A Cápsula Semeadora

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Este é o ultimo registro de Alex Madson, único remanescente da tripulação. Aqui resisto doente nesta condenada nave sem freios, ainda trancada e pressurizada. Navego em um curso determinado pelo comandante já morto. Eu não sei o que mostra o computador de bordo, pois tenho medo de sair do meu abrigo e ser surpreendido pela morte eminente. Então apenas aguardo pacientemente meu fim, tentado viver o tempo que me for determinado. Os outros três astronautas: capitão Marcos George, a doutora Anna Sarah e o engenheiro Thomaz não resistiram às consequências de suas psicoses.

- Quem decidiu o nosso destino? A Mãe Natureza ou Deus?

Nesta vastidão dá para ter uma nítida noção de que o Divino não habita um espaço vazio, lugar escuro, abastecido de nada, apenas um vácuo gélido e destruidor. É certo que Deus também buscou refugio na Terra, deve ser por isto que ele interfere tanto em nossas vidas. Mas e aqui, será que ele olha por mim? Não... Aqui só chegam ordens e comandos enviados da NASA; os semideuses de Houston! Nós desobedecemos às determinações do Centro de Controle de Missões e agora o inferno dos demônios terrestres definiram o extermínio da tripulação.

Dói muito na minha consciência o fato de saber que a cada minuto que decorre são várias milhas que a espaçonave percorre; percebo que fico mais longe da minha casa. A embarcação já tem uma rota traçada. Não dá para reverte-la; eu não sei como fazer isto. Agora reflito melhor e juro que me arrependo de ter tirado a vida do navegador, o comandante desta nave repleta de vidas assassinas. Tudo isto não passa de uma bolha de ferro e circuitos flutuando na orbita do sistema solar, estamos nos afastando da força gravitacional do Sol, a nave utiliza esta corrente de energia para poupar combustível. A missão afasta-se de forma circular da Terra e nos aproximamos do planeta Marte em forma temporal retardada.

Lembro-me agora que eu aceitei a missão com uma enorme euforia; ser escolhido entre os melhores Biogeneticistas do mundo me fez cegar para a estruturação harmoniosa e gradativa da evolução natural das coisas. Eu jamais deveria ter interferido na variação genética das espécies para que resistissem à atmosfera de Marte. Dentro desta espaçonave há várias arcas contendo colônias de Fungos mutantes. Os alienígenas somos nós!

A saudade da natureza me faz refletir melhor e imaginar minha vivencia no Planeta Mãe... Tamanha é a vastidão do pensamento humano que leva a viajar por regiões paradisíacas. Conquistamos territórios deslumbrantes, repletos de espécies exóticas; os espécimes vegetais talvez possam nos trazer uma nova descoberta farmacológica além da quantidade ainda não catalogada de vida. Toda parte daquele ambiente terrestre é espantoso! Lembro de quando era criança; eu corria para a margem do rio que fluía a uns cem passos de minha casa, cavava a beirada de sua borda para retirar uma lama negra e viçosa; era como uma argila enegrecida que eu utilizava para moldar meus brinquedos. Com minhas mãos imundas do barro escuro eu fabriquei muitos espécimes orgânicos até então desconhecidos, fazia alguma dezenas de seres do meu mundo imaginário de fantasia. Monstros gosmentos e sórdidos que reinavam no rio onde a garça pescava; a ave sim era a vilã que roubava seu alimento e deixava a nação de anomalia barrenta com fome. A guerra então estava declarada contra os bípedes alados. Máquinas bélicas eram construídas para cruzar o rio e expulsar as garças. Os bichos de barro mais valente, aqueles que o sol já endurecia, eu colocava no meu estilingue e lançava contras os pássaros que fugiam em revoada para além do meu alcance. Enfim, a conquista dos monstros de barro preto do rio das garças estava concluída. De um lado foi engajado, para sacrifício da soberania do território, as estatuas de monstros mais rígidas. Já na outra parte do rio estava estirado o corpo de uma garça, a carcaça branca e plumada, com seu bicho assemelhava-se a um avião abatido por uma artilharia antiaérea. Era o exército negro que tinha a posse temporária dos peixes.

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