Capítulo 2

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Os dias começaram a ter um novo ritmo e um novo sentido em minha vida. Desde o dia em que eu havia sido resgatada pelo Rafael daquela boate eu me sentia livre, porém presa. Dá para entender isso? Ao mesmo tempo que eu estava livre para seguir a minha vida, estava presa em meus medos. Eu oscilava entre a alegria de estar em casa e a tristeza de minha melhor amiga estar desaparecida. Em ser grata por ter um novo futuro e nas tristes lembranças do passado recente.

Passei a frequentar terapia, pois estava dando sinais de síndrome do pânico. Vivia com medo de receber uma notícia ruim, ou até mesmo de as pessoas que nos levaram aparecerem para me matar, como eles sempre prometiam. Alguns sinais bem característicos do ataque de pânico.

Os distúrbios de pânico são considerados transtornos de ansiedade que limitam a pessoa a tomar uma atitude em determinada situação. Para mim, os ataques são inesperados. Vem de repente e me deixam paralisada. Às vezes eu estava fazendo uma atividade simples e subitamente eu começava a sentir um medo crescente que eu não conseguia controlar. O terror tomava conta do meu corpo e o pavor fazia meu coração disparar, me sentia sufocada, tonta, e sem ar. Me vi diversas vezes a ponto de desmaiar. Parecia que tudo era perigoso e que a qualquer hora alguém me atacaria. Minhas pernas falhavam e eu não conseguia me mexer.

Fiquei com medo de ficar louca e perder o controle.

Depois de um mês de tratamento a Dra. Patrícia, minha terapeuta, me incentivou a sair. E era por isso que eu estava aqui na porta da casa do Kleber, um amigo antigo. Minha irmã Carolina e meu cunhado João Lucas estavam comigo para me ajudar em uma eventual crise. A Fernanda até ficou um pouco chateada de não poder me acompanhar, mas ela estava viajando a trabalho, já que eu estava um pouco ausente do escritório.

Meu pai havia conseguido esconder o que aconteceu comigo. Para a sociedade eu estava fazendo um curso no exterior. Ele achou melhor assim. Eu também, pois por diversas vezes eu me pegava imaginado o que as pessoas pensavam. Se alguém me olhava, imediatamente eu achava que estavam me julgando. Ou apontando e dizendo "olha lá, ela dançava em uma boate" ou poderiam até pensar que eu fazia programa. Vadia. Isso sempre apertava o gatilho para que eu começasse uma das crises.

- Bom, como vai ser? – minha irmã me pergunta. – todos irão questionar onde está a Gabriela, o que diremos?

- Que o curso dela não acabou? Ou que ela recebeu uma oportunidade de ouro e não poderia desperdiçar? – João falou. – é melhor assim. Evitar especulações, lembra?

A sala estava cheia de gente. Pensei que encontraria muitas pessoas conhecidas, mas estava enganada em minhas suposições. Isso me afligia. Eu não confiava em ninguém, ainda não. Depois de cumprimentar o Kleber, dono da casa e aniversariante, procurei um canto onde eu pudesse apenas observar sem ser vista. Minha irmã cumprimentava algumas pessoas, enquanto eu atravessei a sala e fui para a passagem do jardim. Uma música tocava e eu passei a mover o corpo no ritmo dela. Estava indo melhor que pensei.

Luzes indiretas haviam sido acesas por trás das plantas em alguns pontos deixando um ambiente mais agradável. Tomei um copo em minha mão, me ocupei em beber o refrigerante.

Meu olhar captou um grupo que conversava do outro lado do jardim, e então eu reconheci o homem de cabelos claros e olhos azuis mais doces que já vi na vida. Nesse instante nossos olhos se cruzaram e ele sorriu para mim. Me senti aliviada quando vi o Rafael vindo em minha direção. Estava vestido de forma casual, com uma calça jeans e blusa de linha grafite que de longe poderia ser confundida com preto. Seu rosto estava bem barbeado dando um aspecto de ser mais jovem do que realmente era. Seus cabelos um pouco cumpridos, caiam alguns fios dourados pela desta.

Minha perdição - degustação.Onde histórias criam vida. Descubra agora