Capítulo 1: Elizabeth

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Não sou boa com apresentações, desde sempre. Não gosto que as pessoas saibam o meu nome ou minhas informações pessoais. Só Deus sabe o que elas podem fazer comigo. Mas esse é um caso diferente, já que estou conversando com algo ou alguém que não é de carne e osso, diferentemente de mim, dos meus pais e das outras pessoas.
Bem, lá vou eu... tenho 15 anos e meu nome é Elizabeth Bittencourt, ou apenas Lizzie, como poucos me chamam. Os "poucos" se resume a Ellie, minha mãe italiana; Christopher, o meu pai inglês e Noah. Como percebe, não tenho muitos amigos, mas não por quantidade, e sim, por opção. As pessoas da escola em que frequento, uma das mais conhecidas da Inglaterra, não são tão legais. Até agora, tenho somente um amigo, e um dos mais queridos e confiáveis, o Noah.
Nos conhecemos com poucas palavras. "Ei, garota! Saia daí! Você está na chuva, será que não pode ser mais cuidadosa consigo mesma?" Ainda lembro da conversa que tivemos e sempre dou risadas das suas palavras. Ele é um ano mais velho que eu e me trata como uma irmã, algo que amo nele. Do tipo "irmão protetor".
Para chegar onde estou, percorri diferentes caminhos. Itália, onde nasci, Portugal, onde meus pais se conheceram, Estados Unidos, para onde se mudaram, anos atrás, até finalmente, Liverpool. Inglaterra.
Sou feliz por aqui, confesso. Tenho pessoas que me amam e compartilho do mesmo amor, algo justo, não?
-Hey, Lizzie! -Noah me atrapalhou, me tirando do meu leito profundo de pensamentos. -Que horas são?
-5:30, por quê? -Resolvi perguntar, sem muita expressão facial.
-Precisamos começar o trabalho de história. Árvore genealógica e tal... -Ah, Árvore Genealógica, a teia que nos confunde e nos conecta. A teia que nos guia a parentes que não vimos a muito tempo, ou nem mesmo sabíamos das suas existências. Esse era um dos projetos que menos me alegravam. Não importa mais, passado é passado. O presente que é uma relíquia e os mais prazerosos momentos são aqueles que contam.
-Não podemos esperar? Estou cansada. -Respondi, quase dormindo sentada.
-Você não fez nada hoje. Anda, tá pensando em quê ou em quem? -Não gosto quando ele faz isso. Parece que não posso ter privacidade, nem nos meus próprios pensamentos.
-Me deixa em paz, Noah. Anda, vamos logo. Você fala demais.
-Às vezes você é tão bipolar.
-E você é tão confuso...
Fizemos nosso caminho para a minha casa, o que no máximo nos custou 5 minutos. A escola não era muito longe em dias não chuvosos. Sempre disse isso. É como um lema.
-Boa noite sr e sra Bittencourt. Como vão? -Noah cumprimentou meus pais, que responderam num tom de afetividade. Nunca sequer detestaram o Noah ou algo parecido. Não tinha como. Eu era a única considerada "chata" pelo simples fato de ele me aturar todos os dias.
-Muito bem, Noah. E já combinamos que essa formalidade não deve existir entre nós, não é mesmo? -Meu pai chamou sua atenção.
-Tudo bem, Chris.
-Tudo bem, subam e eu vou preparar um lanchinho para os dois. -Ellie falou, testando sua voz mimada e minha paciência.
-Mãe!- Falei. -Não somos crianças, já pode parar.-Lhe dei um beijo na testa, dando para ouvir o estalo até da cozinha.
-Também te amo, meu amor. Ah, depois queremos conversar com você, Lizzie. É muito importante.
-Tudo bem. -Mostrei o meu polegar, com sinal de entendimento.
Subimos as escadas, que pareciam nunca terminar. Nossa casa não é antiga ou desajeitada, mas ainda consigo ouvir barulhos a cada passo que dou. Imagino cada degral cantando para mim e para quem o pisa.
-Certo. O que você descobriu sobre seus parentes? Algum desconhecido? -Noah me perguntou, apontando para sua quase pronta Árvore.
-Não muita coisa. Tinha um bisavô chamado Stefano e uma bisavó com o meu nome, só que sem o "z". -Fiz aspas, com o meu último pronunciamento. -E você?
-Bem, você também sabe que os meus parentes são de diferentes lugares, então... é como uma salada de pessoas. -Ambos rimos. -Tinha um tataravô chamado William, uma bisavó chamada Katarina e avós com nomes Francesca e Bartolomeu.
-Minha mãe me disse que os pais dela participaram de uma revolução italiana. Uma coisa não tão grande...
-Enlouqueceu, garota?! Parece que não tem miolos! Isso é importante! -Rimos novamente. Eu gosto quando ele faz isso.
De repente, ouvimos passos, seguidos de uma voz. Era mamãe com os biscoitos. Estavam maravilhosos! Depois disso, ela me chamou e tive que deixar Noah no meu quarto por um instante.
-Querida, sabemos que você já tem sua própria vida por aqui. Já fez suas amizades e muito mais... - Minha mãe começou, construindo um clima de tensão sobre o lugar.
-Só o que temos é agradecer a Deus por tudo o que ele nos deu por aqui. Um lar, uma família...
-Por favor, sejam diretos. -Pedi, meio assustada, cortando a fala do meu pai.
-Seu pai conseguiu convencer uma empresa de outro país para empregá-lo. O contrato foi assinado pela internet. -Fiquei preocupada. Teremos que nos mudar. Mas para onde? E o Noah?! Como vou deixar isso tudo e ele?
-Noah vai conosco para esse novo país. Seus pais nos deixaram tomar conta dele. -Como se tivesse lido a minha mente, meu pai automaticamente respondeu, para o meu alívio. Suspirei. Tive que fazer isso.
-Qual o nosso destino? -Perguntei, já entusiasmada.
-Nova York! -Disseram em uníssono

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