O telefonema

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     Preciso com urgência de um namorado.

       Meu Deus! Como isso sooa desesperador! Mas o fato é que estou com 29 anos e nem um pretendente descente na minha lista. E para piorar as coisas, minha irmã insisti que tenho que ir acompanhada em seu casamento, daqui a quase um mês.
       Muito legal isso.
       Aonde vou arranjar esse cara em apenas um mês?! É lógico que tem o George "Argh" Jr, o carinha magricela e cheio de sardas do escritório de contabilidade, que por azar do destino fica ao lado da minha sala. Só que ele é... Argh! Muito nojento! Quem no mundo limpa o ouvido com o dedo mindinho e ainda guarda a cera debaixo da mesa? Eca.
      Mas pelo jeito ele é o que me resta. Só de pensar nisso um arrepio atravessa minha coluna e desce por todo meu corpo e para dentro do meu estômago e embrulha no mesmo instante.
     Droga! Será que não tem nenhum homem bonito e solteiro por aqui?
     Meu telefone resolve me assustar, tocando alto. Minha irmã de novo. Acho que sua missão aqui na Terra é esfregar na minha cara o quanto sou fracassada. Sei que não faz por mal ou faz e não tem ideia do quanto consegue me deixar triste.
      Eu não preciso saber o quanto sua vida como editora chefe da maior e mais famosa revista de moda é cansativa ou quanto os preparativos do seu casamento está deixando ela ansiosa para o esperado dia. Eu realmente não pergunto nada, mas o fato de querer que eu saiba que aos 22 anos ela tem uma vida perfeita, faz que eu me sinta uma pequena e insignificante formiga pronta pra ser esmagada.
      Por fim resolvo que vou deixar tocar até ela se cansar, só que o barulho do meu telefone começa a me tirar do sério no segundo toque.
     Levo o fone ao ouvido.
     — Achei que não estava em casa, Ratchel. Que bom que atendeu.
          Eu não queria estar.
      — Estava cochilando.
      — A essa hora?! Tanto faz. Preciso saber se vai trazer alguém para o casamento para que eu possa colocar na lista de convidados.
      E ela insistia nisso desde a semana passada.
         — Sim, Rebecca.
         Fiz uma careta.
        — Sério?! — Notei seu sútil tom de sarcasmo. — Só não vale ser seu amigo do marketing, porquê todos nós já sabemos que ele é gay.
      Ela tinha que me lembrar disso. Tinha que lembrar justo disso! É eu tive a péssima ideia de apresentar meu melhor amigo — e gay— para toda a minha família, achando que ele iria se comportar. E Daniels tava interpretando bem seu personagem de homem hétero, até começar a beber com meu tio Joe.
       E o final de tudo foi catastrófico! E foi naquele momento que ele começou a incorporar a Lady Gaga no meio da sala. E eu queria cavar um buraco e me esconder para o todo sempre.
       — Claro que não, Rebecca. É outra pessoa.
         — Ahh!! Que bom Ratchel, agora preciso desligar. Tenho que editar uma entrevista com uma modelo hiper famosa. Se cuida.
          — Ok.
       O telefone ficou mudo. Algo que não posso esquecer: Nunca atender a um telefonema de Rebecca.
                         
                              °°°°

      — Senhora não há nada que podemos fazer.— Disse Daniels ao telefone assim que entrei na nossa calorosa e infernal sala de atendimento e reclamação do banco Chapping. Daniels lixava as unhas da mão esquerda.
     E eu como sempre havia chegado atrasada e agora para piorar completamente encharcada e suja de graxa.
      Meu velho chevrolet resolveu que iria me dar trabalho hoje. E por puro capricho parou na maior avenida do centro. Valeu carrinho! E por conta disso tive que deixa-lo por lá e vir caminhando debaixo de chuva.
     Não sentia meus dedinhos dos pés.
     — Oi.— Cochichei, indo dar um beijo em sua bochecha.
     Ele abafou o fone e se virou pra mim.
       — Você está péssima!— Reparou.
     Sentei em frente ao meu computador e o liguei.
       — Meu carro deu seu último suspiro hoje.
       — Eu sinto muito.
     Coloquei meu Hed7 e liberei a linha.
       — Não, senhora. — Continuou Daniels.— Não, senhora. — Ele fez uma pausa.— É claro senhora.
      — Banco Chapping, Ratchel, boa tarde.— Disse com a minha voz de segunda-feira.— No que posso ajuda-lo?
     E assim começa o meu dia. As vezes —só as vezes mesmo, eu não costumo fazer isso todos os dias —, eu simplesmente deixava a linha ocupada ou colocava uma música chata e irritante para tocar, enquanto ouvia Daniels se lamentar de mais um final nada amigável no seu namoro. E ele termina todo final de semana.
     É muito melhor ouvir ele do que as reclamações de clientes neurótico.
      — Acredita que ele me fez escolher entre ele e os cds da Lana Del Rey? Daí foi o fim!— Disse Daniels, gesticulando a lixa no ar. — É óbvio que escolhi a Lana!
      Dei risada. Se eu não estivesse tão adaptada as brigas entre os dois é lógico que iria estranhar. Semana passada foi os cds da Madonna. O bom que eles sempre voltam por mais que Daniels não admita isso.
      Voltei a atender à minha ligação.
     —Banco Chapping, Ratchel, boa tarde.— Digo meu texto decorado.— No que posso ajudar?
     — Achei que não iria mais me atender.— Falou uma voz masculina, com tom de brincadeira.— Tanto faz. Queria resolver um problema com meu cartão.
     Dei a ele toda a minha atenção.
     — O senhor realmente precisa vir ao banco e conversar com seu gerente. — Respondi, enrolando o fio do telefone no dedo.— Só ele pode te ajudar.
      O cara deu um riso.
     — Está bem, obrigado.— A linha ficou muda.

