06 - Clarie

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Trabalho em grupo. Existe algo que o estudante odeie mais do que isso?

Esse trabalho já é conhecido pela escola inteira. Todos que estão no último ano têm que fazer, e os que estão nos anos anteriores ouvem falar quase toda hora sobre: o trabalho do terceiro ano. "Vocês estão reclamando desse trabalhinho? Esperem até chegar no último ano." era o que todos os professores falavam.

O trabalho consiste em uma mistura de todas as matérias dadas até o momento. É entregue no final do ano, o que significa que temos o ano inteiro para fazer um trabalho gigante que conta cem por cento como a classificação do ultimo bimestre. Não há provas nem avaliações, apenas o trabalho. Seria ótimo se fosse apenas quatro pessoas, já teríamos o grupo inteiro formado - eu, Andy, Daniel e Débora. Ao invés disso temos que formar um grupo com seis pessoas. 

Durante a semana os professores iriam dar-nos o roteiro do que eles pretendiam ver no trabalho. Eu já estava preocupada com quem seria nossos complementos no grupo. Por fim, Andy chamou uma menina meio nerd da nossa turma mas ela tinha grupo. Ethan juntou-se ao nosso grupo.

- Eu não quero ela no nosso grupo. - Andy diz enquanto Milena anda na nossa direção.

- O grupo de vocês já está completo? - ela diz colocando a mão na cintura. - Ou ainda tem uma vaga para mim?

- Já está completo! - Andy diz. - Explodindo até.

No final da aula os professores anotaram os grupos e percebemos que Milena não estava em grupo nenhum. Andy bufa ao meu lado e eu rio com sua total falta de interesse. Havia dois grupos com pessoas a menos, o nosso e o grupo da Sara. Como nenhum dos dois grupos estavam interessados em admitir Milena, o professor fez um sorteio. Maldita seja nossa sorte, ela tirou nosso grupo.

- Ficamos no mesmo grupo, gato. - ela diz para Daniel. - Isso vai ser interessante!

Eu reviro os olhos e dou um leve sorriso ao ver que Daniel não da a minima para ela.

- Talvez isso realmente vai ser interessante. - Andy comenta irônica ao ver minha reação.

A semana voou. Temos todos os roteiros e não faço a menor ideia de por onde começar. Devemos dividir o trabalho para todos em matérias? Ou cada um faz um pouco de cada e no final juntamos? Cada momento alguém protesta sobre a divisão. São 10 matérias e acabamos por decidir que: as matérias que exigem que temos de ir a um determinado lugar vamos fazer todos juntos. Ou seja, vamos passar o dia juntos quando fizermos os trabalhos de História, Artes, Educação Física e Filosofia. As outras seis matérias dividimos entre nós e cada um faz separado e juntamos no final. Assim, ninguém fica sobrecarregado com matéria a mais.

Eu fiquei com química, Daniel com biologia, Andy com Português, Débora com física, Ethan com matemática e Milena com geografia. A minha esperança é que a semana de Páscoa chegue logo, uma semana sem aulas seria ótimo.

- Animada? - Daniel pergunta ao meu lado.

- Eu não faço ideia do que fazer. - digo afundando me nas almofadas do meu sofá.

- Você ficou com química, pode explodir alguma coisa. - ele deita ao meu lado. - Sua cara.

- Engraçadinho. - olho em seus olhos.

Já faz uma semana que nos beijamos e eu me fechei completamente depois disso. Daniel não insistiu mais, acho que ele percebeu meu comportamento. Mas agora, nesse sofá a sós, minha vontade é de beijá-lo até que eu necessite de respirar novamente.

- Uma semana de trabalho e eu já quero socar a cara da Milena. - Andy diz voltando da cozinha.

- O que ela fez agora? - Daniel pergunta e eu me concentro na conversa.

- Ela não tem autonomia para fazer as coisas? - Andy bufa. - Acabou de me ligar para perguntar o que deveria por no trabalho...

- O trabalho é em grupo, faz sentido.

- Geografia é a parte dela. E outra, por que não perguntou no nosso grupo? - Andy levanta o telefone. - Tem que ficar me atormentando? Essa menina só veio para atrapalhar.

Eu gargalho e Andy me olha séria.

- O que quer que eu faça? - digo pela primeira vez. - Não vou perder a cabeça com ela por agora, é só o início do ano.

- O que você tem contra ela? - Daniel pergunta.

- Nada! - Andy levanta e pega suas coisas. - Vocês dois têm que ir embora por que eu vou dormir.

- Eu vou dormir aqui. - mando um beijo no ar.

Daniel ri e despede-se de nós. Ele deixa um breve beijo em minha bochecha e bagunça o cabelo de Andy ao passar por ela. Ela faz uma careta e ele começa a rir fechando a porta atrás de si.

- Então, você e o Dani... - Andy começa a perguntar enquanto subimos as escadas.

Espero que ela complete a frase. Ela não completa.

- Eu não sei... - digo sem rodeios. - Nos beijamos aquela vez, talvez mais por causa da bebida.

- Você não fica bêbada fácil.

- Eu espero que ele também não.

- Clarie... - Andy para na porta do seu quarto.

- Eu só não quero começar algo que vá prejudicar a nossa amizade. - mordo o lábio.

- Eu acreditaria nessa desculpa se não te conhecesse.

Nós rimos e ficamos um pouco em silêncio. Eu sei que ela ainda quer dizer alguma coisa, então espero.

- Você sabe que o que aconteceu com o Diego não foi sua culpa.

- Andy...

- Clarie, eu estou falando sério. - se ajeita na parede. - Você não pode se privar de experiências novas por causa disso, já faz quase dois anos.

- Eu sei... - concordo fechando os olhos. - Eu só não quero forçar nada entre a gente.

- Qualquer um que olha vê que não há nada forçado em vocês dois. - ela manda um beijo no ar, e antes de fechar a porta diz: - Você que não devia ser tão fechada com ele.

Fecho os olhos sozinha no corredor. Tudo o que Andy disse é verdade.

"Abro meus olhos e uma equipe de paramédicos chegaram ao local, um deles está na minha frente fazendo-me perguntas. Minha audição está baixa, quase não escuto o que ele diz. Aos poucos ela volta, o barulho a minha volta aumenta gradualmente.

- A senhora pode me dizer o seu nome? - ele pergunta e vira-se pedindo que seu parceiro traga o kit de emergência.

Bombeiros. A sirene dos bombeiros chega ao local. Levo minha mão à parte de trás da minha cabeça e meus dedos voltam sujos de sangue. Quando o outro paramédico deixa o kit ao meu lado, o que estava a minha frente posiciona-se para olhar atrás de mim deixando livre o meu campo de visão.

Então, eu vejo tudo. Há um carro amassado em minha frente. Há policías e bombeiros por toda a parte, alguns impedindo que mais pessoas aproxime-se e alguns em volta do carro. Eles andam para lá e para cá. Os bombeiros estão apreensivos. Uma ambulância chega ao local e de dentro dela saem o que eu acredito ser dois médicos.

Uma maca sai de trás do carro e nela um corpo. O motorista. Se o motorista já foi resgatado por que chegaram mais gente?

Diego!

Olhando melhor percebo que não encontro o banco em que Diego estava sentado, isso por que foi neste local que o carro bateu.

- Diego. - minha voz anuncia. - DIEGO!

Tento levantar mas não consigo aguentar totalmente o peso de meu corpo. Começo a engatinhar até próximo do carro.

Eu vejo seu corpo. Congelo. Ele está vivo. Respiro.

Ele tem poucas chances. Um bombeiro comenta. Eu choro. Eu grito. Eu corro na direção do carro. Não lembro quando voltei a aguentar meu peso, não penso em nada. Alguém me impede. Eu grito. Ele me olha e sorri.
Eu vou ficar bem. Leio seus lábios.
Algo me espeta. Meu corpo fica mole. Eu vejo-o pela última vez. Eu só não sabia disso."

A vida de uma rebelde. [EM MANUTENÇÃO] Onde histórias criam vida. Descubra agora