Traição Aos Templários

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  Não fora, porém, a cobiça do rei da França, empenhado em guerras desastrosas e com o erário empobrecido, os templários continuaram a sua rota. Filipe IV, O Belo, todavia, insuflado por Nogaret e premido pelas circunstâncias adversas na guerra contra os ingleses,  resolve apossar-se das riquezas templárias e para isso recorre ao apoio do papa propondo-lhe a divisão em partes iguais. O pretexto era que os templários se haviam tornado idólatras e réus de crimes monstruosos, entre os quais avultavam o desacato a cruz e a prática de vícios repugnantes.

  A imprudência do rei não lagrou as simpatias de Bonifácio VIII. Demais sabia o pontífice quais eram as intenções do rei; e conquanto os ex-pobres cavaleiros de Cristo, afastados como andavam da severidade monacal, merecessem as admoestações canônicas, não podia a igreja esquecer o muito que lhes devia, o sangue que haviam derramados nas cruzadas e o auxílio que haviam prestado aos príncipes na expulsão dos mouros e na dilatação dos domínios da cristandade. E entre admoestá-los para reconduzi-los à obediência e à observância dos dogmas, e entregá-los ao árbitro cruel do ambicioso e facinoroso monarca, o papa optava pela primeira solução.

Os papas eram por esse tempo os árbitros do mundo católico. Punham e dispunham reis, ligavam e desligavam súditos, usando discricionariamente dos raios celestes como representantes exclusivos da divindade. Bonifácio VIII recusara a proposta de Filipe IV. A princípio desconversou e por último falou claro: - Nos templários só quem manda é a igreja. O rei mobiliza, então, as forças que hão de aniquilar o papa.

A resposta do papa longe de convencer o rei a mudar o rumo dos seus desígnios, mais o afervorou ainda na idéia de se apossar dos bens da Ordem do Templo, já agora desobrigado de dividi-los com o pontífice romano. Bonifácio responderá as malveladas ameaças do recurso à força com outras ameaças de recurso as imposições canônicas e, juntando a ação aos argumentos enérgicos com que repelira as alusões a "possíveis atos de violência", expediu em 5 de dezembro de 1301 a bula " Ausculpa, Filii", na qual insistia pela paz e a harmonia entre os príncipes cristãos, condenando a guerra de agressão e lembrando ao rei que a "prudência deve ser a maior virtude dos reis". A bula terminava por uma censura enérgica a ação agressiva do monarca que considerava divorciado do povo, concitando-o a não prosseguir na sua conduta, sob pena de o submeter a julgamento de todos os representantes da Igreja na França, que ele, Bonifácio convocaria para Roma, e cujo veredicto seria inapelável.

  Felipe irritou-se com a reprimenda do Papa e , convocando os nobres e o povo, mandou queimar a bula em auto de fé, sob a alegação de que Bonifácio ofendera os brios da França, e mandou prender o papa, convocando os Estados Gerais que deveriam estabelecer o poder laico sobre a autoridade do papado romana. O povo soltou o pontífice fracassando o atentado, mas Bonifácio VIII com profundo desgosto morria de traumatismos moral. " Para o combate todos os meios são lícitos " — teria exclamado o inescrupuloso rei da França, e a essa cínica teoria estava daquele momento em diante condicionado o futuro dos Templários.

  Convocado o conclave para a eleição do novo papa, mobilizou o rei Felipe os cardeais sensíveis à sua real munificência, fazendo eleger o arcebispo de Bordeaux, Bertrand de GOT, que tomou o nome de Clemente V, e para tê-lo mais sujeito ao seu poder, impôs-lhe a residência em Avinhão, o que passaria à história como o segundo "cativeiro da Babilônia". Filipe coloca-o entre as pontas de um dilema: ou entregar-lhe os templários, ou perder a liberdade e a vida. Clemente cede! Dos seus lábios apenas um murmúrio lembra que sua consciência se rebela contra o crime, mas o seu apego à vida é mais forte que o remorso da consciência.

   O seu espírito se contorce nas cascas de uma agonia mortal, ao recordar os sacrifícios, as práticas religiosas e o ardor com que os templários haviam combatido os infiéis. Hesita em acreditar nas acusações, e não vacila em deixar na bula " regnans in coelis" a amargura que lhe vai na alma. Não era, porém, com lamentos, nem com manifestações de amargura, ainda que sinceras, que o papa conseguiria opor-se aos desígnios malsãos do rei de França. Faltou-lhe a coragem para erguer a toda a altura da sua autoridade, sacrificando embora a vida, mas salvando o poder moral da Igreja.

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