Ainda não tinha amanhecido quando saí da cama. Fiquei horas no escritório de pijama lendo registros antigos e por acaso encontrei um envelope contendo diversas fotos em preto e branco e até algumas coloridas. Meu avô não era dado a tecnologias. Em várias das fotos, estava meu avô, um homem mais ou menos da idade dele na época, dois meninos de uns cinco anos e eu com dois ou três. Eram imagens alegres, todos estavam felizes. Chamei Etore.
-Quem é o outro homem na foto?
-Accioli de Nava. – Etore estava um pouco pálido.
-Nava? Da família Nava? Da mesma família que é a nossa maior inimiga?
-Exatamente.
-E os dois garotos?
- Tancredo e Anatole de Nava.
-Como essas fotos foram tiradas? Parecemos todos felizes, eu não entendo.
-Pode perguntar melhor ao próprio Acciole. Ele acaba de mandar um cartão, dizendo que soube hoje quando chegou de viagem da morte de seu avô, e com sua permissão ele pretende vir até aqui.
-Tudo bem. Mande avisar que espero Acciole as oito para o jantar.
-Não é um pouco arriscado minha querida? Os Nava são inimigos e você quer por um inimigo dentro da Casa?
-Mande o cartão, Etore. – mandei
-Como quiser.
Fiquei ansiosa esperando à hora do jantar. Deixei todas as fotos separadas e fui resolver problemas com Bosco. Por pura incompetência de um dos soldados, o carregamento iria atrasar alguns dias. Eram tempos tranqüilos, não havia muito que fazer.
Pontualmente às oito horas, um empregado foi ao escritório avisar que Acciole havia chegado. Assim que desci as escadas, me deparei com um homem que poderia me matar se quisesse, mas ao invés disso, me olhou se sorriu. Atrás dele estavam dois homens jovens, de quase trinta anos mais ou menos.
-Olá Miranda. – sorriu novamente beijando minha mão. – Está encantadora.
-Obrigada.
-Estes são meus filhos, Tancredo e Anatole.
-É um prazer. – um de cada vez, ambos fizeram o mesmo gesto de Acciole. Tancredo, tinha algumas linhas de expressão na testa, olhos incrivelmente azuis e cabelos negros e rebeldes. Anatole era um pouco parecido, mas com cabelos mais claros e uma cara de marrento que quase me fez rir. Incrivelmente gentis, lindos e perigosos na mesma medida.
-Confesso que fiquei curioso quanto o motivo de você pedir que eu trouxesse meus filhos. – Acciole declarou quando já estávamos à mesa.
-Estive lendo alguns papéis, abrindo pastas e cadernos, quando encontrei um envelope com algumas fotos de meu avô, do senhor, minhas e de seus filhos brincando. Então chamei Etore e ele me disse que o homem da foto que eu não reconheci era Acciole de Nava, o maior inimigo da Cosa.
-Ficaria surpresa com a quantia de fotos que tenho em que cenas parecidas se repetem.
-E por quê? Por que diabos você e meu avô não estavam brigando, ou sei lá.
-Por que seu avô e eu crescemos juntos, assim como você passou muito tempo até os seus sete anos com os meus filhos.
-Continue.
-Nem sempre nossas famílias foram inimigas. Muito antes das máfias, a Cosa e os Nava viviam em paz, uma vez que desde muito tempo as famílias eram amigas.
-E por que essa amizade acabou?
-Creio que não seja uma conversa para se ter a mesa. – e olhou para Etore e Bosco. – Eu soube de seu avô assim que cheguei da Alemanha, eu sinto muito. Cesare foi um grande amigo.