Seis e Meia

Uma

Essa carta é para você, mas esse texto é sobre mim.

Quando sua primeira chegou essa semana, eu demorei a reagir. Você está desistindo. Do que você está desistindo?

Você sempre falou coisas do gênero, meio fora de contexto, meio quebrando minhas expectativas, mas eu nunca reclamei porque gostava de pensar que te entendia mesmo assim.

Mas, como falei, isso não é sobre você: é sobre mim.

Eu li sua primeira carta. Li, reli, repeti algumas frases em voz alta até que as palavras perdessem o significado e ficassem gravadas na minha mente. Hoje é terça-feira, mas bom dia, segunda-feira. Eu não decorei sua rotina nem a minha, mas lembro de ter gostado dos momentos em que elas se encontravam sem que eu estivesse esperando. Não sei como funcionam suas segundas, terças, quartas, quintas, ou sextas, e você não se dispôs a me contar. Talvez eu não tenha perguntado, mas é que sua vida parece mesmo tão corrida, tão ocupada, tão sem espaço pra mim! Você diz que tem seus momentos desocupados e eu e pergunto o que passa pela sua cabeça nesses momentos. Me pergunto quantos desses você gastou pensando nos sete estágios de sua desistência. Do que você está desistindo? Eu ainda não sei, e isso me deixa apreensiva.

Ultimamente, todos os dias têm sido difíceis de lidar do lado de cá, e eu não tenho esbarrado contigo por aí. Talvez as duas coisas tenham relação, talvez não. Talvez você tenha me feito esquecer momentaneamente das coisas que me preocupam, e você já deveria saber que eu me preocupo muito.

Eu gostaria que você tivesse me colocado em primeiro plano. Minha vida é corrida e eu alego por aí que ando sem tempo, mas a verdade é que eu conseguiria tempo pra você de qualquer lugar se você quisesse. Se fizesse o mesmo por mim. Você esteve sempre tão fechado, é uma incógnita pra mim. Não sei o que suas ações querem dizer ou se elas não querem dizer nada, não sei nem diferenciá-las dos teus pequenos esforços. Não sei o que você chama de esforços.

Sobre você, eu não sei de muita coisa, então vou me ater ao que sei.

Eu sei que gosto dos teus textos. Sei que gosto dessa expressão sonolenta que você sempre tem no rosto. Sei que você cria paranoias e as vezes se deixa levar por elas. Sei que você se preocupa em respeitar meu espaço.

Eu até sei algumas coisas. O que você sabe de mim? Sabe que eu não me importo de te deixar ultrapassar a linha amarela que coloquei na minha vida pra criar limites? Sabe que eu gosto da forma que você me deixa confusa as vezes? Sabe que eu queria que você deixasse eu te entender melhor?

Sabe que eu estou com medo da sua desistência?

Ontem foi o primeiro dia, e eu estou com medo.