Capítulo 12

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À medida que o outono se aprofundava e as folhas tomavam tons de marrom, vermelho e dourado, o caso de amor entre Harry e Sophia Jacobs não arrefeceu. Durante aquelas semanas, meus encontros com Harry eram cada vez mais raros e dolorosamente curtos. Ainda que a culpa não fosse toda dela, cada um de nós tinha as próprias preocupações naquela época, eu colocava toda a culpa em Sophia. Que direito ela tinha de ter a atenção dele? Até onde conseguia entender, ela não merecia a companhia dele. O pior pecado era ela ser casada e, na busca desse relacionamento, estava forçando Harry a comprometer sua moral cristã. Ela o estava condenando ao inferno junto consigo mesma.

Mas as razões pelas quais ela não o merecia não paravam por aí. Sophia não chegava a ser a garota mais bonita do vilarejo; pelas minhas contas, havia pelo menos umas vinte garotas, comparáveis em idade, que eram mais bonitas do que ela, mesmo me excluindo deste grupo por questão de modéstia.

Além disso, ela não tinha nem a posição social nem a riqueza que a tornaria adequada para a companhia de um homem com o status de Harry. Faltavam-lhe dotes domésticos: sua costura era passável e as tortas que trazia às festas da igreja eram massudas e assadas de maneira desigual. Sophia era inteligente, sem dúvida, mas se alguém fosse obrigado a escolher uma garota inteligente na cidade, o nome dela não estaria entre aquelas que vêm primeiro à mente. Assim, qual era exatamente a base de seu relacionamento com Harry, que deveria ter só o melhor?

Enrolei o linho do final do verão, refletindo sobre esse estranho relacionamento, amaldiçoando-o por ser inconstante.

Afinal, aquele dia, no campo dos McDougal, ele tinha dito que ficaria com ciúme se eu me atraísse por outro menino no vilarejo; e agora aqui estava ele, cortejando Sophia Jacobs.

Uma jovem de coração mais fraco poderia ter tirado conclusões sobre seu comportamento, mas eu não faria isso, preferia acreditar que Harry me escolheria se soubesse de meus sentimentos. Eu caminhava de um lado para o outro após os cultos da igreja aos domingos, jogando olhares não correspondidos na direção de Harry, querendo dizer o quanto o queria. Percorri os trilhos que levavam até a casa dos Styles e fiquei imaginando o que Harry estaria fazendo naquele momento; sonhando acordada, tentei imaginar como seria sentir as mãos de Harry em meu corpo, como seria ser pressionada embaixo dele, tomada por seus beijos. Fico vermelha ao pensar no quanto minha visão do amor era inocente naquela época! Tinha uma concepção de amor de uma virgem, tão casto quanto nobre.

Sem Harry, eu estava sozinha. Essa era uma prévia do que seria minha vida quando Harry estivesse casado e assumisse os negócios da família, e eu estivesse casada com outro. Seríamos cada vez mais levados às nossas próprias órbitas, caminhos destinados a nunca se cruzarem. Mas esse dia ainda não havia chegado e Sophia Jacobs não era a legítima esposa de Harry. Ela era uma intrusa que queria roubar seu coração.

Um dia, logo após a primeira geada, Harry veio me ver. Ele estava tão diferente, parecia que havia envelhecido anos. Ou talvez fosse só aquela alegria em seu rosto que tivesse ido embora; ele parecia sério e bem adulto. Ele me encontrou no campo de feno, com minhas irmãs, colhendo o que ainda restava do feno para secar ao sol de verão e colocando no celeiro.

— Deixe-me ajudar você — ele disse, apeando do cavalo.

Minhas irmãs, vestidas como eu, com roupas velhas e lenços amarrados na cabeça para manter o cabelo afastado, olharam desconfiadas para ele e deram gargalhadas.

— Não seja ridículo! — exclamei, olhando para seu elegante casaco de lã e calças de pele. Recolher o feno era uma tarefa horrível e cansativa. De qualquer forma, eu ainda estava ressentida por seu abandono e disse a mim mesma que não queria nada dele. — Só me diga o que o traz aqui — falei.

— Creio que minhas palavras sejam só para seus ouvidos.

Podemos pelo menos caminhar um pouco sozinhos? — perguntou, cumprimentando minhas irmãs com a cabeça para mostrar que não queria ser desrespeitoso. Joguei meu forcado no chão, tirei as luvas e comecei a caminhar em direção à floresta.

Ele seguiu a pé a meu lado, trazendo seu cavalo com a rédea frouxa.

— Bem, não nos vemos faz tempo, não é? — ele começou a falar de um modo não muito convincente.

— Não tenho tempo para delicadezas — respondi a ele. — Tenho trabalho a fazer.

Ele desistiu das desculpas de uma vez por todas.

— Ah, Lanny! Nunca consegui enganar você. Senti sua falta, mas não é por isso que vim até aqui hoje. Preciso de seu conselho. Não sou muito bom em julgar meus próprios problemas e você sempre vê as coisas com clareza, independentemente de qual seja o problema.

— Pode parar de me elogiar — eu disse, passando a testa na manga suja da camisa. — Há muitas outras pessoas mais inteligentes nesta cidade a quem você pode recorrer, então, o fato de ter vindo até mim significa que está metido em algum tipo de problema que não ousa dividir com mais ninguém. Vamos lá, desembucha: o que você fez?

— Tem razão. Não há ninguém em quem eu possa confiar, exceto em você. — Harry virou seu rosto lindo, constrangido.

— É Sophia, acho que você já adivinhou essa parte, tenho certeza, e acho que o nome dela é o último que queria ouvir...

— Você não faz ideia — sussurrei, enfiando uma dobra da saia na cintura para levantar a barra do chão.

— Tem sido uma união suficientemente feliz entre nós,

Lanny. Nunca imaginaria. Somos tão diferentes, mas, ainda assim, gostava muito da companhia dela. Ela tem uma mente independente e não tem medo de dizer o que pensa — ele falava sem perceber que eu estava petrificada, parada no meio do caminho, boquiaberta. Eu já não tinha falado a ele o que penso? Bem, talvez não tivesse dito claramente, mas não tínhamos conversado como iguais, amigos? Era enlouquecedor que ele achasse o humor de Sophia tão singular e admirável! — É ainda mais extraordinário, considerando sua família. Ela conta histórias sobre o pai, que ele é um bêbado e um jogador, e que bate na esposa e nas filhas.

— Tobey Ostergaard — eu disse. Surpreendia-me que Harry não conhecesse a má reputação de Tobey, mas isso só servia para demonstrar o quanto era isolado do restante do vilarejo. Os problemas de Ostergaard eram bem conhecidos; ninguém o tinha em alta estima como pai ou provedor. Fazendeiro pobre, Tobey cavava covas nos fins de semana para ganhar dinheiro extra, que quase sempre era desperdiçado em bebida. — O irmão dela fugiu no ano passado

— contei a Harry. — Ele brigou com o pai e Tobey o acertou no rosto com a pá de coveiro.

Harry parecia realmente aterrorizado.

— Esta criação difícil endureceu Sophia, mas, mesmo assim, ela não ficou insensível ou amarga, nem mesmo depois de seu casamento doloroso. Ela se arrepende muito de ter concordado com a proposta, especialmente agora que... —

Ele foi saindo de mansinho.

— Agora que o quê? — incitei, o medo subindo por minha

garganta. — Ela diz que está grávida — Harry desabafou, virando as costas para mim. — Ela jura que o bebê é meu. Não sei o que fazer.


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Immortalized | H.S Onde histórias criam vida. Descubra agora