Capítulo 1

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Não podia enganar-se por mais tempo

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Não podia enganar-se por mais tempo. Devagar, com infinito cansaço, deixou de lado o livro. Era uma primeira edição, encadernado em couro. Era seu fim. Não podia suportar mais. Os livros que tanto amava não poderiam afugentar durante mais tempo a infinita solidão de sua existência. O escritório estava repleto de livros, do chão até o teto, ao longo de três das quatro paredes da sala. Havia lido todos e cada um deles ao longo dos séculos. A alguns, conhecia de cor. Mas sua mente não encontrava mais consolo neles. Os livros alimentavam seu intelecto, mas destroçavam seu coração.- O problema não está realmente em estar sozinho, mas em sentir-se sozinho.A gente pode sentir-se só em meio a uma multidão, não é verdade? Mikhail ficou rígido, só seus olhos carentes de alma se moviam com cautela,como os de um perigoso predador farejando o perigo. Inspirou profundamente,fechando sua mente ao momento, enquanto todos seus sentidos se estendiam para localizar o intruso. Estava sozinho. Não podia equivocar-se. Era o mais velho, o mais poderoso, o mais ardiloso. Ninguém penetraria seu feitiço de proteção. Ninguém podia aproximar-se o sem que ele soubesse. Intrigado, repetiu as palavras, escutando sua voz.Mulher, jovem e inteligente. Entreabriu sua mente, procurando os caminhos para ela, procurando seus rastros mentais.- Descobri que é assim - respondeu ele.Deu-se conta que continha o fôlego, que precisava de novo do contato. Uma mulher humana. Quem se interessava por ele? Estava intrigado.- Em certas ocasiões, vou à montanha e fico ali durante dias, semanas, e não me encontro sozinha, mas numa festa, rodeada de centenas de pessoas, me sinto mais só que em qualquer outro lugar.Uma onda de paixão fez que seu corpo se contrair. A voz da mulher enchia sua mente com sua suavidade que era musical e sensual pela inocência que desprendia. Mikhail não experimentava nenhuma emoção fazia séculos. Seu corpo não pedia uma mulher há centenas de anos. Mas agora, ouvindo esta voz, a voz de uma mulher humana, estava perplexo ao sentir o calor que se estendia por suas veias.- Como é que você pode me falar?- Sinto muito se o ofendi - Podia sentir que seu arrependimento era sincero, sentia sua desculpa - Sua dor era tão extrema que não pude ignorar. Pensei que queria conversar. A morte não é a resposta para a infelicidade. Acredito que já sabe.Em qualquer caso não falarei mais se não o desejar.- Não! -Sua resposta foi uma ordem despótica, dada por um ser acostumado a uma obediência total. Mikhail sentiu a risada da mulher antes que o som chegasse a sua mente. Suave,livre, incitante.- Está acostumado a que todos os que lhe rodeiam lhe obedeçam?- É obvio. Mikhail não soube como interpretar a risada dela. Estava intrigado.Sentimentos. Emoções. Amontoavam-se em seu interior até sobressaltá-lo.- É europeu, não? Rico e muito, muito arrogante.Pegou-se sorrindo com as brincadeiras da mulher. Ele nunca sorria. Não o fazia há mais de seiscentos anos.- Acertou em tudo.Achou-se de novo esperando a risada feminina, precisando-a com a sede que um viciado espera a droga. Quando chegou foi um som rouco e alegre. Tão suave como o roçar de dedos sobre sua pele.- Sou americana. Somos como a água e o azeite, não é? Havia-a encontrado e tinha seu rastro. Ela não escaparia.- As mulheres americanas podem ser amestradas, com os métodos adequados-Arrastou as palavras deliberadamente, antecipando sua reação.- É realmente arrogante.Amou o som de seu riso, saboreou-o e o guardou em seu interior. Mikhail percebeu a sonolência da mulher, seu bocejo. Melhor assim. Enviou uma ligeira ordem mental, apenas um empurrãozinho à mente feminina, com delicadeza, insistindo para ela dormir a fim de poder examiná-la.- Deixe disso!A mulher reagiu com uma rápida retirada, doída e suspicaz. Afastou-se comum bloqueio mental tão rápido que o deixou atônito com sua destreza, muita força para alguém tão jovem, muito forte para ser humano. E ela era humana. Estava certo disso.Soube, sem olhar sequer, que tinha exatamente cinco horas até que o sol saísse. Podia suportar o pálido sol do amanhecer e o do entardecer. Comprovou o bloqueio da mulher, com cuidado para não alarmá-la. Seus lábios desenharam um débil sorriso. Ela era forte, mas não o suficiente.O corpo de Mikhail, dotado de fortes músculos e com uma força sobre humana,perdeu consistência e se dissolveu convertendo-se numa ligeira neblina cristalina que deslizou por debaixo da porta, flutuando no ar da noite. As pequenas gotas de água se uniram, conectaram-se entre si para dar forma a um pássaro de grandes asas. Desceu, voou em círculos e atravessou a escuridão da noite em silêncio, formoso e letal. Mikhail se deleitou na poderosa sensação de voar, o vento