Prólogo

131 13 19
                                    

"Costumo pensar que almas gêmeas são como dois imãs, se atraindo um para o outro. Quando duas pessoas nasceram para ficar juntas, elas eventualmente encontram o caminho de volta"

       Agosto de 2005, Paris

        Existe algo mais trágico do que ter nascido no mesmo dia em que Lady Diana resolveu morrer?

   Estávamos todos comemorando em uma reunião íntima meus 18 anos com muitas risadas, bebidas e todo aquele papo com a família dizendo o quanto eu era adorável quando comia areia nos verões que viajávamos para Califórnia, onde morava minha avó Milly. Constrangimentos aparte, eu estava bem feliz, finalmente havia feito 18 anos e estava cercada de todas as pessoas que eu me importava. Mas, por algum motivo, me sentia culpada por estar feliz no dia em que alguém tão importante como Lady Di estava fazendo aniversário de morte, se é que esse termo existe.

   Além disso, aquele não era só mais um aniversário, era também uma despedida. Meus pais e eu havíamos nos mudado da Inglaterra para a França 3 anos atrás, atendendo um pedido da empresa que minha mãe trabalha. Depois de muitas discussões em família, choros e abraços, lá fomos nós com nossos trapos para um outro país. Acontece que, o que era para durar apenas um ano acabou se estendendo por 3 anos. E depois que eu finalmente me acostumei com tudo, fiz amizades e até comecei um namoro, é hora de voltar para a casa. 

   Durante minha festa de aniversário/despedida, no meio de risadas e David Bowie, tentava lembrar de tudo que deixei para trás na Inglaterra, meus amigos, meus planos, alguns sonhos, e certamente, Chuck. Chuck foi meu primeiro amor, coisa de adolescência, eu acho. Éramos inseparáveis, era mais que óbvio que estávamos apaixonados um pelo o outro mas, quando nos demos conta disso, a França entrou no nosso caminho. Mas ainda guardo em dentro de mim cada momento que compartilhei com ele, momentos de pureza e sinceridade. É claro que eu amo meu namorado, Patrick faz de tudo pra me ver bem, me dá flores e é romântico até de mais. Porém o que eu sentia pelo Chuck era algo que nem eu mesma consigo explicar, eu sentia que com ele eu podia fazer o que eu quisesse e, apesar de nos nunca termos dado nem se quer um beijo, ele foi o amor mais profundo que eu já tive. Posso dizer que Charles, foi a melhor coisa que eu nunca tive.

  Enquanto todas as minhas lembranças passavam pela minha cabeça, a voz da minha mãe me despertou.

  — Valentina, já é tarde. Amanhã temos um voo cedo. — disse minha mãe, com um tom doce na voz.     

   — Tudo bem, vou me despedir dos meus amigos — respondi. 

    Foi só quando caminhei para a porta ao lado de Samon, Julie, Mary Lou e Patrick, que me dei conta de que talvez nunca mais os veria. Nunca mais ouviria Julie reclamando que seus pais não lhe dão liberdade,  Samon e Mary Lou discutindo e fazendo as pazes todo fim de semana e Patrick.. Nunca mais o beijaria ou sentiria o conforto que é estar nos seus braços. Eu realmente os amava, e amava o fato de ter conseguido construir essas amizades. No momento em que me dei conta de que não teria mais isso, senti meu rosto corar enquanto lágrimas tão pesadas quanto o aperto que eu estava sentindo no meu coração desciam sobre minhas bochechas e eu jurava que podia ouvi-las cair no chão.

   — Valentina, não fique assim — disse, Julie enquanto tentava, fracassando, segurar as lágrimas.

   — Ei, essa não vai ser a última vez que vamos nos ver, Val. Tenho certeza disso, nada acontece por acaso e nossa amizade com certeza não acaba aqui. Nos te amamos, independente de onde você estiver, Ok?

Apenas concordei com a cabeça enquanto tentava eternizar aquele momento na minha mente: Nós cinco de mãos dadas dando força um para o outro, como sempre foi.

   — Te levo amanhã no aeroporto, então?  — disse Patrick, que diferente de Julie, nem se quer tentava esconder as lágrimas.

   — Vou te esperar — Foram as únicas palavras que consegui dizer.

   Na manhã seguinte acordei com os olhos inchados e mal conseguia dar uma palavra. Resolvi que ia me ligar no modo automático, era o que eu fazia para evitar sofrimento. Levantei da cama, tomei banho, tomei café da manhã e me arrumei. Me sentei no velho balanço que havia no jardim da minha casa enquanto esperava Patrick, lembrando que ali mesmo naquele balanço ele me pedira em namoro. Lembro até hoje das estrelas e da forma como ele me olhou, ele merecia algum prêmio por ser tão romântico. 

— Oi, moça — disse Patrick, meio sem jeito — Hora de ir.

— Já? vamos ficar mais um pouco, aposto que tem umas séries legais na Netflix — disse, tentando deixar as coisas num clima mais leve mas, como já previsto, não adiantou muito.

 — Era tudo que eu queria porém hoje a senhorita tem um compromisso com o aeroporto.

    Concordei e dei um sorriso de lado enquanto ele botava minhas malas no carro. Meus pais me deixaram ir com ele no carro sozinha para ter mais um tempo para me despedir. Enquanto ele dirigia, eu memorizava cada parte dele, os olhos castanhos, a barba mal feita e o modo como ele segurava o volante. Eu irei sentir falta até do modo que ele olha pro nada fixamente, as vezes tento imaginar tudo que pode estar se passando na mente dele.

  — O trânsito está péssimo hoje, desculpe eu devia ter previsto. Não quero que você se atrase.

 — Tudo bem — respondi. — Assim ganho mais tempo com você — Falei enquanto tocava em sua mão.

    Depois  de 2h dentro do carro finalmente chegamos. Encontrei meus pais me esperando e dizendo para irmos logo pois o voo já ia sair. Respirei fundo enquanto tentava não chorar ao olhar para Patrick.

  —  Eu não consigo fazer isso — disse, enquanto podia sentir cada parte de mim despedaçar.

 —  É claro que pode. Você é a garota mais extraordinária que eu conheço, você vai passar por isso.

 — Mas e você, Patrick? como nós vamos ficar? Isso tudo não é justo, eu vim pra cá, eu fiz tudo que eles queriam, eu abandonei a minha vida, meus amigos, tudo. E quando eu finalmente me encontrei aqui eu tenho que ir embora.

 — Eu sempre vou estar com você, Valentina. Você sempre poderá me ligar ou me mandar mensagens. Eu nunca deixarei de estar aqui por você mas não quero que você pare sua vida, entendeu? O que tivemos aqui sempre vai permanecer dentro de mim, você faz parte de mim. Enquanto a nós, nós sempre teremos Paris — disse, citando aquela velha frase clichê de Casablanca.

— E é por isso que você é a mulher da relação e não eu. Desculpa eu não consigo não estragar o momento

— E é por isso que você é o homem da relação — disse, me dando um sorriso

    Cada passo que dava para longe de Patrick e minha antiga vida, meu coração parecia menor.
  Até o momento que resolvi ser racional, já passei por isso antes e posso passar de novo, aliás isso é a vida, não é? Parece que para cada escolha escolha nós temos que renunciar algo.

Adeus, Paris.

                                                                                                 ******


ValentinaOnde histórias criam vida. Descubra agora