22/02/16
Estava impaciente. Audrey nunca havia se atrasado antes. O silêncio tomava conta da sala. Sabia que para aquilo dar certo, precisava fazer amizade com alguém. Mas quem?
Olhei novamente em minha volta. Por um estante pensei que aquela garota sentada à poucos centímetros de mim seria a pessoa ideal para começar uma conversa. Me aproximei mais. Com um tom baixo, porém rápido. Disse "Oi". Ela não respondeu, continuou com a cabeça abaixada, dava para perceber a timidez dela. Não sabia mais o que falar. Engoli a saliva num gole só. Continuei. "Meu nome é Allan!". Ela levantou a cabeça, ao olhar para mim com um pequeno sorriso. Disse: "Sou Violete"
* * *
Me assustei quando a porta foi aberta rapidamente com força. Era a Audrey. Ela estava suspirando, como se tivesse participado de uma maratona naquele mesmo dia.
"Desculpem-me pelo atraso".
Não demorou muito para que ela mandasse nós sentarmos num grande círculo. Continuou. "Bom dia a todos! Eu sei que pode ser estranho para vocês, mas acreditem. Fazerem vocês participarem juntos de uma sessão em grupo será de grande importância!". Não me exaltei em responde-la. Aliás, acho que ninguém sabia ao certo o que falar naquele momento. Tinha-se passado três segundos em completo silêncio na sala, mas parecia cinco minutos.
"Ok... mas afinal, o que viemos fazer aqui?". Um garoto que estava sentado ao meu lado respondeu agressivamente. Ele tinha cabelos ruivos, pele branca e usava um blusão de cor azul marinho. Parecia estar relaxado na cadeira e nem um pouco interessado naquele momento.
"Nicolas...". Estava dizendo a psicóloga quando foi brutalmente interrompida pelo garoto que aparentemente não tinha educação. "Nicolas? Meu nome é Nick!". Disse ele se levantando da cadeira e indo em direção a porta. "Nunca mais me chame assim!". Não demorou para que o barulho da porta se batendo ecoasse pelas paredes da sala. A partir daquele momento, sabia que eu e ele não nos daríamos nem um pouco bem.
* * *
Nunca fui de acreditar em superstições. Mas estava claro que a Lei de Murphy tivera acabado de atacar. Logo no primeiro dia da sessão em grupo, apenas para me deixar mais nervoso. A sala poderia ter uma pessoa a menos, mas isso não impediu que a sessão continuasse. Me apresentei aos outros jovens ali presentes. Falei meu nome, minha idade e um pouco dos meus passatempos. Não me senti a vontade de falar sobre a dislexia que me perseguia. Mas não fez tanta diferença, nenhum deles citou algo sequer sobre os seus problemas.
* * *
23/02/16
"Priiiiiiii". Eram sete da manhã quando fui acordado pelo despertador. Desci as escadas e tomei o café. Era mais um dia comum, como qualquer outro. Fui à escola. Como sempre, aulas chatas e tediosas. Fiquei sozinho durante o recreio. Estava comendo um lanche de queijo e presunto, que por sinal estava muito bom. Quando eu achava que as piadinhas sem graça sobre mim não podiam piorar. Começaram a me chamar de pobre, apenas por que eu estava comendo um lanche trazido de casa do que coxinhas e outros comprados na cantina. Além de ser o burro da sala, agora sou conhecido como o pobre também. Não que haja problemas em tiver uma renda baixa, mas ser chamado de algo que não é... irrita qualquer um.
Estava indo para casa. Naquele dia pensei em cortar caminho por uma praça. Lembro como se fosse hoje, havia um grande lago com diversos tipos de patos e marrecos. Resolvi sentar num banco em frente a esse lago. Gostava de ficar lá para relaxar, para colocar as idéias em dia. Fiquei durante minutos lá, apenas olhando o céu. Sentindo a brisa bater em meu rosto. Estava tão calma e tranquilo que me desliguei completamente da vida...
"É tão bom ficar aqui, né? Esquecer um pouco dos problemas". Abri os olhos assustado. Era Violete falando enquanto se aproximava do banco em que estava. "Posso me sentar?". Completou ela. Não disse nada, somente acenei com a cabeça para que ela sentasse. Ficamos em silêncio durante longos minutos.
"Como conheceu a Audrey?". Disse ela. Dava para perceber que estava tentando se aproximar de mim. Demorei para responder, não sabia se estava disposto a me abrir a ela, mas não podia deixa-la no vácuo. Porém, antes que eu pudesse abrir a minha boca, ela continuou.
"Engraçado como o mundo funciona, né? Sempre temos que correr atrás das coisas, nos superarmos cada vez mais. Se não a vida vem e nos derruba. Somos esquecidos no meio de tanta gente". Disse ela desviando o olhar. "Temos a mania de tentar sobreviver, mas esquecemos do mais importante. Esquecemos de viver...".
Interrompi perguntando-lhe "E você?". Violete olhou para mim, abrindo um pequeno sorriso. Ela não tivera entendido a pergunta. "O que tem eu?".
"Você vive?". Sabia que aquela pergunta teria a pego de jeito. Respirou profundamente. Completou. "Eu estava com problemas. Quase desisti de tudo. Audrey foi minha balaústre. Ela não me deixou cair. A partir daí, aprendi a viver".
"Acho que eu preciso aprender..." Completei.
* * *
Passamos a tarde inteira conversando. A hora passava imperceptível até que escuridão da noite tomou conta da cidade. Deitamos na grama e começamos a ver as estrelas. Ela amava o brilho das estrelas, me ensinou sobre os astros e constelações. Queria que aquele momento durasse para sempre. Mas tudo que é bom acaba uma hora. Já estava tarde, me ofereci para leva-la para casa.
Me perdi quando voltava para casa após levar Violete à sua residência. Não conhecia nada daquele lado da cidade. Fui passando pelas ruas com a esperança de achar algum ponto de ônibus. Fui caminhando até que ouvi uma sirene de viatura que a cada passo que dava, ficava mais alta. Quando virei a esquina, esbarrei num cara que aparentava estar correndo. Não consegui ver seu rosto já que a touca a tampava. Tentei o ajudar a se levantar. Foi quando vi o seu rosto. Não poderia imaginar, lá estava ele na minha frente. Nicolas.
"Você?". Disse ele sussurrando para si próprio e com a face assustada, como se não tivesse acreditado que eu estaria lá, pelo menos naquele momento. Ele pegou uma mochila que tinha deixado cair e logo após saio correndo sem dizer mais nada. Fiquei me perguntando. O que ele estaria fazendo na rua até tarde?
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One Reason to Dream
Teen FictionOne Reason to Dream conta a história de cinco adolescentes que ambos tem algo em comum, todos procuram um motivo para continuar vivendo. A série gira em torno de Allan que descobre um mundo de medo e tristeza. Onde as pessoas se preocupam no que os...