chocava contra seu corpo, o ar da noite falava, lhe sussurrando segredos, trazendo o aroma da caça, do homem. Seguiu o ligeiro rastro psíquico da mulher sem perdê-lo. Muito singelo. Seu corpo ainda se agitava com a paixão. Uma humana jovem, transbordante de vida e risos,uma humana conectada mentalmente a ele. Uma humana cheia de compaixão, inteligência e força. A morte e a dor poderiam esperar para outro dia, até que sua curiosidade fosse saciada. A pensão era pequena, nos confins do bosque, ao pé da montanha. O interior estava escuro, uma luz suave afastava a penumbra em uma ou duas das salas e possivelmente também o saguão estivesse iluminado enquanto os hospedes descasavam. Pousou-se no balcão do quarto da jovem, no segundo andar e ficou completamente quieto, como se formasse parte da noite. A luz estava acesa, sinal de que agarota não podia dormir. Os olhos de Mikhail, escuros e ardentes, viram-na através do cristal, viram-na e a reclamaram.Era uma mulher de delicada estrutura, com bonitas curvas e pequena cintura, e uma formosa cabeleira escura que deslizava por suas costas, desviando a atenção até seu arredondado traseiro. Mikhail ficou sem fôlego. A jovem era deliciosa. Bonita, de pele sedosa, com imensos olhos de um azul escuro, rodeados de largos e espessos cílios. Não lhe escapou um só detalhe. Uma camisola comprida aderia-se à sua pele acariciando seus seios, deixando nua sua garganta e seus pálidos ombros. Seus pés eram pequenos, como suas mãos. Muita coisa para uma embalagem tão pequena.Estava escovando o cabelo, em pé junto à janela, contemplando a noite sem vernada. Seu rosto tinha uma expressão ausente. A tensão podia ser percebida em seus lábios, plenos e sensuais. Mikhail podia sentir sua angústia, a impossibilidade de conciliar o sono que tanto precisava. Encontrou-se seguindo com o olhar, cada movimento da escova ao longo de sua cabeleira. Ela se movia de forma inocente e erótica. Mikhail tremeu, preso no corpo da ave. Levantou o rosto para o céu, em agradecimento. Depois de séculos sem sentir nenhuma emoção, a sensação de felicidade que atravessava seu corpo era incrível.Os seios dela se elevavam, apetitosamente, com cada passada da escova,marcando seu delicado talhe e sua pequena cintura. O tecido aderia a seu corpo,deixando entrever o triângulo escuro entre suas pernas. Mikhail cravou as garras no corrimão de madeira, deixando suas marcas. Continuou contemplando-a. Era elegante e sedutora. Fixou seu ardente olhar em sua delicada garganta, onde o sangue pulsava deforma agitada. Dela. Afastou bruscamente o pensamento, agitando a cabeça.Olhos azuis. Azuis. Ela tinha os olhos azuis. Foi então que se deu conta que podia ver as cores. Brilhantes e intensas. Ficou totalmente paralisado. Não podia ser.Os homens de sua espécie perdiam, junto com suas emoções, a capacidade de ver qualquer outra cor que não fosse o cinza. Era impossível. Só a mulher que compartilharia sua vida, sua companheira, devolveria ao homem as emoções junto comas cores. As mulheres da raça dos Cárpatos eram a luz para a escuridão do homem. Não existiam mulheres de sua raça que dessem à luz a possíveis companheiras para os homens que se encontravam sozinhos. As poucas que ainda restavam pareciam incapazes de conceber meninas, só nasciam meninos. Achavam-se em uma situação desesperadora.As mulheres humanas não podiam ser transformadas sem as danificar. Já haviam tentado. Era totalmente impossível que esta humana fosse sua companheira. Mikhail continuou observando-a enquanto ela apagava a luz e se deitava na cama. Percebeu a pequena agitação em sua mente, a busca.- Está acordado? - Ela estava desafiando-o.Negou-se a responder a princípio. Não gostava da sensação de necessidade que parecia crescer em seu interior. Não poderia suportar sua falta de controle, não consentiria. Ninguém possuía poder sobre ele e certamente não iria permitir a uma jovenzinha americana com mais força do que o normal..- Sei que pode me ouvir. Sinto muito se sou uma intrometida. Fiz isso sem pensar. Não voltará a acontecer. Mas para que tome nota, não volte a tentar me dobrar com seus músculos.Alegrou-lhe estar sob a forma de um animal, assim não podia sorrir. Ela nem sequer imaginava com que músculo gostaria de dobrá-la.- Não me senti ofendido -Respondeu-lhe com suavidade. Viu-se obrigado a responder, foi um ato compulsivo. Precisava ouvir sua voz, o suave sussurro deslizando por sua mente como se fossem carícias sobre sua pele.A garota deu a volta, arrumou o travesseiro, esfregou as têmporas como se lhe doesse a cabeça. Sua outra mão jazia sobre o lençol. Mikhail queria tocar essa mão e sentir a pele cálida e sedosa sob a sua.- Por que tentou me controlar? -Não era só uma pergunta meramente intelectual, como ela pretendia. Pôde perceber que de alguma forma, ela se sentia ferida,desiludida. Movia-se inquieta, como se estivesse esperando a seu amante.A imagem dela com outro homem, o enfureceu. Sentimentos depois de tantos anos. Claros, afiados, dirigidos a ela. Sentimentos reais.