3 Rónán

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 De volta a história, Abele releu o que havia escrito para lembrar-se onde havia sido interrompida. Olhou o segundo papiro com as anotações e finalmente retomou a escrita.

Rónán estava há um dia carregando seu irmão nos ombros. Já não se lembrava mais da dor e nem da fadiga. A fome, entretanto, gritava em sua barriga, mas parar para comer apenas prolongaria sua jornada.

Ele continuou seguindo a trajetória que levaria até o suposto reino de Siobhan.

Já era noite novamente e à sua frente podia enxergar um enorme portão em arco. A grade dividia-se ao meio, porém um dos lados estava caído.

Aquele local abandonado fazia com que Rónán começasse a questionar se alguém tão poderoso usaria um lugar assim como o centro de suas atividades.

Indepentende disso, ele não voltaria atrás.

Não tinha nada a perder e tudo a ganhar, portanto iria até o fim.

Sua visão era afetada pela escuridão mas parecia piorar conforme adentrava o ambiente. Quanto mais vagava pelo local, mais uma neblina tomava conta de seus arredores.

O jovem passou a caminhar com cautela mas foi em vão.

Não se surpreendeu ao perceber que havia tropeçado em um lápi

 Apesar de não perceber mais o barulho da chuva, os trovões ainda a assustavam. Outro estrondo tomou conta do ambiente. Esse foi o mais barulhento até então, parecia estar mais perto.

 O susto fez com que Abele deslizasse a pena involuntariamente, rabiscando o papiro. Largou a pena, levou as mãos até o rosto e respirou fundo. Ela queria saber como acabaria aquela história e para isso não poderia recomeçar o texto.

 Um sorriso surgiu em seus lábios e pegou novamente a pena. Aproveitou a linha proveniente do susto e estilizou as letras, uma forma de fazer a palavra destacar-se no texto. Identificou também um erro de otrografia e corrigiu da melhor maneiro possível, tentando esconder a rasura.

Não se surpreendeu ao perceber que havia tropeçado em uma lápide.

Aquele lugar fazia jus às histórias sobre Siobhan.

O rapaz conseguia ouvir passos à sua volta mas não tinha certeza se haviam pessoas naquele local. As silhuetas misturavam-se com a neblina criando miragens. Ele já não sabia no que acreditar, o cansaço e o trauma poderiam estar brincando com sua sanidade.

Seu irmão já pesava mais de mil libras. Rónán teve que parar por um instante.

Repousou o defunto no chão e sentou-se ao lado do corpo. A névoa o impossibilitava de enxergar seu ente querido. Enquanto descansava, decidiu segurar o braço do irmão, uma forma de sentir que ainda havia esperança em salvá-lo.

 Três batidas na porta e subitamente o som da chuva, acompanhado dos indivíduos barulhentos, retornava ao conhecimento da escritora.

 Abele respirou fundo.

— Sim? — questionou.

 A ama abriu a porta.

— Viste vossos irmãos?

— Não, Consolata...

— Perdão, senhorita. Vosso pai está começando a ficar preocupado. Primeiro vossa mãe, agora vossos irmãos.

— Talvez mamãe tenha saído com eles. Verificaste se o cocheiro está aqui?

— Acreditas que sairiam a essa hora e com essa eterna chuva?

— Já dura um mês, Consolata. Um dia todos terão que retornar aos seus afazeres caso esse temporal não encontre o fim. Agora, por favor, deixe-me retornar à escrita.

 Consolata apenas acenou com a cabeça. Abele percebeu o medo nos olhos de sua ama mas optou por acreditar que em algum momento a criada iria entender que não haviam motivos para se preocupar.







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