Capítulo 17

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Observo o homem à minha frente. Sério, uma ruga na testa, barba por fazer, cabelo preto e olhos azuis escuros, tais como os meus. É musculoso e está com o mesmo olhar de sempre. Continua sério enquanto segura o telefone fixo perto do seu ouvido e não desvia os seus olhos assustadores dos meus, que poderiam fazer qualquer um fugir dali a correr ou até mijar-se de medo, mas que a mim não me passava qualquer sensação. Talvez a de raiva ou até saudade da pessoa que ele era antes e que agora era um ser desprezável, que cumpria pena por cometer o maior erro da sua vida. 

Enquanto uma das minhas mãos permanece pousada sobre a mesa fria de ferro, a minha outra mão desliza pela mesma até ao telefone fixo e pega no mesmo, sem desviar o meu olhar do homem que estava do outro lado daquele vidro grosso e que não deixava passar qualquer tipo de som para o outro lado. Dirijo-o na direção de um dos meus ouvidos e fico à espera que aquele ser à minha frente comece a falar. 

- Estava a ver que nunca mais pegavas nessa porcaria e metias ao ouvido! - A sua voz é grossa e severa mas que a mim não me mete qualquer tipo de receio. 

- Dez anos sem nos vermos e é a primeira coisa que me tens a dizer? - Murmurei calmamente sem desviar os meus olhos azuis dos olhos azuis dele.

E então, como se nada tivesse acontecido desde que me sentei naquela cadeira de ferro, fria e nada confortável, ele abre um leve sorriso e fala: 

- Olá filho. Como estás? 

Tentei engolir o nó que se formava na minha garganta mas era impossível. Eu sabia que um dia o teria que encarar, mas podia ser mais tarde...

- Não tens direito em chamar-me de filho... Deixas-te de ser meu pai há muito tempo! - Respondo rigidamente.

- Deixei? Desde quando? - Murmurou curioso. Revirei os olhos e alguma raiva cresceu dentro de mim. Como ele podia estar tão bem?  

- Tu sabes muito bem o porquê...

- Porque matei a tua mãe? 

- E à minha frente, enquanto eu tinha a merda de 10 anos! - Quase gritei. Eu era mesmo assim, muito impulsivo, possessivo e enervava-me muito facilmente. - Como podeste? - Chorar era a única coisa que eu não conseguia fazer... desde que vi a minha mãe no chão, sem vida, rodeada pelo próprio sangue. 

- Ainda és tão miúdo... Não foste seguido por algum psicólogo? 

- Tenho 20 anos... e não tive lá grande infância. - Ironizei. - E sim, fui seguido por vários. 

- Então Philipe cuidou bem de ti... 

- Perfeitamente, a única coisa de boa que me aconteceu e a ele sim, eu chamo de pai. 

- E já conheceste a tua futura noiva? - Porquê que ele muda muito rapidamente de assunto? Ele não é atingido pelo que lhe digo? Talvez já saiba como eu estou...

- Há quatro anos atrás...

- Aposto que ela é lindíssima. Como se chama?

- Por que queres tanto saber? Por que queres tanto que eu me case com uma menina mais nova que eu 12 anos?

- Ela é filha de um grande amigo meu.

- Desde quando é que tens amigos? - Arqueio uma sobrancelha. 

- Desde sempre Enzo. Nunca me conheceste verdadeiramente. 

- Conheço o suficiente para perceber que não tens jeito para seres pai. - Murmuro indignado. 

Ele suspira para o telefone mas continua calmo enquanto me olha do mesmo jeito de quando me sentei naquele cadeira desconfortável. 

- Ela é filha de um homem muito poderoso em Portugal. Tem uma grande gang e quero que cases com ela para reunirem todo o império. - Murmura. - Ficas muito poderoso. E preciso que daqui a alguns anos, quando ela tiver 18 anos, que vás para Portugal viver e cases com ela.

- Eu já sou poderoso sem me casar. 

- Enzo, eu tenho vários inimigos e um deles quer acabar com tudo o que é nosso. É uma história muito complicada de se perceber. 

- Tenho todo o tempo do mundo... Fiquei 10 anos a tentar evitar-te mas agora quero saber de tudo. 

- O meu grande amigo, com a grande gang portuguesa casou-se no mesmo dia em que eu e a tua mãe nos casamos e até fizemos a cerimónia no mesmo local. Combinamos que os nossos filhos se iriam casar, se não desse para fazer um casal heterossexual então um de nós adotava um filho, não que tenhamos alguma coisa contra pessoas homossexuais. - Olha-me. - E um ano depois a tua mãe engravidou, mas não foi de mim mas sim do seu amante, o meu inimigo. Eles já andavam juntos há muito mais tempo em segredo e eu era simplesmente um tapado e apaixonado. No dia em que o bebé nasceu, eu estava a quilómetros da cidade e a caminho do hospital fiquei preso no trânsito não conseguindo chegar a tempo de ver o teu meio-irmão a nascer.

 Engulo em seco. Algo me dizia que aquele conversa não ia ser lá muito agradável. Ele continua a falar:

- Já estava tudo planeado. A tua mãe entregou o bebé ao meu inimigo que o levou para outro hospital e foi lá tratado. Quando cheguei ao hospital, a tua mãe fingiu que chorava e como tinha pago aos médicos, estes me disseram que o bebé tinha qualquer problema e que nasceu morto e que não autorizavam que eu fosse vê-lo. Eu fiquei mal, e fiquei ao lado da tua mãe todos os momentos. Até no funeral, em que eu pensei que o caixão fosse com o nosso filho dentro mas que na verdade ia vazio. Quando tu nasceste foste a alegria na minha vida e passei muitos bons momentos contigo. Eu podia ser perigoso a nível mundial, mas eu amava a minha familia mais que tudo. Mas mais tarde descobri tudo, descobri que a tua mãe me traía com o outro e que aquele filho iria ser utilizado para ficar com tudo o que era meu. E foi por isso que em uma noite eu não aguentei numa discussão com a tua mãe e acabei por matá-la. Eu estava bêbedo e só me apercebi de que estavas a ver tudo quando me virei e estavas a espreitar através da porta do nosso quarto. Enzo, eu não queria que aquilo acontecesse... 

Levantei-me rapidamente não aguentando ouvir tudo aquilo. As minhas mãos tremiam e atirei o telefone contra o vidro mas que nada fez ao mesmo, nem um arranhão. Rapidamente virei-me e saí daquele cubículo já cego pela raiva que me consumia.

Porquê a mim? Porquê eu? 

Só me apetecia gritar, tentar retirar aquela dor no peito e ser feliz. Mas não podia, não conseguia, não tinha esse dom ou poder.

A minha vida era um autêntica merda e agora tudo estava a ficar pior. 


Só queria poder sorrir verdadeiramente pela primeira vez na vida!


☼☼☼


Olá!! 

E então, gostaram do novo capítulo e bastante especial? Espero que sim.

É mais um miminho para poderem perceber melhor a confusão que é a história de Enzo e de Lia. 

Beijão <3



O Meu GangsterOnde histórias criam vida. Descubra agora