- Está em minha natureza tentar controlar. Estava exultante de felicidade e ao mesmo tempo se dava conta de que era mais perigoso que nunca. - Sempre terei que controlar ferreamente a sensação de poder. - A menor emoção, mais fácil.- Não tente me controlar.Havia algo em sua voz, não podia lhe dar um nome, mas era uma espécie de ameaça. Mikhail era uma ameaça real para ela.- Como pode alguém controlar sua própria forma de ser, pequena?Viu como o sorriso da jovem enchia sua solidão, como se ficasse gravada em seu coração, fazendo com que seu sangue circulasse vertiginosamente.- Por que você pensa que sou pequena? Sou tão grande como uma casa.- Supõe-se que devo acreditar nisso.A risada se desvaneceu pouco a pouco da voz e da mente da jovem, mas permaneceu no sangue de Mikhail.- Estou cansada, de novo lhe peço perdão. Diverti-me falando com você.- Mas? -Apontou ele amavelmente.- Adeus - Categoricamente. Mikhail empreendeu o vôo, subindo vertiginosamente por cima do bosque.Não era um adeus. Ele não permitiria. Não podia permitir. Sua sobrevivência dependia dela. Alguém que tinha despertado seu interesse, seu desejo de viver. Tinha-lhe recordado que ainda existiam coisas como o riso, que a vida consistia em algo mais que a simples existência.Pela primeira vez, em séculos, maravilhou-se da vista que oferecia o bosque,das alturas. A abóbada de ramos que balançavam com o vento, a forma em que os raios da lua se derramavam sobre as árvores e banhavam de prata os arroios. Tudo era incrivelmente belo. Haviam lhe dado um presente de valor incalculável. De alguma forma, uma mulher humana havia conseguido. Uma mulher humana. Saberia imediatamente, se tivesse pertencido aos de sua espécie. Poderia fazer o mesmo pelos outros homens à beira do desespero se tão somente lhes falasse?Uma vez no refúgio de seu lar, passeou, preocupado, com uma inquietaenergia há muito tempo esquecida. Recordava a pele suave, imaginava seu tato aoacariciá-la, sob seu corpo, tentava descobrir qual seria seu sabor. Excitou-se ao pensarna imagem de sua sedosa cabeleira roçando seu acalorado corpo, de sua delicadagarganta diante dele. Seu corpo se endureceu inesperadamente. Não era a atração físicaque havia sentido sendo um novato Era uma dor selvagem, premente e implacável.Perplexo ante o rumo erótico que tomavam seus pensamentos, Mikhail se impôs umarígida disciplina. Não era capaz de confrontar a paixão real. Descobrir que era umhomem possessivo, mortal se o encolerizavam e protetor além de qualquer medida, odeixou aturdido. Esta classe de paixão não podia compartilhar com uma humana. Eramuito perigoso.A jovem era uma mulher livre e forte para ser mortal, e estava certo, que ficariaclara sua natureza possessiva em qualquer ocasião. Ele não era humano. A sua era umaraça de seres com instintos animais implantados muito antes do momento de nascer. Eramelhor manter a distância e satisfazer sua curiosidade só a nível intelectual. Fechou todasas portas e janelas de forma meticulosa, protegendo cada possível entrada com feitiçosimpossíveis de franquear e desceu a seu lugar de descanso, a câmara onde dormiadurante o dia. Estava protegida de qualquer ameaça. Se deixasse esta vida, seria por suaprópria vontade. Tombou na cama. Não tinha necessidade do reparador sono queproporcionavam as profundezas da terra. Podia desfrutar das pequenas comodidadeshumanas. Fechou os olhos e diminuiu sua respiração.Seu corpo se negava a obedecer. Sua cabeça estava cheia de imagens dela, decenas eróticas. Imaginou-a caída na cama, nua sob o tecido branco, elevando os braçospara receber seu amante. Amaldiçoou em voz baixa. Em lugar de imaginar que era eleque a tomava, viu a imagem de outro homem. Um humano. Seu corpo se agitou comira, e sua ira era implacável e mortal.Pele como a seda, cabelo como a seda. Ergueu a mão. Construiu a imagem commortal precisão e com um firme propósito na cabeça. Prestou atenção a todos osdetalhes, inclusive às unhas dos pés, pintadas de uma cor absurda. Seus fortes dedos sefecharam em torno de seu pequeno tornozelo, sentiu a textura da pele feminina e ficousem fôlego, seu corpo se esticou ao imaginar o prazer. Passou a mão por sua perna,massageando-a, tentando-a. Subiu até o joelho, até a coxa.Mikhail sentiu o preciso instante em que ela despertou. Sentia seu corpo arder,o medo da garota o atingiu. De forma deliberada, para que ela soubesse o que estavaenfrentando, deslizou a palma de sua mão pelo interior da coxa, acariciando-a,esfregando brandamente.- Pare! -Ela sentia como seu corpo ardia por ele, como desejava seu contato,desejava que a possuísse. Sentia o desenfreado pulsar do coração ao mesmo tempo emque a luta mental que sustentava com ele.