Prólogo - Julieta

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A COISA MAIS difícil na minha opinião é fazer novos amigos. Eu não sou a pessoa mais simpática do mundo ou mesmo uma garota educada que sorri ao dizer obrigada; posso até ser considerada antipática e anti social, mas não me importo muito.

- Meu nome é Julieta Legrand - me apresento à minha nova sala de aula e tento ignorar os olhares quando notam meu sotaque francês carregado.

- Seja bem-vinda - a professora sorri com alegria como se estivesse feliz mesmo. Apenas assinto e me encaminho para a única carteira vazia na sala.

Assim que me sento e ponho a minha mochila encima da mesa, uma garota loura sentada ao meu lado me aborda com um sussurro animado:

- Me chamo Mary Jane, mas pode me chamar de May - ela diz e fica me olhando fixamente.

- Certo - digo por fim e ela sorri ainda mais. Duas garotas na frente e atrás da tal Mary Jane, ambas gêmeas, sorriem também.

- Você é mesmo francesa? - ela pergunta baixinho para não chamar a atenção da professora.

- Sou - respondo ao reprimir minha boca de falar alguma coisa sarcástica.

- Mas você nasceu em Paris? - ela questiona. Isso é tão idiota para se perguntar que eu decido ignorar. - Tudo bem, não precisa responder. Você quer sentar na nossa mesa no refeitório?

Os alunos têm mesas?, me pergunto mentalmente. Eu não sabia que tinha que comprar uma.

- U-hum - murmuro ao perceber que meu plano falhou um pouco. Eu não sabia que tinha que comprar mesas. Putain.

- Você não é muito de falar, não é? - ela indaga depois de uns dez segundos em silêncio. Tenho vontade de retrucar, mas apenas afirmo com a cabeça. - Oh, eu também não sou. Qual é a sua próxima aula?

Ok, está comprovado. Americanos são muito contraditórios. Olho para o relógio no meu pulso.

- Oito e dez - respondo em tom baixo. A professora já nos olhou duas vezes e sinto que não vou querer ser expulsa de sala no meu primeiro dia por causa de uma loura patricinha. - Desculpa, mas eu quero prestar atenção na aula.

- Claro! - ela exclama e se vira para falar com as gêmeas que não param de me olhar, assim como boa parte da sala.

Comprimo os lábios em uma linha fina e descanso meu queixo no punho. Ótimo, era só o que me faltava. Um bando de adolescentes me olhando como se eu fosse um ser de outro país. Sabia que devia ter escolhido ficar com os meus avôs ao invés de vir com o meu pai.

Uma batida ressoa na porta e todos os rostos de voltam para o garoto que a abre. Ele é bonito, quer dizer, para quem gosta dos tipos certinhos e tímidos.

- Ora, Romeu - a professora sorri e eu me pergunto se essa mulher nunca para de sorrir mais e mais. - Olha só que coincidência. Sabe qual o nome da nossa querida novata?

Todos olham do garoto para mim e parecem entender alguma piada, pois riem em uníssono. O garoto cora suavemente e coça a nuca com um sorriso tímido.

- Julieta, será que é o destino operando aqui? - a professora provoca e me dá uma piscadela. Fico impassível e ela desiste de me arrancar um sorriso.

- Trouxe os papéis - o garoto, Romeu, diz e só depois ergue os olhos e me vê.

Meus lábios se entreabrem se surpresa antes que eu tenha qualquer chance de me recompor e é como se o mundo estivesse concentrado completa e inteiramente nos olhos dele. São do mais puro tom de azul, como céu e eu me permito mergulhar naquela imensidão cor de anil. É magnífico e hipnotizante. Ele também parece estar surpreso com alguma coisa e eu acabo quebrando a conexão e desviando o olhar para outra coisa - qualquer outra coisa que não seja ele e seus olhos.

- Romeu? - escuto a professora chamar. - Está tudo bem?

Olho de soslaio para cima e vejo que ele parece tão abalado quanto eu.

- Eu... - ele pigarreia e concentra seu olhar na mulher que o observa preocupada. - Sinto muito. Acho que eu ando muito cansado. Com licença.

Com um último aceno de despedida, ele se vai - e junto com ele, todo o céu de primavera contido em seus olhos espetaculares. A professora encara a porta atônita por um ou dois segundos antes de dar continuidade a aula, mas eu já não presto mais atenção à ela.

- Ele olhou direto para você! - a loura da qual eu já me esqueci o nome cochicha, não de um jeito feliz ou invejoso, mas curioso, como se isso não fosse comum. - Por que ele te olhou?

- Vai saber - digo sem olhar na direção dela.

Eu nunca tinha sentido isso antes. Foi a sensação mais bizarra que eu já tive. Como... Como se eu encarasse um filme inteiro e soube-se como ele terminaria - em uma Julieta de coração partido, com toda certeza -, mas mesmo assim, de alguma forma... Por um momento, um único e belo momento, foi como se eu não conseguisse olhar para nada além dele e da - na hora - nem tão ruim perspectiva de sair magoada se isso significasse que eu teria algum tempo com ele. Que eu poderia conhecê-lo.

Por que raios eu estou pensando nisso?

Toco o meu coração discretamente. Ele parece dar voltas dentro do meu peito e eu me sinto fraca, como se ficar longe daquele rapaz fosse errado e eu dependesse disso. É idiotice, eu sei, mas é muito tentador. E o que esse frio da barriga significa? Não pode ser. Quantas vezes eu vou ter que me machucar para aprender a lição?

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