Sexta-feira, 1 de novembro de 2013 - O VÉU

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Ainda é cedo e a correria do final de semana no Extra Hipermercado da Avenida Francisco Sales ainda não começou. Por volta das 13 horas, existem mais funcionários trabalhando do que fregueses. Marcos relaxa da semana estressante de Campinas passeando entre as gôndolas. Sempre considerou 'fazer supermercado', expressão herdada do pai, uma atividade terapêutica, desde que não fosse nos dias lotados em que as pessoas ficam trombando os carrinhos umas nas outras. Também herdara do velho o gosto em manter uma despensa abastada. De certa forma, fazendo isso ele cumpre seu papel de macho, de provedor. Porém, na realidade Vanessa é quem mantém as prateleiras cheias, uma vez que fica tudo contabilizado como "custos do bufê". Além do mais, ela compra em grandes quantidades da Makro, e no frigir dos ovos a despesa da família de quatro pessoas é praticamente negligenciável frente aos custos do bufê.

"As vantagens de se ter uma empresa no Brasil... Na Suécia, é crime fazer isso. Foi complicadíssimo conseguir o financiamento do apartamento pela Protheus, mas valeu a pena. Os juros suecos são de 3% ao ano. Ademais, nem sei por que o banco SEB criou tanto caso, uma vez que apartamento não é igual carro. Não tem jeito de sumir. Se eu não pagar, eles têm como tomar o imóvel. Perder dinheiro é que não vão. O problema em ter o financiamento do apartamento pela Protheus é que, se a empresa falir, o apartamento vai junto. Preciso ver como vou conseguir um dia transferi-lo para o meu nome. Aliás, meu em termos, melhor transferir direto pras meninas. Usufruto meu e da Vanessa, mas colocar no nome delas."

Pega um vidro de mostarda Dijon e um catchup novo, com vinagre balsâmico. Um vidro pequeno de alcaparras e outro de alcachofras. Coisas exóticas que gosta de colocar em seus pratos, mas que a Vanessa não costuma comprar: "Hoje vou fazer um strogonoff, deixa eu pegar uns cogumelos. A Vanessa costuma até comprar champignon, mas sempre cortados. Vou comprar dos pequenos inteiros, que eu gosto mais."

Alcança um saquinho de arroz preto e outro de feijão Andu. "Epa, achei! Conchinhas de fazer tacos mexicanos! E tortillas. Eu gosto dos tacos crocantes, a Vanessa os prefere feitos com o pão, tortillas bem grandes. Todo mundo fica feliz." Passa batido nos pacotinhos de temperos e kits semiprontos. Sabe fazer tacos, guacamole, pico de gallo, tudo de cabeça medindo no olho.

"Talvez no sábado eu detone uma noite mexicana pra turminha. Com direito a margaritas! As meninas adoram, contando que não seja muito apimentado pra Verônica. Poderíamos até pegar um filme dentro do tema mexicano. 'Como Água para Chocolate'. Porque não? Faz muito tempo que assisti, e as meninas nunca viram. Talvez seja muito pornô para a Verônica. Tem aquela cena do chuveiro que ela sai trepando com um soldado... Aff... Tô enganando a quem? Ela vê coisas 10 vezes pior em qualquer novela todo dia."

Finalmente chega ao setor de higiene, que é a verdadeira razão pela qual foi ao Extra. Precisava comprar sabão líquido para o banheiro e 1001 shampoos especialíssimos. Valéria gostava do Neutrogena de Camomila, Verônica do Kérastase vermelho e Vanessa do Elséve arginina. Neste último, na embalagem, está escrito em letras grandes "Somente para uso profissional". Marcos olha em volta. Imagina câmeras o observando. Assim que pegar na embalagem, um time da SWAT irá aparecer, com policiais saindo de todos os lados, usando roupas pretas e apontando metralhadoras:

- O senhor por acaso é um profissional? Tem identificação?

"Uso profissional o cacete, ainda mais um vidro tão pequeno. Profissional que eu conheço usa é um galão de 5 litros. Ser pai de meninas é algo especial. É preciso saber esses detalhes, comprar cremes, esmalte, make-up. Pior que assim que pego o jeito, elas trocam as marcas, mudam tudo... Mas ainda prefiro comprar shampoo que absorvente. Pelo menos é mais emocionante. Ainda não vi absorvente 'de uso profissional'."

Entra no Mercedes Classe E azul-marinho. O carro ainda cheira a novo, é um leasing pela FaceApp. "Se tivesse sido pela Protheus da Suécia seria uma maravilha. Mas aí é pedir demais." O carro tinha os vidros blindados. Sentia-se seguro dentro da máquina. "Andar com um carro importado chama a atenção, por outro lado o vidro blindado e os múltiplos airbags compensam."

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