- Você já deixou meio doido algum homem, desta forma? -Mikhailsussurrou as palavras de forma mortalmente sensual e sombria.- Maldito seja, pare! -As lágrimas brilhavam como jóias nos olhos azuis e emsua mente - Eu só queria ajudar. Já me desculpei...Ele continuou movendo a mão, para cima, tinha que fazer, até chegar aospequenos e úmidos cachos que guardavam a entrada de seu lugar secreto. Deixou a mãoali, de forma possessiva, introduzindo-se em sua cálida umidade.- Vai me responder, pequena. Ainda há tempo para que venha para mim, paraque ponha minha marca sobre você, para que eu te possua. -advertiu-lhe com vozsedosa - Me responda.- Por que está fazendo isto?- Não me desafie -Mikhail falou agora com rudeza, pela simples necessidade.Acariciou-a com os dedos até encontrar o lugar mais sensível. - Estou sendoextremamente amável com você.- Já sabe que a resposta é não - murmurou derrotada.Então, ele fechou os olhos, e foi capaz de acalmar os selvagens demônios queferiam seu corpo.- Durma, pequena. Ninguém te fará mal esta noite.Rompeu o contato e se deu conta que seu corpo estava tenso, molhado de suor.Era muito tarde para deter a fera que rugia nele, ansiando sua liberação. Ardia de desejopor ela, sentia como o pulso martelava-lhe as têmporas, as chamas percorriam sua pele echegavam a todas suas terminações nervosas. A fera surgiu, mortal e faminta. Tinhasido muito mais que amável. E ela, sem adverti-lo, havia liberado o monstro. Desejavaque a jovem fosse tão forte como ele acreditava.Mikhail fechou os olhos ante seu outro lado maldito. Fazia séculos que haviaaprendido que não havia nada a fazer. E desta vez não queria lutar. Esta não era umasimples atração sexual, era muito mais. Era algo primário. Algo em seu mais profundoser chamava à parte mais profunda dela. Possivelmente ela desejava sua naturezaselvagem da mesma forma que ele ansiava sua risada e sua compaixão. O queimportava? Já não havia escapatória para nenhum dos dois.Buscou-a com a mente brandamente, antes de fechar os olhos e permitir quesua respiração cessasse. A garota chorava em silêncio, ainda sentia em seu corpo o desejoque lhe havia provocado apenas com a mente. Estava doída e confundida e estaca comdor de cabeça. Sem pensar, sem raciocinar, envolveu-a em seus fortes braços, acariciouseu cabelo e lhe enviou toda a suavidade e a ternura que pôde.- Temo que a assustei pequena; foi um engano. Durma agora, está segura. -Murmurou as palavras enquanto roçava suas têmporas, sua frente, com os lábios, comsuavidade, acariciando sua mente com ternura.Pôde sentir como a mente feminina se fragmentava, como se tivesse estadoutilizando sua capacidade telepática para seguir a alguém doente e retorcido. Parecia termentais feridas que ainda sangravam. Estava entregue ao cansaço devido a seu encontroanterior e não tinha forças para lutar contra ele. Mikhail compassou sua respiração adela, respirando com ela, para ela, devagar, de forma regular, acompanhou osbatimentos do seu coração até que ela relaxou, esgotada e sonolenta. Ordenou-lhe numsussurro que dormisse e ela fechou os olhos. Dormiram de uma vez, mas muitoafastados, a jovem na pensão e Mikhail em seus aposentos.Alguém golpeava a porta de seu quarto, o som penetrou em seu sonho. RavenWhitney lutava contra a espessa névoa que mantinha seus olhos fechados e fazia com queseu corpo se negasse a mover-se. A sensação de alarme a percorreu de cima abaixo. Eracomo se a tivessem drogado. Viu o pequeno despertador na mesa de cabeceira. Eramsete da noite. Tinha dormido durante todo o dia. Espreguiçou-se, lentamente, tinha asensação de estar presa em areias movediças. Os golpes na porta começaram de novo.O som retumbou em sua cabeça martelando suas têmporas.- O que?Tentou fazer com que sua voz soasse calma, embora o coração pulsassefreneticamente. Estava metida num problema. Precisava fazer sua bagagem já e saircorrendo. Sabia que seria inútil. Não era ela a única que tinha seguido mentalmentequatro assassinos psicopatas? E este homem era mil vezes melhor telepata que ela.Embora a verdade era que se sentia intrigada ao encontrar outra pessoa com habilidadestelepáticas. Nunca havia conhecido outra pessoa com um dom como o seu até agora.Queria ficar e aprender com ele, mas a forma casual na qual ele utilizava seus poderes, ofazia muito perigoso. Veria-se obrigada a pôr distância entre eles, possivelmente, cruzaro oceano para sentir-se a salvo.- Raven, você está bem? -A voz masculina deixava entrever a preocupação.Jacob. Tinha conhecido Jacob e Shelly Evans, um casal de irmãos, na noiteanterior no restaurante, ao chegar da viagem no trem. Viajavam fazendo um percursoturístico junto com outras seis pessoas. Ela se sentia muito cansada e não se inteiroumuito bem da conversa que mantiveram.Raven tinha vindo aos Cárpatos para estar sozinha e recuperar-se dosofrimento que teve ao conhecer a mente retorcida de um depravado assassino em série.Não tinha procurado a companhia dos turistas, mas Jacob e Shelly tinham ido procurá-la. Havia-os esquecido por completo.