III - BEING A TEENAGER

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"Perguntas fáceis é contigo, Vitória! Agora sim estás a ser uma adolescente..." (ele coça a cabeça, como que a agitar as ideias, procurando algo que pela sua cara não está a encontrar) "Não existe uma resposta politicamente correta para a tua pergunta e, certamente nunca existirá, é como perguntares o que é, ou como é o amor, e isso, é algo que não se explica, não se ensina nem se aprende, simplesmente se descobre, é como procurar um tesouro numa terra inexplorada."

"Já encontraste o teu tesouro?"

"Tu és o meu verdadeiro tesouro, tudo o resto são dádivas que a vida vai partilhando comigo."

"E porque é a vida decidiu partilhar contigo um amor tão diferente do que conhecias e tomavas como verdadeiro?"

"A vida não é um teste de verdadeiros e falsos, seria demasiado fácil, há mais respostas nas entrelinhas do que as próprias linhas podem contar. A verdade é que a vida é uma montanha russa de sensações e sentimentos, excitações e hesitações, amores e desamores, tudo faz parte da vida que nos é apresentada para viver e aproveitar segundo o equilíbrio de ingredientes que mais gostemos e, que façam com que ela tenha mais sabor. Há quem não goste de chocolate e há quem derreta por um pedaço. Eu não gostava de homens, nunca tinha sequer pensado em tal hipótese, a tua mãe foi a única mulher que amei, pois foi através dela e com ela que o amor me foi apresentado, na sua forma mais simples e pura, sem nomes próprios ou apelidos, apenas como um nome comum a mim e a ela. Ela tinha o sabor mais doce que alguma vez provei, era como se tivesse sido criado para mim, e o meu paladar tivesse sido criado para saboreá-lo, aquela mistura do seu aroma natural com o meu natural aroma era simplesmente única..."

"Sim pai, já percebi a ideia, passa a frente, para o presente de preferência!"

"Tanta pressa...Então..." (ele volta a coçar a cabeça: ou sou eu que o estou a consumir muito, ou então são os piolhos)... A vida transforma-nos e, tal como tudo também o nosso paladar muda, e recentemente o meu gosto foi tocado por um sabor novo, que para além de saber a novidade, sabia a recomeço, sabia bem... Quando esse sabor ficou em harmonia com os outros ingredientes que realmente me importavam, passou a saber-me melhor, passou a saber-me a amor."

"Ah!? Não percebi, então em que parte entra a homossexualidade?"

"Muito simples, nós não gostamos das pessoas, nós gostamos do sabor que elas nos fazem saborear. Eu gostei daquele sabor e a pessoa por detrás dele, POR ACASO era um homem."

"POR ACASO?"

"Sim, por acaso era um homem. Ou tu achas que és rapariga por outra razão que não o ACASO. Não há nenhuma receita para fazer raparigas ou rapazes simplesmente acontece, o amor é igual não podes escolher o que sentir por causa do sexo da outra pessoa, primeiro tens de sentir e depois ver quem está por detrás desse sentimento."

"Oh pai, Por Acaso nunca tinha pensado assim...Por acaso tens razão...E Por Acaso tiveste azar!" Começamo-nos a rir

"Pois podia-me ter saído uma mulher na rifa, que seria tudo muito mais fácil!"

"O Acaso não deve gostar muito de ti. O que é que lhe andaste a fazer? Não me digas que ainda roubas gomas no café? Ou pior andaste a roubar velas no cemitério?"

"Eu estou no teu quarto ou num tribunal? Logo eu, um cidadão exemplar." Rio-me bastante, às vezes o meu pai diz cada piada, uiui temos um humorista perdido.

"Então foi tão simples como misturar sabores?"

"Claro que não foi fácil. As dificuldades foram e são muitas, a primeira foi reconhecer a novidade, a segunda foi entendê-la e, por aí em diante seguiu uma numeração que ainda não parou de contar."

"E não te preocupaste com o que as outras pessoas iam dizer de ti e do Ricardo juntos?"

"As pessoas sempre vão falar, bem ou mal, elas tem sempre algo a fizer, algumas não conseguem passar um segundo sem dar uso à língua afiada que Deus lhes deu. É como diria o outro: "Não importa o que digam de mim, importa o que eu faça daquilo que digam de mim" e eu só tive em conta as pessoas que me eram realmente importantes, a partir do momento em que elas aceitaram, nada me poderia levar a mudar a minha essência já finalizada."

