Era tradição.
Uma tradição de merda.
Eu não entendia o porquê toda véspera de natal eu tinha que assistir Titanic. E mesmo sem saber o porquê eu repetia isso todos os anos, era uma porcaria. O pior de tudo era que meus olhos ainda existiam em denunciar minha cruel sensibilidade toda vez que Jack aparecia na cena. Conclusão: o filme todo. O navio afundou e os créditos finais apareceram na tela. Passei as mãos no rosto tentando me livrar da sensação deprimente que o filme me trazia. Por que eu insistia nisso ainda?
Levantei da grande e confortável poltrona laranja do meu pai e fui para cozinha. Não se tinha muita coisa para fazer até Letícia chegar. Eu não gostava de preparar tudo sozinha, por isso sempre esperava por ela. Esse ano não seria diferente. Fui até o armário, peguei a garrafa de café e despejei o conteúdo no copo, levando a boca. Eu era uma viciada em café, assumida. Um dos meus lugares favoritos do mundo era a cafeteria de um amigo que ficava no centro da cidade. Olhei para o relógio na parede, marcava 15h45min, faltava apenas alguns minutos para papai e o Jonny voltarem do parque e a casa ainda continuava do mesmo jeito. Louça suja, roupas espalhadas pela casa, móveis e carpete empoeirados, árvore de natal no porão e mais desorganizações. Parecia que um tsunami tinha passado pela casa e se hospedado por um tempo. Lembrei-me da promessa que fiz a Jonny de decorar a árvore de natal e me xinguei por isso. Tinha que parar com isso também, promessas não são pra mim. Coloquei o copo com o resto de café no balcão e fui para sala. As coisas estavam feias. Tinha pouco tempo e muita bagunça para organizar. Ouvi o toque do meu celular, levantei algumas roupas a sua procura, até encontra-lo entre um livro infantil e um de romance na estante.
- Allie?
- Oi, Lê, fala!
- Escuta, esse ano eu não vou poder te ajudar com os preparativos da ceia.
- Por quê? – me controlei para não gritar com minha melhor amiga. O que eu faria sem Letícia?
- Estou na casa de Thomas e não sei que horas vou chegar ai. – ela disse com a voz a arrastada. – Desculpa.
- Poxa, Letícia, você sabe que eu estava contando com você. – disse triste. Nada como uma notícia dessas pra melhorar meu dia.
- Eu sei, desculpa. A mãe dele insistiu pra eu ficar aqui depois do almoço e provar do seu bolo de beterraba com calda de chocolate. – ela tinha um tom de desespero na voz. A sogra de Letícia era uma aposentada que gostava de passar a maior parte de seu tempo livre exercendo seus talentos culinários, e na maioria das vezes usava Letícia como cobaia.
- Bolo de beterraba? – franzi o cenho e escutei a gargalhada de Letícia. Tinha certeza que ela sabia a expressão que eu tinha feito.
- E com calda de chocolate. – ela enfatizou a última parte.
- Tudo bem. – eu não estava chateada com ela, mas sim com pena. Quem é que come bolo de beterraba com calda de chocolate?
- Allie, você não é um desastre na cozinha. – ela tentou me confortar. – Eu sei que você vai se sair muito bem sozinha.
- Ok. – olhei para a casa toda desarrumada. – Vou ver o que consigo fazer.
- Te vejo a noite?
- Sim, e traga presentes.
- Thomas comprou um grande presente para o Jonny, não vê a hora de entregar para o sobrinho. – ouvir vozes do outro lado da linha – Agora tenho que ir, a mãe dele está vindo com o bolo e o chá. Desculpa mesmo, ok? Beijos!
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Light on My Heart
RomanceTudo que Alice Burckle quer é passar o natal em paz com sua família e amigos. Porém seus planos são transformados quando seu ex-namorado do colegial Noah Henson bate em sua porta.