Prólogo

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POV Lauren
Belfast - Irlanda do Norte
14 de Novembro de 2024 Dias atuais
05:06 p.m.

Ela se foi.
De todos os sorrisos, o dela era o mais bonito.
De todos os abraços, o dela era o mais aconchegante.
De todos os olhares, o dela era o mais profundo.
De todas as vidas, a dela era a mais importante no mundo.
Mas agora ela se foi.

Não sei para onde e nem por quê. Mas ela se foi. Eu não sei como agir. Não sei como vou contar isso para nossas famílias. Não sei como eles vão reagir. Não sei como vou seguir sem ela. Eu já sinto sua falta e sei que isso só vai aumentar com o passar do tempo. Ela se foi há aproximadamente 19 horas e 40 minutos, para onde eu não sei. Procurei por ela todos os hospitais da redondeza, até mesmo no que eu trabalho, mas não há registros dela. Estou com medo do que possa ter acontecido com o corpo dela. Estou com medo de me encontrarem por isso vim para nosso chalé, o qual eu comprei há 6 meses a pedido de Camila que vivia dizendo que aqui era o melhor lugar para se olhar as estrelas, a lua e assim se "desligar'' da realidade, como a mesma dizia. Por isso vim para cá, mesmo sabendo que vão me encontrar uma hora ou outra.

Olho pela janela e tenho dificuldade para ver o lago e a pequena rua que liga o chalé à estrada principal, pois tudo está coberto pela neblina. Meu medo cresce, pois não vou ter como saber quando eles chegarem. Meus olhos estão cansados, não consigo dormir sabendo que não vou acordar ao lado de quem mais amo. Sinto fome, sede, mas nada desce pela minha garganta de tão aflita que estou. Passo a mão por cima de minha barriga que, mesmo ainda estando imperceptível, me mostra que não estou sozinha, mas ainda assim sinto falta de minha esposa. Ainda não acredito que ela se foi. É como se tudo isso fosse um pesadelo, o qual não consigo acordar.

Enquanto ando pela sala vejo várias fotos nossas ao redor e pego uma em especial, uma das preferidas de Camila. Sento no sofá e rapidamente me lembro do dia em que Camila viu a foto pela primeira vez.

Flashback ON

Estava deitada no sofá olhando as fotos que tirei em nossa última viagem ao Hawaii quando Camila sai do quarto com o cabelo bagunçado, vestindo um casaco (que provavelmente era de algum ex namorado da Dinah) e os olhos inchados, pois havia acabado de acordar. Ela sussurrou um breve "bom dia", se sentou em meu colo e começou a olhar as fotos comigo.

- Laur, essa foto está tão linda! Ela está perfeita! Não me lembro de ver você com a câmera nessa hora. - Falou uma Camila surpresa olhando para uma foto que eu tirei na praia ao pôr do sol onde sua silhueta era o elemento central da foto.

- Até parece que uma foto tirada por mim sairia feia!!! -Disse e pisquei para minha mulher que no mesmo momento revirou os olhos.

- Nossa Michelle, mesmo depois de todos esses anos eu ainda não me acostumei com você sendo tão babaca. - Disse ela, se levantando do meu colo e indo em direção à cozinha enquanto eu a seguia, rindo de seu comentário.

Sentei no balcão e observei Camila abrir a geladeira à procura de comida que no momento estava - parcialmente - em falta.

- Camz, nosso aniversário de casamento está chegando e eu estava querendo comprar o seu presente. Você tem alguma preferência? -Perguntei à Camila que ainda tinha os olhos presos à geladeira e o corpo apoiado na porta.

- Lauren, há quase quatro anos você faz essa pergunta e eu sempre lhe dou a mesma resposta. Por que você ainda insiste nisso se sabes muito bem o que eu quero? - Ok, eu sabia o que ela queria, mas custava muito ela responder olhando pra mim? Ah, lembrei, a comida é mais importante. Tudo bem.

