Em pele de cordeiro

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"Não, por favor. NÃO." O grito era estridente pelo local enquanto ela se remexia na cama sem parar, suada, nervosa quem a olhava achava que estava tendo uma vertigem. As reações corporais eram inacreditáveis, veias sobressaltadas, suor frio, corpo quente e o modo como se contorcia faria o qualquer um pensar que estava sendo possuída por um demônio menos ele.

Sentado em uma cadeira aos pés da cama ele a observava de longe calmamente como se nada acontecesse, e não acontecia já que lhe parecia tão normal quanto se visse o nascer do sol do alto de qualquer lugar. Mas não era e jamais seria, nem o próprio Deus poderia condenar alguém ao Inferno em vida, era insano, perigoso e com um requinte de crueldade sem tamanho, mas ele não parecia sem penalizar ou ao menos expressar qualquer sentimento de compaixão diante do sofrimento do que seria dada como sua irmã perante as leis divinas. Nada.

Nada além do bem expressado tédio descrito na face fria dele. Tão tedioso que cansou-se de vê-la torturada e tocou-lhe os pés fazendo-a parar na cama, deitada, reta, com a respiração descompassada, o suor escorrendo lhe pela pele, as veias antes saltadas recuperando-se e voltando ao estágio normal, a pele escamada voltando a maciez natural e as pesadas pálpebras que pareciam escuras clareando-se pelo tom de pele branca maciça que a envolvia.

Mas o sobressalto veio dele ao vê-la abrir os olhos tomados pela escuridão e o riso alto que veio de seus lábios rosados dando-lhe plena certeza de que não era bem quem ele pensava que estava ali.

"Ora, ora, ora se não é o filho rejeitado dos céus?!" O ser sombrio riu com escárnio sem levantar-se da cama ou pelo menos necessitar para saber quem era sentado aos pés da cama. "O que foi?! O papai não deixou você ao parque de diversões e você veio escondido do reizinho de uma grande merda?!"

"Dobre sua língua antes de falar do meu pai criador daquele que o criou seu demônio imundo!" Ele exaltou-se fazendo o outro rir mais um pouco.

"Se veio me caçar só para alimentar o meu ego eu agradeço, mas eu tenho mais o que fazer. Pois então o que realmente quer?!"

"Quero seu auxílio. Uma aliança."

"Aliança? Eu não faço aliança com anjinhos." O demônio revirou parcialmente os olhos impaciente.

"Mais não sou um anjo. Sou um arcanjo. Sou Gabriel." Ele respondeu fazendo a surpresa dos olhos distantes e atentos que observava aquela conversa em silêncio.

[...]

"Uriel, o que estás fazendo?!" O outro disse vendo Uriel olhar diante de um espelho algo que ele não via.

"Caçando Ariel, só caçando."

"Caçando?! O que exatamente?!"

"Respostas."

"Ah claro, por que ainda pergunto?!" Ariel ironizou fazendo Uriel revirar os olhos.

"Porque aparentemente não tens nada melhor pra fazer. Vais caçar algo útil e deixe-me só."

"Está bem, mas realmente não vim aqui para importuná-lo."

"Então?!"

"Para alertá-lo, Miguel o chama e pediu que fosse vê-lo e que não se demore como da última vez."

"E só para completar ele não deu-lhe qualquer prévia para enviar a mim sobre o assunto em questão."

"Não."

"Só pra variar." Uriel suspirou. "Vá e diga que estou a caminho e que não demoro." Ele disse vendo o outro suspirar e sumir como um belo passe de mágica deixando-o sozinho com seus pensamentos e preocupado.

Ele sabia para Miguel chamá-lo com tanta precisão ele sabia de algo e estava investigando, mas aí até vê-lo contar algo sobre o que sabe será mais fácil tirar uma banana nas mãos de um chimpanzé com reumatismo. Mas feliz ou infelizmente essa era a última de suas preocupações e problemas. Havia algo maior acontecendo. Algo que envolvia Gabriel e isso o dava medo.

Gabriel já havia cometido erros uma vez e graças ao perdão da infinita bondade e misericórdia divina ele voltou ao seio da família. Mas ninguém sabia quanto tempo isso duraria, alguns anjos discordaram desse ato concedido a ele pelo próprio Deus. Algo que até Miguel apesar de não dizer nada olhando pela justiça de São Pedro não poderia deixar de concordar que isso não poderia dar muito certo, mas como sempre disse o ditado "Deus sabe o que faz e a gente não sabe o que diz."

Então o que restaria era esperar as próximas notícias e rezaria para que estas fossem boas e que estivesse errado em suas suposições. Mas até lá falaria com o Mestre e pediria sabedoria, juízo, paz, paciência e compaixão aquela que não teve antes. Ele ainda vivia as marcas daquela encarnação errônea que viveu.

FLASH BACK IN

"Piedade em nome de Deus!" O homem clamou sentindo as dores da tortura e o sangue quente escorrendo de seu corpo fazendo faltarem forças para sair dali.

"Deus? Ele não liga pra você e não irá salvá-lo de seu destino, no caso eu." Ele riu.

"Por favor, senhor! Eu juro que não fiz nada! Olha se eu ou alguém da minha família fez algum mal ao senhor perdoe-nos! Eu farei o que quiser, mas por favor não me mate. Eu tenho esposa e filhos."

"Ah sim, sua esposa. Uma bela mulher não acha?! Bela, feroz e apetitosa. Sem dúvida nos divertiríamos muito juntos. Hummm." Ele riu fazendo o outro tremer de ódio e medo. "Mas agora chega de lorotas. Vai me contar ou prefere que a sua esposinha linda me diga?!" O homem desesperou-se ao vê-lo ir atrás de sua esposa e rasga-lhe o vestido tocando-a contra sua vontade que tentava mesmo amarrada se desvencilhar dele sem sucesso.

"NÃO. Eu conto o que o senhor quiser mais não a machuque. Por favor! Está no calabouço, está tudo no calabouço."

"Qual deles?!" Ele largou-a e foi de encontro ao homem ajoelhado.

"O do Rei, tem uma passagem secreta para lá que só o Rei e o bispo sabem. É só o que sei!"

"Tem certeza?!"

"Sim senhor."

"Ótimo." Ele atravessou uma adaga no peito do homem que sentiu sua respiração falhar e a última coisa que ouviu foi grito estridentemente alto de sua mulher e desfaleceu.

Ele riu e encarou o ser não visível mais semelhante ao uma sombra escura que trazia medo a qualquer um que visse. O ser encapuzado demonstrou um sorriso de satisfação maldoso tão grande que seria capaz de trazer arrepios até aos anjos. Menos ele que ria daquela situação de tragédia.

"Muito bem. Agora vamos à diversão real. Será muito bem recompensado por seus feitos. Por que um pai jamais se esquece de seus filhos."

FLASH BACK OF

O Amuleto de Sangue - Livro 1 Coletânea Van HelsingOnde histórias criam vida. Descubra agora