Como havia dormido no chão do posto abandonado, ficou com a roupa toda amarrotada, e despenteada, porque o homem também havia levado seu pente, e para completar, estava morrendo de vontade de tomar um banho e um cafezinho, como não tinha nada disso, seguiu em frente sua caminhada para São Paulo.
Andou muito tempo, e parou em outro posto de gasolina, este sim, bonito, grande, cheio de caminhões, entrou no restaurante, e ficou olhando, logo veio um garçom e disse:
- Vai dando o fora dona, não tem comida aqui não. E a empurrou para fora do restaurante.
Ela tentou dizer alguma coisa, mas desistiu quando se olhou em um espelho do restaurante e viu uma mulher descabelada, suja em sua frente, esta mulher não era ela, não podia ser, então entendeu que não podia entrar em lugar público, não era assim que havia imaginado sua viagem, parecia que as coisas haviam tomado outro rumo.
Saiu do restaurante e foi para o pátio arrumar uma carona de volta para casa, ainda poderia chegar em casa a tempo e talvez nem tivessem notado sua falta, pensou melhor, e decidiu que iria em frente, nesta altura, seu marido já deve estar nervoso e seria capaz de bater nela por causa do tempo que esteve fora, resolveu que manteria o planejado, iria em frente.
- Ei, seu moço, o senhor tá indo pra São Paulo?
- Tô sim, dona, mas não me vai dizer que vai querer uma carona? -Primeiro precisa tomar um banho. E saiu rindo deixando a mulher desorientada.
Agora ficou mais difícil. -Vou ter de caminhar mesmo. E foi em frente.
Andou, e quando mais andava mais achava que não havia rendido a viagem, olhava pra trás e sempre via as mesmas coisas as mesmas paisagens, a solidão fazia companhia, e que falasse sozinha, teria de tomar cuidado, senão ficaria louca.
Nesse dia caminhou bastante, somente parando em uma sombra para descansar os pés, beber água, ou fazer suas necessidades, seu pensamento voava, ela já imaginava sua chegada em São Paulo, somente não sabia que mesmo depois da carona que havia conseguido havia caminhado poucos quilômetros, estava muito longe de seu destino.
No outro dia, enquanto caminhava debaixo de um sol quente, com seu pano amarrado na cabeça, viu que em sua direção caminhava um homem de barba branca, parecendo que há muito não via um banho e como estavam longe um do outro, resolveu trocar de lado na estrada e quase foi atropelada por uma carreta que a jogou no chão com o vácuo do deslocamento do ar, atravessou a estrada e foi para o outro lado, o homem também atravessou, voltou para o lado que estava antes e ele também voltou, ficou com medo e preparou-se para o pior, o homem veio em sua direção.
- Bom dia dona, tá indo pra onde?
- Tô indo pra São Paulo. Torcendo para ele ir embora. Mas ele queria conversar com ela.
- A senhora por acaso tem água?
Como havia guardado uma garrafa de plástico com água, deu pro homem, que bebeu e agradeceu.
-Sabe, dona, eu tô vindo de lá, estou voltando pro Pernambuco meu estado natal, lá em São Paulo as coisas estão muito ruins, muita gente pobre pedindo, se eu fosse a senhora voltava pra casa, vejo que a senhora ainda esta no começo da caminhada, mas daqui a uns dias vai ficar igual a mim, acredite dona, a coisa não é fácil lá, se tiver algum parente te esperando fica mais fácil.
-Não, não tenho, vou procurar emprego de doméstica, qualquer coisa, pra minha casa não posso voltar mais.
-Tudo bem, dona, então vai com Deus.
-O senhor viu algum posto de gasolina, algum lugar em que eu possa descansar?
-Tem não, se estivesse de carro tinha, mas a pé, tem não, tá muito longe, vai ter de dormir na estrada, procure uma sarjeta limpa enquanto está de dia, depois se arruma e reza para não ter ratos, cobras ou outros bichos, e durma, descanse, a caminhada é dura e precisa se alimentar e ganhar energia. Continuou aconselhando o velho andarilho.
– Tente arrumar carona em um caminhão, tem motorista que leva. Vá com Deus e boa viagem.
Ouvindo os conselhos do senhor idoso, continuou sua caminhada, e mais uma vez teve medo de dormir, sozinha, no mato, medo dos bichos, e medo de outros homens enquanto dormisse, mas por enquanto era fazer como o homem havia dito, arrumou um lugar limpo e seguro. A noite caiu logo, era uma sarjeta limpa perto de um morro, não havia estrela no céu, a lua não apareceu, era uma noite de breu intenso, mas como estava muito cansada, adormeceu com fome.
ӘYD
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Caminhante das Estradas
Short StoryAndarilhos, caminhantes das estradas ou trecheiros como gostam de serem chamados, caminham pelas estradas sem destino como nômades, renunciam a fixações geográficas, psicológicas e sociais e não é raro os encontrar com manifestações de visões e pens...