- Tudo bem, Camila, nós já conversamos sobre isso e eu vou lhe dizer de novo, em claro e alto som: Eu, Lauren, não quero engravidar, não agora. Camila, inseminações artificiais no nosso caso são um pouco complicadas. Você sabe que crianças dão trabalho Camila, vamos deixar isso para mais tarde.

- Deixar para mais tarde, Lauren? Vai ser sempre essa a sua desculpa? -Ela disse com os olhos cheios de lágrimas e fechou a geladeira com força, com a respiração já alterada e seu rosto vermelho veio até mim 

- Qual o problema, Lauren? Você acha que se eu pudesse eu já não teria, hoje, um filho seu? Olha, eu não vou te pressionar a nada, não mais.

Camila se virou e voltou a abrir a geladeira sem dizer mais nenhuma palavra. Eu sabia que Camila ainda queria ser mãe, mas eu não me sinto preparada, eu trabalho o dia todo, às vezes faço plantões no hospital e Camila de vez em quando trabalha em seu escritório até tarde quando está trabalhando em algum projeto. Não acho que nas condições atuais teríamos como ter um bebê, mas Camila sempre insistiu nisso, desde que casamos. Tentar uma inseminação artificial é muito arriscado em nosso caso. Quando Camz tinha 16 anos foi diagnosticada com retroversão uterina e endometriose o que dificulta muito uma gravidez. Por isso desde que casamos ela quer que nós façamos uma inseminação e eu engravide. Há uma semana, no hospital onde trabalho fiz uma inseminação artificial com um óvulo de Camila, mas ainda não sei se deu certo, como as nossas chances são poucas no mesmo dia eu contei a ela que a inseminação tinha dado errado para não criar esperanças em algo tão duvidoso.

- Lauren, onde está aquela torta de banana que você trouxe da casa de Dinah na terça? -Ela perguntou ainda olhando para a geladeira esperando inutilmente que a torta aparecesse por metamorfose.

-Eu comi de madrugada, não sabia que você iria querer. -Falei e no mesmo momento Camila olhou para mim como um gnu irritado.

- Nossa Lauren, tá comendo por dois agora? Já não bastava ter comido o resto da janta ainda comeu a torta? Vou passar a fazer macarrão instantâneo que sai mais barato. - Disse, estressada, ao ir ao quarto e minutos depois sair, provavelmente,  a caminho do supermercado.

Flashback OFF

Dei um leve sorriso lembrando de como Camz me olhou naquele dia e com certeza ela se parecia muito com um gnu. Ah Camila, como eu já sinto sua falta. Nunca vou me acostumar com a sua falta.
Olho no relógio e são 17:34. 20 horas atrás eu ainda a tinha em meus braços, dói saber que aquela foi a última vez.
Ouço fortes batidas na porta.

Eles me acharam.

As batidas estão ficando cada vez mais altas.

Cada vez mais insuportáveis.

- Abra a porta!!! É a polícia!!! - Meu corpo tenciona-se automaticamente. Penso em fugir mas sei que não valhe a pena. Nada mais valhe a pena sem ela. Não valhe a pena fugir para depois viver com medo até de minha sombra. Levanto com dificuldade e com as mãos tremendo destranco a porta e a abro.

- Lauren Michelle Cabello-Jauregui? - Pergunta o bruta montes a minha frente

- Sim. Sou eu. - Digo e ele me analisa de cima a baixo. Olho com atenção e vejo três viaturas estacionadas em frente ao chalé e cinco policiais armados e prontos para atirar em mim a qualquer momento. Que recepção hein Lauren, nem o Bin Laden deve ter sido tão bem recebido como você!

- Tenho um mandato de prisão para a senhora por homicídio doloso. Por favor, saia da casa e vire-se. A senhora está presa.

A senhora está presa.

A senhora está presa.

A senhora está presa.

A senhora está presa.

Então era assim que tudo acabava. Eu havia sido presa.

Obedeci ao policial que logo depois já me arrastava para uma das viaturas dizia algumas palavras que para mim não faziam mais nenhum sentido. Minha vida estava oficialmente acabada. Minha Camila se foi e nada mais importa.

Never look backOnde histórias criam vida. Descubra agora