Capítulo II - Oração Da Glória Pires e Água Benta De Geiger.

101 4 1
                                    

Devair: Vanda! VANDA!

Lentamente abri os olhos, o sol já estava nascendo. Raimundo estava capotado no chão roncando. Ainda me pergunto como consigo dormir com esse ronco, cruzes. Devagarinho saí da rede e fui a entrada de casa.

Vanda: Pois não?
Devair: Sua irmã tá te esperand... O que é isso no seu rosto?
Meu rosto? Ah não ele viu minhas olheiras, quem mandou chorar sua sensível? Taí pagando mico com dois murros nos olhos. Já sei, vou me fazer de desentendida.
Vanda: O que tem no meu rosto? Que fique claro que eu não chorei.
Devair: Umas... manchas vermelhas, é melhor você sair daqui antes que piore. An? Você chorou?
Passei a mão no meu rosto e senti minha pele queimando. Deus! eu realmente preciso sair daqui.

Vanda: Onde ela está?
Devair: Na dobra da esquina. A prefeitura bloqueou a rua, carros e carroças não podem mais passar por aqui.
Devair veio em minha direção e meu deu um abraço (aí, meu rosto).
Devair: Me perdoe se fiz mal a vocês dois, Maria Gabriela gostava muito de sua companhia.
Vanda: Você não fez mal a ninguém, coloque isso na sua cabeça, e saiba que eu também vou sentir sua falta.
Devair: Boa sorte pra vocês dois e para o bebê.
Vanda: Obrigada. Por tudo. Mas onde você vai morar agora?
Devair: Vou passar um tempo no lá Estádio Olímpico. Alguns dos vizinhos também vão ficar por lá. E vocês?
Vanda: Nós vamos ficar na casa da minha irmã. Bom, se cuida.

Devair se despediu e foi caminhando na rua até sumir da minha vista. Entrei na casa e... meu rosto! Fui correndo no banheiro ver o meu rosto.
"Minha nossa senhora da perpétua socorro! Tô parecendo um dálmata alienígena com catapora! Mas tudo bem, logo logo vai passar, e se não passar, tenho uma irmã cirurgiã que vai me deixar igual a Glória Pires, amém". Faço o sinal da cruz e vou saindo do banheiro.

Ao sair do banheiro vi o Raimundo aparentemente com uma expressão nada boa.
Raimundo: Já disse que não quero ver você conversando com ele.
An, oi? ele? ele quem? Ah o vizinho.
Vanda: Bom dia pra você também, dormiu bem? Tá vendo a minha cara cheia de manchas? Pois é, já não podemos mais ficar aqui, Valéria já está nos esperando e temos qu...
Fui interrompida pelo Raimundo que segurava meus braços bruscamente.

Raimundo: EU JÁ DISSE QUE NÃO QUERO VOCÊ PERTO DELE, ESTÁ ME ENTENDENDO!?
Em seguida ele joga o meu corpo no chão.

Ele me jogou no chão...

E ele sabe que estou esperando um filho dele...

Ele. Me. Jogou. No. Chão.

Ele nem notou o meu rosto cataporado.

Já falei que ele me jogou no chão?

Lágrimas alertavam sair dos meus olhos, mas não vou chorar. Seja forte, Vanda.
Vanda: Por que fez isso?
Raimundo: Se eu pudesse jogaria com mais força.

Oi, como assim? Como é que é querido?

Ainda no chão, pego em seus joelhos e o derrubo no chão, rapidamente me levanto, pego o seu braço direito e ameaço a quebrá-lo. Agora despertou o dragão.
Vanda: ENFIA ESSE SEU CIÚMES NO SEU CU. SE VOCÊ PENSA QUE SÓ PORQUE ESTOU GRAVIDA VOCÊ PODE ME TRATAR ASSIM, TÁ MUITO ENGANADO, ENQUANTO VOCÊ FOR O MEU MARIDO, É EU QUEM MANDO AQUI, TÁ ME ENTENDENDO? - ele assentiu. - Agora vamos sair daqui que é falta de educação fazer as pessoas esperarem.
Ele gemia de dor quando apertava mais o seu braço, a expressão de Raimundo era hilariante.
Raimundo: Como você consegue fazer esses golpes grávida?
Vanda: Não sou eu quem estou forte. É você quem está fraco.

Solto ele e saímos de casa. Mas antes de ir embora de vez, olhava para nossa antiga casinha, e do lado, da dona Gabriela. Engraçado que dois minutos atrás, eu estava ameaçando quebrar braços, e agora, estou aqui, querendo chorar.

Odeio hormônios. Odeio gravidez.

Se eu não me engano, amanhã é o dia que o povo que cuida da radiação vem por aqui limpar o "lixo radioativo" e demolir algumas casas...
Minha casa. Meus pertences. Perdi tudo. A tristeza que sinto é enorme de ser forçada a abandonar tudo que batalhamos e conquistamos. De novo, seja forte Vanda.
Começamos a dar leves passos para a esquina, olhando tudo, provavelmente pela última vez.

À medida que nós caminhávamos surgia na nossa vista um gol esverdeado e uma Valéria sorridente de jaleco branco acenando pra gente (exibida). Nos aproximamos dela e ela veio em nossa direção com um Geiger.

Valéria: Espera, péra péra péra aíí- rodeando o geiger que nem padre com água benta nos cristãos - E... Pronto! Tá tudo ok, agora quero abraç... MEU DEUS VANDA! Seu rosto! tadinha, já vamos indo em casa ver melhor, tomara que essas manchas não sejam permanentes. Já tomaram café?
Vanda: Não.

Pérai, manchas permanente?

Ela olha para o Raimundo. Creio que está tentando ser simpática com ele, já que costumam brigar por tudo.
Valéria: E aí cunhadão? Soube que precisa de... tratamento. Espero que não seja grave a situação. Mudando de assunto, como vai o bebê? Quantas semanas?
Vanda: 8 semanas.
Valéria: Qual foi a última vez que vocês dois foram ao hospital?
Raimundo: Duas semanas atrás, quando já estávamos contaminados, foi lá que descobriram que eu tenho tireoide e que a Vanda estava esperando um bebê.
Valéria: Hum... ok! Agora vamos, entrem no carro e quando chegarmos em casa, a primeira coisa que vou fazer em vocês são uns exames básicos. Enquanto estiverem em minha casa, serão tratados adequadamente. Lembrem de que podem ficar por lá o tempo que quiserem. Vocês terão uma longa e entediante jornada para a cura e o nascimento deste pequenino.

ImuneOnde histórias criam vida. Descubra agora