa de refeições, conversando, com um copo de cerveja ao alcance da mão. Não vi Elení, ela devia estar em casa, se certificando de que tudo estava limpo e no seu devido lugar. Os homens estavam perto da churrasqueira, rindo como crianças diante de uma piada suja. Ricardo e Evandro jogavam sinuca. Suzana estava com as mulheres, e reparei que ela olhava impacientemente para seu irmão, como se Evandro pudesse o atacar a qualquer instante. Mauricio estava com as damas.

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