Dope

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As coisas param de fazer algum sentido depois da quinta ou sexta vez no País das maravilhas, mas tudo é 100 vezes pior quando você sai de lá. Tudo é vazio. As cores somem dos seus mais diversos lugares. Parece que aquele mundo é, mesmo que atormentado, feito para lhe entreter o quanto pode, até que você escolha por vontade própria afundar na loucura com ele.

Acordo com o barulho de um carrinho passando pelo corredor ao lado do meu quarto - Ou cela, chame como quiser - no sanatório, eu suspirei em frustração.

Não existe a paz naquele lugar.
Não existe de fato um momento em que você possa se sentir em paz. É como um labirinto psicótico onde as paredes gritam e nós, os internos, as vítimas, afundamos mais e mais em nós mesmos. Um prédio cheio de pessoas vazias.
É como se Flaningan fosse uma punição para não dignos, uma vez que as autoridades da grande Inglaterra começaram a mandar criminosos e assassinos crueis para cá. É o inferno na terra, mas aqui você não precisa morrer pra ver Deus... Porque todos os dias eles nós dão nossos goles de vida. Remédios, remédios. Você se sente dopada 80% do tempo e nos outros 20% está provavelmente passando por algum tipo de terapia ou procedimento que promete nos ajudar, mas na verdade eles só nos deixam mais confusos.

Muito provavelmente estava de dia, o movimento nos corredores não me negava isso.
Mas estava frio. Parecia mais uma das mensagens subliminares de algo maior que aquele dia não me traria nada de muito bom e eu soube que aquilo era verdade quando a porta do meu quarto foi aberta e três enfermeiros entraram por ela juntamente a uma mulher alta.

Seu cabelo era arrumado de forma extremamente formal e esnobe, um penteado alto; Cheirava a produtos importados, seu cheiro vinha a mim de forma violenta mesmo estando na outra ponta do quanto; O barulho dos seus saltos batendo contra o chão liso, claro e frio me causava arrepios; A mulher se aproximou de mim com um grande e doente sorriso em seus lábios vermelhos que combinavam com o vestido justo porem longo que usava.

- Então você é a Alice?

- É o que dizem - Respondi sem mais nem menos ainda no canto da sala sem me mover, mas não conseguia tirar os olhos da dama de vermelho.

- Como eu imaginei, você é uma gracinha - Ela sorriu maldosa e se aproximou se agachando em minha frente - Então Alice, como está para você essa... Estádia em minha casa?

Ela perguntou como se realmente acreditasse que aquela era sua casa. Como se eu realmente estivesse de visita e fosse sua convidada. Eu mal podia acreditar no que ouvia, talvez até mesmo ela houvesse se tornado meio louca, e então fiz o que havia aprendido em todos aqueles anos com os poucos médicos daquele inferno. Decidi entrar em seu jogo.

- Na verdade sim, tens uma bela casa, porém, já que perguntas - Descruzei os braços e usei os mesmos como apoio no chão frio - faz frio demais a noite e acho que ratos povoam seu encanamento.

A dama de vermelho sorriu de lado.

- Parece que Joshua estava enganado sobre você afinal. Ele me falou de uma garota leiga que tinha dificuldade em se comunicar com as pessoas e que tinha comportamento agressivo frequente mordendo meus empregados, mas sabe, não é o que eu vejo Alice... - Ela me encarava como se fosse um suculento pedaço de bife - Você sabe quem eu sou?

- Você é a maldita que mantém esse lugar de pé e funcionando, emendando vazamentos, falsificando documentos, fazendo reformas falsas. Sim eu estou bem consciente de quem é, Clarisse Backward - Encarei seus olhos enquanto dizia as palavras para logo depois sentir uma ardência forte em meu rosto. Ela havia me dado um tapa.

- Me respeite, isso ainda é minha casa. E acredite, você não sabe quem eu sou - a vi levantando-se e olhando para os enfermeiros - Quero que dobrem a dose de sedativos e de todos os remédios que seja lá quem tenha receitado para ela. A paciente claramente precisa de mais. Se der trabalho a mandem para a solitária. Vocês entenderam?

Os capachos acenaram com a cabeça enquanto eu mantinha minha mão em meu rosto, onde eu tinha certeza de que estavam perfeitamente desenhados os dedos de Clarisse em um tom avermelhado. Sentia raiva, queria lhe arrancar a cabeça depois de a torturar por horas.

- Senhora, perdoe-me, mas por que não adiar o procedimento habitual nessas situações? - Ouvi um dos enfermeiros perguntar.

- A lobotomia não é uma opção. Pelo menos não ainda. Se eu souber que tentaram algo com ela, eu mesma venho punir a infeliz alma. Estamos entendidos senhores? - Eles acenaram positivamente com a cabeça enquanto eu via a mulher saindo.

A porta foi trancada com força e eu comecei a sentir as lagrimas deslizando por meu rosto de forma silenciosa. Eu precisava sair dali.

O sorriso do CheshireOnde histórias criam vida. Descubra agora