                            °°°°

    Daniels teve que me dar uma carona até minha casa em seu carro nada discreto enquanto deixava a voz de Lady Gaga explodir meus tímpanos.
     Encostei a cabeça no vidro desejando a minha cama. Hoje eu realmente me estressei a um nível que não cabia em mim. Senti vontade de enforcar alguns dos clientes e depois o meu chefe, que resolveu chamar a minha atenção mais uma vez.
      — Qual foi a desculpa de agora?— Ele parece um pimentão vermelho e aquele terno parecia apertado o bastante para sufoca-lo.
      Eu olhava os meus dedos.
     — Meu carro quebrou.— Falei a mais pura verdade.
      — Agora foi o carro, Humm. Ratchel é a quarta vez só essa semana que você chega atrasada.— Ele é um careca ridículo.— Já estou cansado de passar a mão na sua cabeça.— O fato de conhecer minha mãe é minha salvação para ainda continuar aqui, ele sempre taca isso na minha cara.
        — Não vai se repetir. Eu prometo.
        — Vou te dar esse voto de confiança. O último.
      Sai da sala chingando o fato de ser uma derrotada, o fato do meu carro está estacionado em algum lugar por eu não ter um tostão no bolso para pagar um guincho e ainda mais por ser uma encalhada.
       O que há de tão errado comigo, droga? Não sou tão feia assim! Talvez se fosse a mesma tapada da quinta série tudo seria justificável; Mas não sou. Até tirei meu aparelho para ser bem aceita na sociedade.
      Mas ainda sim eu não conseguia fazer ninguém gostar de mim. Parece que tenho uma placa enorme de neon na minha testa com as palavras gritantes: FIQUE LONGE, CARA. Porque não tem outra boa explicação para justificar o fato de eu ainda estar solteira.
      Talvez Rebecca tenha razão e está na hora de aceitar o fato de que não tenho uma outra metade, que não tem ninguém no lance de 1.0000 metros que possa me completar.
     E se ela repetisse isso mais uma vez, daria um tapa bem dado nela.
        — Ratchel, você quer realmente ir pra casa?— Daniels era outro que só enxerga as coisas feias em mim.— você está péssima! E digo isso, porquê sou o seu melhor amigo.
       Obrigada.
       — Preciso cair na cama e esquecer do mundo, Daniels. Antes que eu resolva matar alguém.
       Ele riu.
       Estacionou em frente da minha casa e esperou antes de sair, eu fiquei parada em frente à porta querendo que as coisas voltassem ao momento em que existia coisas boas. Mas quando foi que isso existiu?
      Destranquei e caminhei como um zumbi no escuro, tateei as paredes e achei o interruptor. Joguei meus sapatos, tirei meu casaco deixando em cima da mesa, liguei meu notebook e fui ver o que tem de bom para comer.
     BAcabei pegando uma lasanha em uma vasilha que minha mãe me trouxe semana passada, esquentei no microondas e antes de cair no sofá, fui tomar um banho para ver se meus nervos relaxava; Em vão, apenas me estressei ainda mais quando meu chuveiro resolveu queimar. Que legal!
     Desisti da sorte naquele momento e fui me embolar no sofá com meu notebook e meu pedaço de lasanha.
      Queria matar Rebeca por lotar a caixa de mensagens do meu e-mail com bobeiras:
     Não esquece do namorado, maninha.
    Vai realmente trazer alguém, Ratchel?
    Quer que eu fale pra mamãe que você não conseguiu um namorado a tempo?
     Eu tenho alguns amigos, se quiser posso te apresentar.
     Vai a merda, Rebecca! Pensei enquanto desligava o computador. Mas assim que meu dedo foi para desligar, a caixa de mensagem aptou. Desconfiei que era Rebecca, mas resolvi dar uma olhada.

     Acho que ainda se lembra de mim Ratchel ou assim espero. Estou aqui na sua cidade e preciso te ver.
     Andrews Manglover

     Meu coração foi na boca. Ele agora? Será que essa é minha ajuda divina? É... Andrews, seu desgraçado! Eu me lembro bem de você. Eu me lembro muito bem de você!

No mesmo instante respondi, marcando em uma cafeteria. O destino não iria me premiar com outra chance como essa, não mesmo. O que é um Andrews pra quem já está toda ferrada?

UM AMOR, POR FAVOR.Onde histórias criam vida. Descubra agora