Sem você, o que seria?

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Com pouca idade e com uma bagagem de experiências, não poderia mais me considerar uma criança. Ao meu ver, já era alto suficiente, já poderia sobreviver só. Conseguir o que quisesse, como quisesse. Não era bem assim...

Um belo dia, o telefone da casa tocou, e quando falei, ouvi a voz da minha mãe. Era uma voz tão perfeita ao meu ouvido que não acreditava. Foi ai que ela disse: arrume suas coisas, estou indo te buscar, você quer morar comigo ? Não conseguia falar de tanta alegria. Lembrando agora. Penso que foi um dos momentos mais alegres que já tive, nem precisei responder.
Alto suficiente, independente, só... nada disso existia mais. Percebi que não passava de uma criança, que por algumas desventuras esqueceu de ser feliz...

Quando deixei a casa da minha avó, não tive dívidas nem receios. Não pensei em nada, nem em ninguém. Só depois, lembrei de alguém muito especial que conheci. Gostaria de saber como essa pessoa está...



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O bairro em que minha mãe morava a primeira impressão não era nada de mais.
A casa era em frente à casa de uma tia. Lá morava duas primas Franciele, Fabiana e meu tio.
Era tudo muito novo para mim, os conhecia mas ter que viver tão próximo era algo diferente.
Como todo garoto, a primeira coisa que fiz ao me mudar foi procurar alguém que pudesse brincar. Em comparação com a rua em que a minha vó morava, essa em especial tinha ótimas pessoas. Bem diferente das pessoas que encontrava por lá. A grande maioria era garotas, o que deixava as brincadeiras mais engraçadas.
Morei nessa rua por dois anos, estudei em uma boa escola. Conheci ótimos amigos. Tudo por qui foi muito rápido, não tive muito tempo para aproveitar. Não teve romances, nem descobertas.
Minha mãe trabalhava e eu tinha que ficar com minha tia. Achava ótimo. O único ponto ruim era meu tio.
Um cara legal, para ele a família é mais importante que qualquer coisa. Isso concordo, mas ele exagera.
Lembro que ele não gostava quando brincava com minhas primas. Ele dizia que meninas tem que brincar com meninas, e para ele garotos tem que ficar na rua.
Não culpo por pensar assim, infelizmente esse tipo de pensamento é bem comum na nossa sociedade. Quando você para pra pensar, machismo e intolerância é mais comum que imagina, está em todo lugar.

Talvez, meu tio tivesse razão em não querer que garotos e gurias ficassem juntos. Um exemplo é que nesse período dei meu primeiro beijo, e foi em uma prima... não foi dos maiores beijos, mas foi um bom beijo.
Duas primas tinham chegado do interior, Patricia e Naiá . Isso deixava a casa bem mais movimentada. Brincar na rua foi perdendo a graça, tínhamos que encontrar alguma brincadeira que fosse diferente. Então, alguém deu a ideia de criar uma família. Todo mundo tomava banho e se encontrava no quatro.
Minha prima Franciele já tinha 12 anos, tinha pensamentos mais longínquos, garotos. Então, ela não brincava, tinha outras preferências.

Por ser o garoto mais velho, era meu o papel de pai. A minha prima Patricia, era a mãe, e os outros eram os filhos. Nesse contexto já tínhamos visto os adultos se beijarem, foi aí que minha prima teve a ideia de beijos, sempre que fosse preciso. Eu, que me aprofundava no papel de pai, não recusei. Primeiro beijo, segundo beijo, terceiro beijo...

Pode parecer que tinha intenção, que eu sabia bem o que estava fazendo. Não sabia. Durante as brincadeiras, a minha intensão era realmente brincar. Lembro bem que quando alguém tinha a ideia de se esconder e o outro procurar, os garotos da rua ficavam se escondendo com as gurias para beijar. Já no meu caso. Queria era me esconder mesmo, não queria saber de beijo. Na minha mente a brincadeira era se esconder. E pronto. Não era mal intencionado pra esse tipo de coisa, pelo menos, ainda não.

Posso dizer que hoje não considero esse o meu primeiro beijo. Mas foi algo importante em minha vida. Descobri que beijo é molhado. Estranho quando tem um bando de criança te olhado, e descobri que as minhas primas fizeram isso com intensão, elas sabiam o que estavam fazendo, e entendi por que elas alternavam, em ser as mãe, e por que eu era obrigado a beijar todas. E eu, só fui um "experimento". A minha prima mais velha, Franciele, já tinha "entendimento" das coisas. Porém, como toda guria nesse período, ela era bem tímida com os garotos, acho que isso é bem comum. A questão é que cabia a mim o papel de "cobaia" das primas mais novas, e da mais velha. Não vou dar exemplo de como, mas, eu lembro muito bem. Hoje acho bem engraçado o que a pré adolescência faz com a pessoa...

Não foi só amor com minhas primas. Já brigamos muito. Uma vez, quebrei o dente da Tainara. Já sai no tapa com a Franciele. E meu tio a cada dia me odiando mais e mais.


Alguns meses depois a mãe de Patricia e Naiá estava procurando um lugar para recomeçar, um lugar que fosse melhor para ela, as filhas e o marido. E não era aqui...
Ela viajou para outro estado, Sergipe. Ninguém tem contato com elas, não vejo minhas primas desde então, ainda lembro de tudo que passamos. Adoro tudo que aconteceu, ruim, ou bom. Espero que estejam bem, felizes, e se estiverem lendo isso, obrigado pelas loucuras.
Franciele e Fabiana ainda conheço. Até porque moram em frente a minha casa. As coisas não são mais como antes. Não tem mais brincadeiras, nem conversas até tarde da noite. Hoje, posso dizer, com toda certeza que infelizmente, odeio Fabiana, o jeito mesquinho e idiota que ela tem, bem diferente da guria chorona e engraçada que ela era. Ainda penso que isso é só um momento adolescente, espero que esteja certo...

Franciele já está adulta. Ainda mora com os pais. Tem um namorado, um cara bem legal, já conversei com ele uma vez e me impressionou, dessa vez ele acertou na escolha. Não converso muito com ela, mas ainda posso confiar, sei que ela ainda é a guria boba e meiga, com certas mudanças, mas ainda gosto muito do que ela é.
Engraçado em nossa relação de primos é que se ela me pegasse fazendo qualquer coisa, passava direto, como se não tivesse me visto, e sempre fiz o mesmo com ela. Hoje pensando bem, é como você gostar muito de alguém, mas saber que a pessoa não é criança e sabe bem oque faz. Nunca tivemos problemas com fofocas, o que tivéssemos que falar, era um para o outro. Isso que me faz respeita tanto a prima que tenho. Ela tem caráter e consciência que cada um é responsável por suas ações...

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Ouça

Jason Mraz - Bella Luna

Posso sugerir-lhe que consiga o melhor

Do seu desejo, eu insistoSem contestar para a pequena você ou eu menor

A maior chance aconteceu, mas todos eles descansam

Na ascenção, à beira das nossas vidas

Bella, por favor Bella você Bella Luna

Oh bella fazer o que você faz Bella Luna, minha fortuna

Como você me embala como nenhuma outra



Capa: pixabay







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