"Qual é o meu sabor nessa tua salada russa de gostos?"

"Comida salgada!" Ele risse como se tivesse dito uma grande piada.

"Eh a minha comida não fica sempre salgada, só às vezes."

"Quase sempre, queres tu dizer! E por falar nisso és tu que vais fazer o jantar no meu dia de anos, que eu vou ter de chegar mais tarde, mas não te preocupes que venho a tempo de pôr o sal...E mais uma coisa o Ricardo vem cá comer, não te importas pois não?"

"Pai desde quando é que me pedes autorização. És um adulto lembraste? Só para que saibas vou fazer o melhor jantar que já comeste na vida, o meu talento vai ser revelado...E já agora, eu quero que o meu sabor seja chocolate!"

"Tu queres é ir dormir, que já é tarde e amanhã tens de acordar cedo."

"Eu não sei porque é que a escola tem de começar tão cedo, tenho a certeza de que se começasse mais tarde, os resultados seriam muito melhores, melhorariam para o dobro, também para o dobro é muito, mas certamente melhorariam bastante, mas a escola gosta que tenhamos más notas... " (continuo com as minhas reclamações enquanto vou à casa de banho, venho, deito-me e o meu pai aconchega-me)

"Quando fores ministra mudas isso, agora dorme... Quem é o melhor pai do mundo?"

(Que pergunta!) "Não sei! Só tenho um não dá para comparar! Pergunta ao espelho pode ser que ele te responda."

"Ainda tens dúvidas?" (E ele pega nas almofadas perto dele e olha para mim com cara de quem está a pensar em começar outra luta de almofadas "A sério pai!" e logo um sorriso invade a minha cara e atiro-lhe a almofada que as minhas mãos seguravam debaixo da cabeça, atacando-o de surpresa "Acho que ficamos os dois presos nos 12 anos". No meio do ataque de risos e de um contra-ataque do meu pai, personifico uma tentativa de desmaio, tentativa falhada porque ele não acredita e ataca-me na mesma "É este o pai que eu tenho".)

"Eu podia ter desmaiado mesmo, pai!"

"Filha, uma pessoa pode desmaiar por várias razões mas gargalhadas e felicidade não constam da lista. Até amanhã!". Dá-me um beijo de boa noite e sai de cima dos meus cobertores para ir fazer companhia aos seus.

"Até amanhã"

Finjo que adormeço logo, ninguém adormece logo que se deita, toda a gente sabe isso, menos o meu pai, ou pelo menos finge que não sabe, pois depois de apagar a luz e se dirigir à porta, murmurou como que num sussurro: "Paz...O teu sabor é paz."

Acordo com o mesmo sorriso com que adormeci, até ouvir o despertador e perceber que não é um sonho, que é a realidade a chamar-me e eu tenho mesmo que me levantar para ir para a escola. Mas primeiro deixa-me desligar o despertador e aproveitar mais cinco minutos deste aconchego quentinho, porque serão os últimos em mais de 12 horas. Quem me dera que estes cinco minutos fossem eternos... E já passou um, dois, e num ligeiro piscar de olhos já passaram quase seis minutos. "Porquê???" Num impulso de força e coragem levanto-me desta tentação, a que chamo de cama. O meu pai é que tem sorte, pelo menos o trabalho dele só começa às 9 e meia, assim é que se tem sucesso. "Vitória, se calhar o problema não é a hora a que te levantas mas sim a hora a que te deitas.", Culpa? Minha? O meu subconsciente não deve estar bem.

"Vamos lá, que amanhã ficas em casa", pensamento positivo sempre. Sim, às quartas-feiras eu não tenho aulas, é por isso que eu gosto do 12º ano. Escolho a primeira roupa do armário e vou comer, é assim que divido o meu tempo: 5 minutos para me preparar e 15 minutos para comer, uma divisão perfeitamente correta, tendo em conta que já estou há mais tempo sem comer do que sem me vestir.

Às 8 horas já estou na paragem à espera do...do...(ontem ele estava mesmo diferente, também ao tempo que eu já não o via, as férias fizeram-lhe mesmo bem, os meus olhos já tinham saudades de serem regalados com aquela beldade, os dele nunca devem ter sentido a minha presença, tanto mais sentir a minha falta, mas também no meio de tanta gente) à espera...do... do autocarro, claro.

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