De volta a história, Abele releu o que havia escrito para lembrar-se onde havia sido interrompida. Olhou o segundo papiro com as anotações e finalmente retomou a escrita.
Rónán estava há um dia carregando seu irmão nos ombros. Já não se lembrava mais da dor e nem da fadiga. A fome, entretanto, gritava em sua barriga, mas parar para comer apenas prolongaria sua jornada.
Ele continuou seguindo a trajetória que levaria até o suposto reino de Siobhan.
Já era noite novamente e à sua frente podia enxergar um enorme portão em arco. A grade dividia-se ao meio, porém um dos lados estava caído.
Aquele local abandonado fazia com que Rónán começasse a questionar se alguém tão poderoso usaria um lugar assim como o centro de suas atividades.
Indepentende disso, ele não voltaria atrás.
Não tinha nada a perder e tudo a ganhar, portanto iria até o fim.
Sua visão era afetada pela escuridão mas parecia piorar conforme adentrava o ambiente. Quanto mais vagava pelo local, mais uma neblina tomava conta de seus arredores.
O jovem passou a caminhar com cautela mas foi em vão.
Não se surpreendeu ao perceber que havia tropeçado em um lápi
Apesar de não perceber mais o barulho da chuva, os trovões ainda a assustavam. Outro estrondo tomou conta do ambiente. Esse foi o mais barulhento até então, parecia estar mais perto.
O susto fez com que Abele deslizasse a pena involuntariamente, rabiscando o papiro. Largou a pena, levou as mãos até o rosto e respirou fundo. Ela queria saber como acabaria aquela história e para isso não poderia recomeçar o texto.
Um sorriso surgiu em seus lábios e pegou novamente a pena. Aproveitou a linha proveniente do susto e estilizou as letras, uma forma de fazer a palavra destacar-se no texto. Identificou também um erro de otrografia e corrigiu da melhor maneiro possível, tentando esconder a rasura.
Não se surpreendeu ao perceber que havia tropeçado em uma lápide.
Aquele lugar fazia jus às histórias sobre Siobhan.
O rapaz conseguia ouvir passos à sua volta mas não tinha certeza se haviam pessoas naquele local. As silhuetas misturavam-se com a neblina criando miragens. Ele já não sabia no que acreditar, o cansaço e o trauma poderiam estar brincando com sua sanidade.
Seu irmão já pesava mais de mil libras. Rónán teve que parar por um instante.
Repousou o defunto no chão e sentou-se ao lado do corpo. A névoa o impossibilitava de enxergar seu ente querido. Enquanto descansava, decidiu segurar o braço do irmão, uma forma de sentir que ainda havia esperança em salvá-lo.
Três batidas na porta e subitamente o som da chuva, acompanhado dos indivíduos barulhentos, retornava ao conhecimento da escritora.
Abele respirou fundo.
— Sim? — questionou.
A ama abriu a porta.
— Viste vossos irmãos?
— Não, Consolata...
— Perdão, senhorita. Vosso pai está começando a ficar preocupado. Primeiro vossa mãe, agora vossos irmãos.
— Talvez mamãe tenha saído com eles. Verificaste se o cocheiro está aqui?
— Acreditas que sairiam a essa hora e com essa eterna chuva?
— Já dura um mês, Consolata. Um dia todos terão que retornar aos seus afazeres caso esse temporal não encontre o fim. Agora, por favor, deixe-me retornar à escrita.
Consolata apenas acenou com a cabeça. Abele percebeu o medo nos olhos de sua ama mas optou por acreditar que em algum momento a criada iria entender que não haviam motivos para se preocupar.
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Taciturno
Misterio / SuspensoUm temporal sem fim toma conta da província de Messina. A jovem Abele, uma escritora aspirante, decide aproveitar-se da chuva como fonte de inspiração para escrever sem ser distraída por sua agitada família. O que parecia ser mais uma habitual noi...