- Estou bem, Jacob, temo que tenho uma pequena gripe. -respondeu-lhe ela,sentindo-se longe de estar bem. Passou uma mão trêmula pelo cabelo - Só estoucansada. Vim aqui para descansar.- Não vamos jantar juntos? - Ele estava preocupado e isso a surpreendeu.Não queria que ninguém lhe impusesse nada e a última coisa que precisava era estar emum restaurante lotado, rodeada de várias pessoas.- Sinto muito. Possivelmente em outra ocasião -Não tinha tempo para sereducada. Como pôde cometer esse engano tão enorme a noite anterior? Sempre eramuito cuidadosa, evitava qualquer contato, nunca tocava em outra pessoa, nunca seaproximava de ninguém.Simplesmente percebera a tremenda dor e solidão que irradiava daqueledesconhecido. Soube por instinto, que ele possuía poderes telepáticos, que sua solidãoera muito maior que a dela, que sua dor era tão enorme que estava expondo a idéia deacabar com sua vida. Ela sabia o que era a solidão. Como a fazia sentir-se diferente. Nãohavia sido capaz de ficar com a boca fechada, precisava ajudar se pudesse. Ravenesfregou as têmporas tentando aliviar o martelar que sentia na cabeça. Sempre ocorriadepois de usar seus poderes telepáticos.Obrigando-se a levantar, caminhou devagar para o banho. Ele a controlavasem nem sequer manter contato. A idéia a aterrorizou. Ninguém deveria ser tãopoderoso. Abriu a torneira, por completo, esperando que o jorro de água limpasse asteias de aranha de sua mente.Estava ali para descansar, para desfazer do mau cheiro que impregnava suamente, para sentir-se limpa e inteira novamente. Seu dom psíquico a esgotava até deixá-la fisicamente exausta. Raven elevou o queixo. Seu novo competidor não a assustaria.Ela tinha disciplina e controle. E desta vez podia fugir. Não tinha vidas inocentes emjogo.Vestiu-se com uns jeans desgastados e um top de crochê como desafio. Tinhanotado que ele pertencia ao Velho Mundo e franziria o cenho ante seu traje americano.Fez a mala num instante, de qualquer maneira, colocando a maquiagem e a roupa namaltratada mala, tão rápido quanto pôde.Horrorizada, leu o horário do trem. Não passava nenhum antes de dois dias.Podia usar seus encantos para pedir a alguém que a levasse até a cidade mais próxima,mas isso significava compartilhar a estreiteza de um carro com outra pessoa durantehoras. Embora, provavelmente, fosse um mal menor.Escutou a risada masculina. Rouca, divertida e zombadora.- Tenta fugir de mim, pequena.Raven se sentou deprimida, na cama, com o coração acelerado. A voz do homem a fez lembrar de veludo negro. Macia, mas uma voz perigosa, uma arma muitoperigosa.- Não jogue flores, peixe gordo. Sou uma turista. Eu viajo.Obrigou a sua mente a permanecer tranqüila apesar de sentir o toque dos dedosdele sobre seu rosto. Como o fazia? Era a mais ligeira das carícias, mas ela estremeceu decima abaixo.- E que lugar pensava visitar? -Mikhail estava descansado e sua mente sesentia viva de novo. Desfrutava lutando com ela.- Pensava ir para longe de você e de seus grotescos joguinhos. Possivelmentepara a Hungria. Sempre quis visitar Budapeste.- Mentirosa. Pensa voltar correndo para os Estados Unidos. Joga xadrez?Raven piscou ante a estranha pergunta.- Xadrez? - Repetiu.A forma de se divertir de um homem podia ser muito estranha.- Xadrez- Sim. E você?- É obvio. Jogue comigo.- Agora?Ela começou a recolher sua espessa cabeleira. Havia algo na voz que a cativava,hipnotizava-a. Tocava as fibras de seu coração, mas aterrorizava sua mente.- Primeiro devo saciar meu apetite. E você também está faminta. Posso sentirsua dor de cabeça. Desça para jantar e a encontrarei esta noite às onze.- De maneira nenhuma. Não ficarei com você.- Tem medo - Era um insulto deliberado.Ela sorriu e o som fez com que chamas envolvessem o corpo de Mikhail.- Pode ser que algumas vezes faça tolices, mas não sou tola.- Diga seu nome.Era uma ordem e Raven se viu obrigada a obedecer.Forçou sua mente a ficar por fora, mas ela doía, sentia agulhadas na cabeça, e oestômago retorcer. Ele não ia pegá-la pela força, o que o tivesse dado livremente.- Por que luta contra mim quando sabe que sou o mais forte dos dois? Fazmal a si mesma. Debilita-se e no final ganharei de todas formas. Sinto o efeito que estaforma de nos comunicar tem sobre você. Sou capaz de obter sua submissão em outrasquestões muito diferentes.- Por que me obriga, quando eu diria, se simplesmente tivesse perguntado?Ela percebeu sua perplexidade.- Sinto muito, pequena. Estou acostumado a me sair bem sem esforço.- Sem ter a mínima cortesia?- Às vezes é mais rápido.Raven golpeou o travesseiro.- Precisa polir sua arrogância. O fato de que tenha poder, não significa quetenha que se exibir dele.- Esquece-se, que a maioria dos humanos não detectam um empurrãozinhomental.- Essa não é desculpa para deixar de lado a liberdade das pessoas... E vocênão usa um empurrãozinho de maneira nenhuma, você lança uma ordem e esperaobediência. Isso é pior, porque converte as pessoas num rebanho. Estou perto daverdade?- Está-me provocando.Desta vez seus pensamentos não chegaram tão claros, como se todas aquelasbrincadeiras o estivessem cansando.- Não tente me obrigar.Desta vez a voz de Mikhail deixava notar uma certa ameaça e bastante perigo.- Não tenho que tentar, pequena. Conseguiria sua obediência sem esforço. -Inexorável, mas suave como a seda era sua voz.- Você está me parecendo um menino malcriado que sempre consegue o quequer - Raven ficou de pé, apertando o travesseiro sobre seu dolorido estômago. -vou descer para jantar. Sinto uma terrível dor de cabeça.Ela não mentia. Lutar contra ele era um grande esforço e começava a sentirnáuseas. Encaminhou-se devagar para a porta, temerosa de que ele a detivesse. Sentiriasemais segura entre as pessoas.- Por favor, seu nome, pequena. - Ele pediu-lhe com grande educação.Raven se encontrou sorrindo, apesar de tudo.- Raven. Raven Whitney.- Então, Raven Whitney, coma e descanse. Voltarei as onze para nossa partidade xadrez.O contato se rompeu de repente. Raven soltou o ar de seus pulmões, devagar,consciente de que deveria sentir-se aliviada e não subestimá-lo como de fato acontecia.Sua voz a hipnotizava e a seduzia, sentia o riso masculino em cada conversa. Ela sofria amesma solidão que ele.Não se permitiu analisar a forma em que seu corpo voltou para a vida com otoque de seus dedos. Ardia por ele. Queria-o. Precisava dele. E só o havia conhecidocom a mente. Sua forma de seduzir ia além do meramente físico. Havia algo profundo,elementar e ela não era capaz de precisá-lo. Ele havia chegado ao fundo de sua alma. Anecessidade que percebeu nele, sua escuridão, sua atormentada e terrível solidão. Elatambém sentia necessidade. Alguém que entendesse o que era estar tão sozinha, tãoassustada ao tocar qualquer outro ser humano, aterrorizada por ter alguém perto.Gostava de sua voz, com a elegância européia e a arrogância masculina. Queriaseu conhecimento, suas habilidades.Sua mão tremeu ao abrir a porta e respirar o ar do corredor. De novo, seucorpo voltava a ser dele, movia-se naturalmente, de forma compassada, obedecendo asuas próprias instruções. Desceu as escadas correndo e entrou no restaurante.Havia várias mesas ocupadas, muitas mais que na noite anterior. Normalmente,Raven evitava os lugares públicos tanto quanto era possível, assim não tinha por que sepreocupar em levantar seu escudo protetor para não sentir as emoções alheias. Inspirouprofundamente e entrou.Jacob deu-lhe as boas-vindas com um sorriso, levantou-se como se esperasseque ela se unisse ao grupo de sua mesa. Raven sorriu por sua vez, sem se dar conta desua aparência, inocente, sensual e completamente inalcançável. Cruzou a sala, saudouShelly e foi apresentada a Margaret e Harry Summers.Americanos. Tentou não mostrar nenhum sinal de alarme. Sabia que suafotografia tinha sido publicada em todos os jornais e inclusive na televisão, durante ainvestigação dos últimos assassinatos. Não queria ser reconhecida, não queria voltar aviver o horrendo pesadelo de sentir a mente depravada e retorcida daquele homem. Nãohaveria lugar para um tema tão horroroso durante o jantar.- Sente-se aqui, Raven - Jacob lhe ofereceu uma cadeira de respaldo alto.Evitando cuidadosamente o contato físico, Raven se sentou. Era um infernoestar perto de tanta gente. Quando era pequena, a quantidade de emoções que percebia, asobressaltavam. Esteve a ponto de enlouquecer, até que aprendeu a se proteger, aconstruir uma barreira protetora. Funcionava a não ser que a dor ou a angústia fossemuito forte, ou se a tocava fisicamente, qualquer outro ser humano. Ou se estava napresença de uma mente doente e nefária.Nesse momento, com a conversa fluindo a seu redor e todos desfrutando dojantar, começou a sentir os sintomas clássicos da sobrecarga de imagens. Umas agudasespetadas lhe atravessavam a cabeça e seu estômago protestava. Não seria capaz decomer.Mikhail inspirou o ar da noite, movendo-se devagar entre as pessoas,procurando o que precisava. Não era uma mulher. Não poderia suportar tocar a pele deoutra mulher. Era muito perigoso que o fizesse, em seu atual estado de excitação sexual,estava muito perto de sucumbir à transformação. Podia perder o controle. Por issotinha que ser um homem. Moveu-se facilmente entre as pessoas, devolvendo saudaçõesàqueles que conhecia. Era um homem respeitado e querido.Deslizou atrás de um jovem forte e musculoso. Seu aroma era saudável, suasveias estavam cheias de vida. Depois de uma breve e singela conversa, Mikhail envioubrandamente sua ordem, passou seu braço pelos ombros do moço. Internaram-se nassombras, ele inclinou a cabeça e se alimentou. Manteve suas emoções firmementecontroladas. Gostava deste homem, conhecia sua família. Não podia cometer nenhumengano.Enquanto levantava a cabeça, assaltou-lhe a primeira onda de angústia.Raven.Inconscientemente tinha procurado o contato mental com ela, roçando suamente para assegurar-se de que ainda continuava lá. Agora que estava alerta, acabou suatarefa rapidamente, liberou o jovem do transe, continuou com a conversa, rindoamigavelmente, aceitando com alívio a mão do rapaz ao despedir-se, sujeitando-oquando pareceu perder o equilíbrio.Mikhail abriu sua mente, concentrou-se no fio que devia seguir. Tinhampassado anos, suas habilidades estavam um pouco oxidadas, mas ainda podia "ver"quando queria. Raven estava sentada à mesa com dois casais. Estava bela, serena. Mas elesabia que ela não se sentia assim. Podia perceber sua confusão, a implacável dor decabeça e seu desejo de sair da cadeira e deixar para trás todo mundo. Seus olhos,brilhantes safiras, pareciam atormentados, meras sombras em um rosto totalmentepálido. Tensão. Surpreendeu-lhe sua fortaleza. Não havia forma de que qualquer outrapessoa que não ele, percebesse telepaticamente, sua agonia.E então, o homem que estava sentado a seu lado se inclinou para ela, olhou-aaos olhos, sua face refletia sua inexperiência, seus olhos desejo.- Vamos passear, Raven. - Ele ugeriu e deixou casualmente a mão por cimade seu joelho.Imediatamente, a dor de cabeça de Raven aumentou, estalando em seu interior,golpeando-a atrás dos olhos. Ela afastou a perna da mão de Jacob.Os demônios interiores rugiram de ira, liberaram-se em uma explosão.Mikhail jamais havia sentido tanta fúria. A sensação percorria seu corpo, reclamava-o,apoderou-se dele. Aquele tipo podia feri-la, de forma tão casual, sem saber ou sem seimportar. Aquele tipo podia tocá-la, enquanto ela estava vulnerável e desprotegida.Aquele tipo podia deixar suas mãos sobre ela. Atravessou o céu como um raio, enquantoo ar fresco dispersava sua ira.Raven percebeu sua fúria. A atmosfera da sala se fez pesada. Fora, o ventocomeçou a soprar formando diabólicos espirais. Os ramos das árvores golpeavam osmuros da pensão. O vento soava nas janelas de forma sinistra. Vários garçons fizeram osinal da cruz, olhando assustados a repentina mudança da noite, agora escura, semestrelas. O ambiente ficou inesperadamente em silêncio, como se todos estivessemcontendo a respiração.Jacob ofegou, levando as mãos à garganta, como se tirasse dedos fortes eopressivos. Sua face ficou vermelha, com manchas violáceas e já estava com os olhosquase fora das órbitas. Shelly gritou e um garçom jovem correu para ajudar Jacob quese asfixiava. As pessoas ficavam de pé, esticando o pescoço para poder ver melhor.Raven obrigou seu frágil corpo a permanecer calmo. Não podia sair ilesa com tantasemoções fluindo de uma vez.- Liberte-o.Obteve um silêncio por resposta.O garçom tentava ajudar Jacob por trás, realizando a manobra do Heimlich,ainda assim, Jacob caiu de joelhos com os lábios azulados enquanto deixava os olhos embrancos.- Por favor. Suplico-lhe. Solte-o. Faça por mim.De repente, Jacob começou a respirar dificultosamente, ofegando. Sua irmã eMargaret se abaixaram a seu lado com os olhos cheios de lágrimas. De forma instintiva,Raven se moveu para ele.- Não o toque!Foi uma ordem real, que a atemorizou como se ele a tivesse forçado com seuspoderes.As emoções de todas as pessoas da casa assaltavam Raven. A dor e o terror deJacob. O medo de Shelly, o terror da proprietária da pensão, o impacto que haviamsofrido os outros americanos. Curvavam-na, golpeavam-na até fazê-la sentir frágil etranstornada. Mas era sua avassaladora ira, que enviava alfinetes em sua cabeça. Sentiunáuseas a revolver seu estômago e quase se viu obrigada a ajoelhar-se para evitar a dor,olhando desesperada para todos lados, procurando o toalete das senhoras. Se alguémtentasse tocá-la, ajudá-la, ficaria louca.- Raven.A voz era macia, sensual, e a acariciava. A calma no olho do furacão. Veludonegro. Bela. Balsâmica.Fez-se um estranho silêncio no restaurante, enquanto Mikhail o cruzava.Emanava autoridade e arrogância.Era alto, moreno, bem formado e musculoso, mas eram seus olhos, cheios deenergia, de escuridão, de milhares de segredos, que atraíram imediatamente. Esses olhospodiam hipnotizar ou seduzir, como fazia sua voz. Ele sabia por onde devia mover-separa chegar a ela, afastava os garçons para um lado.- Mikhail, é um inesperado prazer tê-lo entre nós - ofegou com surpresa aproprietária da pensão.Ele lançou uma rápida olhadela à roliça figura da mulher.- Vim por Raven. Temos um encontro -Disse docemente, mas com talautoridade que ninguém se atreveu a discutir com ele. - Desafiou-me para uma partidade xadrez.A proprietária da pensão assentiu com a cabeça enquanto sorria.