POR QUE TEMOS NOITE E DIA, INVERNO E VERÃO?

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NOSSA VIDA é regida por dois ritmos fundamentais, um muito mais lento que o outro. O

mais rápido é a alternância entre escuridão e claridade, que se repete a cada 24 horas, e o

mais lento é a alternância entre inverno e verão, que se repete em períodos de pouco mais de

365 dias. Não é de surpreender que esses ritmos tenham inspirado mitos. O ciclo noite-dia é

especialmente rico em histórias, dado o efeito dramático que o Sol produz quando parece se

mover de leste para oeste. Vários povos viam o astro como uma carruagem dourada conduzida

por um deus pelo firmamento.

Os povos aborígines da Austrália, que viveram isolados nessa ilha continental por no

mínimo 40 mil anos, têm alguns dos mitos mais antigos do mundo. A maioria se passa em uma

época chamada de Tempo do Sonho, quando o mundo começava e era povoado por bichos e

por uma raça de ancestrais gigantes. As diversas tribos aborígines possuem mitos diversos

sobre esse tempo. O que contarei primeiro é de um povo que vive nas montanhas Flinders, no

sul do país.

No Tempo do Sonho, havia dois lagartos amigos: um goanna (nome australiano do grande

lagarto-monitor) e um gecko (uma simpática lagartixa com ventosas nas patas, capaz de subir

em superfícies verticais). Os dois descobriram que alguns de seus amigos haviam sido

massacrados pela mulher-sol e sua matilha de dingos (cachorros-do-mato) amarelos. Furioso

com a mulher-sol, o grandalhão goanna derrubou-a do céu com seu bumerangue. O Sol

desapareceu no horizonte a oeste, e o mundo mergulhou na escuridão. Apavorados, os dois

lagartos tentaram desesperadamente devolver o Sol ao céu para restaurar a luz. O goanna

pegou outro bumerangue e o lançou a oeste, na direção de onde o Sol havia sumido. Como

você talvez saiba, o bumerangue é um objeto admirável que volta às mãos de quem o lançou.

Assim, os lagartos esperavam que ele pescasse o Sol de volta para o céu. Não deu certo.

Então eles tentaram lançar bumerangues em todas as direções, na vaga esperança de reaver o

astro. Por fim, restou apenas um bumerangue para o goanna; sem alternativa, o animal lançou-o

a leste, na direção contrária àquela por onde o Sol desaparecera. Desta vez o bumerangue

retornou trazendo o astro de volta. E a partir daí o Sol manteve o hábito de sumir a oeste e

reaparecer a leste.

Muitos mitos e lendas das várias partes do mundo possuem uma estranha característica

em comum: determinado incidente acontece uma vez e a partir de então, por razões nunca

explicadas, repete-se para sempre.

Vejamos outro mito aborígine, desta vez do sudeste da Austrália. Alguém jogou para o

céu um ovo de casuar (uma ave pernalta da Austrália). O Sol nasceu dele e incendiou uma

pilha de lenha que estava lá nas alturas (sabe-se lá por quê). O deus do céu notou que a luz era

útil para os homens, e ordenou que a partir de então seus criados pusessem lenha o suficiente

A Magia da RealidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora