Capítulo 3 - Manhã de segunda-feira

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Mari

O fim de semana foi horrível. Não que eu não tivesse nada interessante para fazer, mas tudo parecia meio sem graça só porque Dan não estava lá para me zoar. Eu senti saudade dele, dá para acreditar nisso? Mas não, eu não daria o braço a torcer. Se Dan quisesse falar comigo, que viesse até mim e pedisse perdão.

A segunda-feira amanheceu do jeito que todo sábado gosta: chuvosa e fria, pedindo à preguiça para me jogar de volta na cama. É claro que esse complô natural não ganharia de mim. Levantei-me depressa e fui direto ao chuveiro. Água fria... Gritei, confesso, entretanto acordei de uma só vez.

Coloquei a farda do colégio, escovei os dentes, penteei o cabelo, calcei os sapatos e desci a escada correndo, elétrica, para tomar meu café da manhã. Minha mãe já estava lá, de cara amassada, como se não tivesse pregado o olho a noite inteira, mas estava lá, bem como a bandeja de frutas, os biscoitos, os pãezinhos integrais, o queijo branco, o tradicional suco de laranja, o iogurte natural — que apenas ela conseguia tomar — e o leite quente com achocolatado. Pode acreditar, ninguém em minha casa gostava de café.

— E aí, mãinha? — perguntei, sentando-me à mesa, em frente a ela. — A senhora dormiu direitinho?

— Hum... — meneou a cabeça e empurrou um pedaço de mamão para mim. — Mais ou menos — suspirou. — Seu pai continua na mesma... Vira para um lado, vira para o outro, joga a perna em cima de mim, rouba o lençol, mete a mão na minha cara...

Eu ri.

— Ah, vá rindo — retrucou, mas riu de volta. — Espero que você se case com um homem que tenha melhor modo de dormir do que seu pai. E, falando nele, olha ele aí.

Meu pai era um cara alegre, de boa mesmo. Levava a gente para almoçar ou jantar fora todo domingo, inventava viagens divertidas nas férias, notava as mínimas mudanças na gente e na casa, sempre elogiava a comida de mãinha — mesmo quando saía bastante salgada — e nunca ficava chateado com nada.

— E aí, doutor Cláudio?

— Dia lindo, filhona! — beijou minha testa.

Fizemos nossa refeição bem depressa e corremos até a garagem, antes que a chuva terminasse de inundar Salvador e nós ficássemos presos no rio que se formava na avenida Centenário.

Mal saímos de casa, meu celular vibrou. Olhei o visor e gelei: mensagem de Dan. Abri depressa e li: "Seu pai vem me pegar hoje ou não?", só isso. O que será que Dan pensou, que os dedos dele cairiam se escrevesse "bom dia" antes de tudo?

— Painho — falei e ele olhou para mim com cara de "hã?" —, vê se não se esquece de pegar Dan, tá?

— Algum dia eu já me esqueci? — lançou seu velho sorrisinho com o canto da boca.

É, eu sei que qualquer um em meu lugar não faria aquilo, deixaria Dan para trás. Só que eu era superior, não magoaria aquele boboca dessa forma idiótica. Inteligência existe para tornar as coisas mais perfeitas, engenhosas, e eu era assim.

Dan teria que se arrastar para conseguir o meu perdão.

Mari

— Bom dia, tio — ele falou, assim que entrou no carro, com seu sorriso de lata, o cabelo molhado, a camisa e os óculos respingados da chuva. — E aí, Mari, como foi o fim de semana? Legal?

Eu respondi? Claro que não. Apenas lancei uma rabeada de olho na direção dele e retorci o nariz.

— O meu foi ótimo — disse isso e pulou para o meio do banco traseiro, voltando-se para frente, feito uma criança de cinco anos. — Fui ao cinema com Paulinho e Lucas — eram os primos dele, duas criaturas terrivelmente insuportáveis. — Depois a gente foi pro Planeta Açaí. Eu tomei aquele morango na tigela que você adora, Mari. Pena que você não tava lá, né?

Simplesmente Dan - Livro 1 #DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora