Crônica VI

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Espelho, ti odeio.

Houve uma época terrível de minha vida. Terminara de fazer meus 16 anos quando começava a fazer parte de minha vida as terríveis espinhas, ou acnes como chamam a indústria farmacêutica. Foi um período que me acompanhou por um bom tempo. As namoradas começavam a surgir aos montes. Tinha que dar conta de todas, afinal era uma idade que nos deixava em êxtase. A Débora que foi a primeira, não chegou a presenciar aquelas "coisas" no meu rosto. Mas quando terminamos e encontrei outras garotas, elas começaram a surgir.

Passava horas e horas frente ao espelho tentando disfarça-las em meu rosto. Mas ainda bem que tinha duas irmãs para me ajudar com isso. Pronto, ficava com a pele de bebe de novo com os truques de minha irmã mais velha. Aos treze anos minha pele era um pêssego como chamam quando se elogia a pele de alguém. Mas quando fiz dezesseis, tudo mudou. E como mudou.

Não entendo porque que o adolescente tenha que passar por essa fase tão massacrante das espinhas. Aquilo me acompanhou por cinco anos. Não foi fácil. Aguentar apelidos como "cara de pizza", "bolhudo", "espinhento" e outros era uma tortura. Os truques de minha irmã não duraram por muito tempo. As composições químicas daqueles produtos só agravaram o quadro de acne. Então depois de bons períodos curtindo varias garotas acabei um tempinho na temida solidão. Sozinho. Não queria mais nem sair de casa. E se fosse uma emergência, dava uma de louco e botava logo uma sacola no rosto. Não! Não cheguei para tanto. Mas não queria mesmo nem ir à escola. Comecei a faltar muito. Mas ainda bem que sempre fui ligado aos estudos e acabei passando em todos os anos do ensino médio.

Passei a odiar o espelho. Não conseguia nem ver o meu próprio rosto. Só de senti a minha pele cheia de ondulações, que eram as "bolhinhas" de secreção das espinhas, imagina como o meu rosto estaria? Então meus pais me levaram imediatamente para um dermatologista. Estava com 17 anos. Demoraram um ano para fazerem isso. A médica disse-me que a acne já estava em um estado bem elevado, me indicou um remédio muito forte e logo me solicitou alguns exames que tinha que fazer antes de iniciar o tratamento. Fiz os exames rapidamente e estava apto para iniciar o tratamento. O medicamento causava um efeito de tratamento que começava de dentro para fora, onde todas as acnes que possuía iam se externar sobre minha face, eliminando todos os resíduos da bactéria causadora da acne. Foram longos nove meses.

Melhor agora e muito do que estava, voltei a ter a minha altoestima, minha segurança de volta. Voltei a sorrir, a olhar as pessoas, a conhecer novas pessoas. Senti-me como se tivesse saído de um lugar escuro, de uma prisão, de dentro do espelho por exemplo. Pois não queria nem me olhar. Pensando nessa fase da qual passei, acredito que todos nós tenhamos nossos trovões e temporais, aquele período em que as coisas não podem ser do nosso jeito. Não podem ser mudadas. Todos os seres humanos possuem seus problemas, uns com mais graves, outro menos grave. No meu caso foi só uma fase da adolescência, fruto de uma puberdade que estava fisicamente me transformando em um homem, em um adulto.

Foi um momento em que aprendi a enfrentar o mundo. As aversões das pessoas quanto ao "feio" ao "nojento". Pois as imagens das pessoas que ao me verem, faziam caras de ânsia, de pena ou de nojo, ainda não saem da minha cabeça. Os apelidos ficaram como cicatrizes em meus ouvidos. A prisão por não querer sair de casa me fez venerar ainda mais a liberdade, para estar lá fora, estar no mundo. Querer alçar novos horizontes, acreditar no lema "o céu é o limite". Ver que a auto-segurança e a autoestima pode determinar a nossa felicidade.

Senti-me novo e limpo, há muito tempo se tornou um sonho ter o rosto limpo. Depois de cinco anos então. Só quem já sofreu com essa doença que vai entender como é se sentir bem consigo mesmo outra vez. Poder falar com as pessoas olhando nos olhos e não mais com a cabeça baixa tentando esconder "aquilo". Se apresentar nos encontros de amigos e não sair correndo inventando uma desculpa besta. Tirar fotos com a família e não se esconder por trás dos primos. Coisas assim que me vem à cabeça quando penso que estar bem de verdade é isso, é poder viver livre em todos os sentidos.

-> OLÁ MEUS AMIGOS

Hoje nossa crônica foi protagonizada por um grande amigo meu, onde ele sofreu muito com um problema muito serio, uma doença da pele que acaba com auto estima de uma pessoa. Lembro-me que esse meu amigo deixava de sair de casa por causa disso. Foi um momento muito difícil de sua vida. Eu sofria junto com ele. Ele evitava de me ver, de sair com a namorada dele, de ir a escola. Mas hoje tudo se resolveu, ele se tratou e ele recuperou a sua auto estima. Espero que esta crônica converse com vocês. Acne é uma doença que deixa a pessoa depressiva, busque um tratamento urgente nos primeiros indícios de espinha.

Até a próxima

Gui Hairam



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