Capítulo 1

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—Eai Emily -digo ao entrar na sala.

—Já chegou da escola Liza? -diz minha irmã e então ela bota um biscoito na boca.

—Sim, a aula acabou mais cedo... -falo me sentando do lado dela e boto um biscoito na boca.

—Ei! -ela grita imediatamente —Vou falar pra mamãe que você tá matando aula!

—E eu que foi você que estragou as maquiagens dela -digo a encarando e ela arregala os olhos.

—Como você sabe que fui eu?

—Ué, só tem 3 pessoas nessa casa, eu, você e Mary, eu sei que não fui eu e também que ela não estragaria as maquia...

—Não chame nossa mãe de Mary! -Emily me interrompe. -Qual o seu problema com "mãe" ou "mamãe"?

—Ela nunca chegou a ser minha mamãe, e parou de ser mãe quando traiu meu pai -falo e ela se cala.

Quando eu tinha 4 anos descobri que Mary tinha traído meu pai, depois disso eu fui morar com meu pai, mas quando eu completei 12 anos ele teve um acidente de carro, então fui obrigada a ficar aqui na casa dela. Já se passaram 5 anos e eu ainda não tinha uma relação boa com ela.

Já a Emily veio do namorado de Mary, Lucca, acabou que no final eles terminaram porquê ele foi pego com 2 garotas no quarto da minha irmã, não tinha lugar melhor não?

Me levanto e vou até meu quarto, ele é bem simples na verdade, só uma cama, uma escrivaninha, meu armário e uns pôsteres de umas bandas que eu gostava antigamente, me deito e penso em tudo que aconteceu nesses 13 anos e então acabo adormecendo.

***

Eu estou no meu antigo quarto, o de quando eu tinha 4 anos. Já era de noite, estava chovendo, olho pra minha antiga cama e vejo um volume nela, tinha alguém lá com a coberta até a cabeça, provavelmente com medo dos trovões.

Vejo uma fresta de luz e então um rangido, a porta estava se abrindo. Ouço um gritinho de dentro da coberta e então a criança se mexe, provavelmente assustada com a porta.

Me viro pra ela e então vejo minha mãe entrar, ela estava bem mais jovem, parecia não ter problemas com bebida nem fumar... Parecia simplesmente bem.

—Oi querida, tá com medo? -ela diz ao se ajoelhar ao lado da minha cama e puxar a coberta para baixo, então percebo que quem estava ali não era eu, era minha irmã, Emily.

—To com medo de ser que nem ela quando crescer mamãe -ela diz e então me encara, fico confusa mas concluo que deve ser apenas coincidência, mas então Mary se vira pra mim. Ok, definitivamente não é coincidência.

—Eu também teria amor, eu também teria... -ela disse com rancor em seus olhos e ódio em suas palavras. —Ela estragou nossas vidas, tirou tua infância, tirou meu amor.

—Amor? Como você considera isso amor? -respondo com raiva e então começo a gritar. —Você traiu meu pai, a mim e a si mesma ao fazer isso!

—Ora, ora, então o carneirinho sabe falar? Que fofinha! Quer um biscoitinho com leites? Ah, é mesmo, não dá, você queimou a dispensa! -ela fala com raiva e começo a me lembrar do episódio.

Eu tinha 3 anos, estava tentando pegar um dos biscoitos no pote mas não consegui alcançar, até que dei um pulo e derrubei o pote e ele se quebrou. Começo a procurar desesperadamente por qualquer coisa que pudesse reverter isso antes dos meus pais verem. Até que acho uma "caixinha" metálica decido testar e a abro, acontece que aquilo não era uma caixinha e que as prateleiras era, de madeira, resumindo, por não saber o que era um isqueiro quase boto fogo na casa. Graças a Deus meu pai chegou a tempo e apagou o fogo com a mangueira.

—Pelo menos eu não trai ninguém! -grito com raiva.

—Ah, pequena e doce Liza... -ela diz com uma voz doce enquanto se levanta e caminha até mim, então ela começa a fazer carinho na minha bochecha e tento me mexer pra tirar sua mão de mim mas não consigo, é como se eu estivesse congelada. -Você não percebe? Esse é seu único argumento, e se não fosse por você... Ah, se não fosse por você... -ela leva um dedo até meu queixo e então o levanta, começa a me encarar com aqueles malditos olhos verdes iguais aos meus. -Se não fosse por você, seríamos todos felizes -ela cospe e então me dá um tapa.

Quando eu começo a pensar em uma resposta eu vejo o quarto ficar vermelho e então se incendiar, tudo vai sumindo pelos cantos como se fosse uma foto. No final vejo os olhos de Emily ficarem negros e ela falar:

—Você estragou a nossa vida.

***

Acordo com um pulo e então tiro a coberta de mim, estava suando. Foi apenas um sonho, digo para mim mesma, foi apenas um sonho. Me sento na beirada da cama e fico encarando a parede por meio minuto enquanto penso no sonho.

Será que eu havia mesmo estragado a minha infância e a da minha irmã? Não, não fui eu... Ou fui? Se eu não. tivesse pegado o celular da minha mãe nós ainda estaríamos na nossa antiga casa em Malibu, agora estamos aqui, na parte mais pobre de Oakland com uma casa que está caindo aos pedaços. Se não fosse por mim estaríamos todos bem, estaríamos... Felizes.

Me levanto e vou até o banheiro, abro a torneira perdida nos meus pensamentos. Lavo meu rosto e me olho no espelho, contenho um grito, o que houve com o meu olho? Ele está vermelho! É como se todo o verde tivesse se esvaído dando lugar ao sangue em meus olhos. De repente sinto um cheiro de fumaça e ouço um grito, Emily.

Vou correndo até a sala, tropeçando no meu pé algumas vezes. Ao chegar lá, não vejo nada, então me viro pro lado da cozinha e vejo minha irmã desmaiada no chão da cozinha.

Corro até ela e me ajoelho ao seu lado, pego seus ombros e os balanço.

—Emily -digo quando meus olhos começam a lacrimejar. —Não  Emily, não, você não pode fazer isso comigo -digo sendo interrompida pelos meus soluços, eu não choro tanto desde que meu pai morreu.

Começo a observá-la e vejo uma queimadura no formato de uma lua no seu pulso e em sua nuca uma pequena mancha de sangue.

Olho em volta pra ver de onde vinha o fogo mas não vejo nada então corro pro telefone que estava na parede e ligo pra emergência.

Depois de chamar uma ambulância vou até minha irmã e a abraço, sentindo minha lágrimas molharem seu vestido amarelo florido.

De repente ouço um estrondo e abro os olhos antes fechados, olho para os lados assustada e não vejo nada, então sinto uma agulhada no pescoço e sinto uma dor alucinante, tudo fica preto e eu penso na minha vida que foi totalmente desperdiçada.

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