- Divirtam-se.Raven cambaleou, enquanto apertava o estômago com os braços. Seus olhos decor safira enormes, ao sentir que Mikhail se aproximava, levantou a cabeça. Estava a seulado antes que fosse capaz de se mover e estendeu os braços para sustentá-la.- Não o faça.Raven fechou os olhos, aterrorizada por seu contato. Já não podia com tantasemoções, não seria capaz de suportar as poderosas irradiações de seu corpo.Mikhail não duvidou um instante, pegou-a nos braços e a estreitou contra seupeito. Enquanto se voltava para sair com ela do restaurante, seu rosto era uma máscarade granito. Depois deles, os sussurros e murmúrios começaram a elevar-se.Raven ficou tensa, esperando a descarga sobre seus sentidos, mas ele haviafechado sua mente e só pôde perceber a enorme força de seus braços. Saíram à escuridãoda noite. Mikhail andava com agilidade e elegância, como se ela não pesasse nada.- Respire, pequena. Isso ajuda.Percebeu o pingo de diversão na maciez de sua voz. Raven fez caso de suasugestão, muito exausta para lutar. Havia vindo a este lugar selvagem e afastado para securar, mas em lugar de sentir-se recuperada, sua mente estava ainda mais maltratada.Abriu os olhos com muito cuidado, olhando-o através de seus cílios. Seu cabelo era decor castanho escuro, quase negro, como o café. Estava penteado para trás e recolhido nanuca. Seu rosto poderia pertencer a um anjo ou a um demônio, pois era forte epoderoso, com uma boca sensual que se curvava com uma ameaça de crueldade. Seusolhos entrecerrados eram escuros. Gelo negro, pura magia negra.Raven não pôde ler sua mente, seus pensamentos ou emoções. Jamais haviaacontecido isso com ela antes.- Solte-me. Sinto-me um pouco tonta... Parece que me seqüestrou um pirataou algo assim.Eles estavam-se embrenhando nas profundezas do bosque a grandes passadas.Os ramos das árvores e os arbustos rangiam com o vento. Seu coração pulsavadescontrolado. Ela esticou o corpo, empurrou os fortes ombros e lutou em vão.Mikhail baixou o olhar para seu rosto, de forma possessiva, mas não diminuiuo passo e tampouco a respondeu.Era humilhante que ele nem sequer percebesse seus esforços por libertar-se.Com um pequeno suspiro, Raven se permitiu apoiar a cabeça contra seu ombro.- Resgatou-me ou seqüestrou-me?Ele mostrou seus dentes brancos com o sorriso de um predador, de umhomem em busca de diversão.- Possivelmente as duas coisas.- Onde me levará? - Ela não queria começar outra batalha física ou mental.- À minha casa. Temos um encontro. Sou Mikhail Dubrinsky.Raven esfregou as têmporas.- Talvez não seja uma boa idéia. Esta noite me sinto um pouco... - Ela seinterrompeu ao captar com a extremidade do olho, uma sombra que seguia seus passos.Quase parou seu coração. Olhou a sua volta, tornou a olhar, fê-lo pela terceira vez. Suamão se firmou no ombro masculino. - Solte-me, Dubrinsky.- Mikhail - Corrigiu ele, sem deter-se. Um ligeiro sorriso aparecia em seuslábios.- Viu os lobos? -Ela notou que ele encolhia os ombros com total indiferença.- Fique tranqüila, pequena. Não nos farão mal. Este é seu lar como é o meu.Temos um acordo e estamos em paz os uns com os outros.De alguma forma ela soube que ele dizia a verdade.- Vai me fazer algum mal? -Fez a pergunta com suavidade, precisava saber.Os olhos escuros detiveram-se de novo em seu rosto, havia um inequívocoolhar possessivo que encerravam milhares de segredos.- Não faria mal a uma mulher como você está pensando. Mas estou seguroque nossa relação não sempre será serena. Você gosta de me desafiar. - Respondeu ele,de forma tão honesta, como foi possívelSeu olhar fazia com que se sentisse dele, como se pertencesse só a ele e eletivesse direito sobre ela.- Cometeu um engano ao fazer mal a Jacob. Podia tê-lo matado.- Não o defenda, pequena. Permiti que continuasse com vida por você, masnão me causaria nenhum problema terminar o assunto. - Seria agradável. Nenhumhomem tem o direito a tocar à mulher de Mikhail e feri-la como esse humano acabava defazer. A incapacidade do homem, em perceber a dor que estava causando a Raven, não oabsolvia de seu pecado.- Estou segura de que não pensa isso. Jacob não tem a culpa. Sentir-se atraídopor mim. - Ela tentou explicar amavelmente.- Não voltará a me dizer seu nome. Tocou-a. Ele pôs sua mão sobre você.Ele deteve-se de repente, nas profundezas do bosque, tão selvagem como a oslobos que os rodeavam. Nem sequer respirava com esforço embora tivesse andadovários quilômetros com ela nos braços. Olhou-a diretamente nos olhos, de formaimplacável.- Fez-lhe muito mal.Raven ficou sem fôlego ao notar que ele baixava a cabeça para ela. Seus lábiosse detiveram quase sobre os seus. Tão perto que ela podia sentir sua respiração quente,sobre a pele.- Não me desobedeça neste assunto, Raven. Este homem a tocou, fez-lhe male não encontro nenhum motivo para que continue vivendo. - Ele contemplou seu rostoimplacável.- Está falando sério?Ela não queria sentir a lânguidez que se estendeu por seu corpo, depois deouvir suas palavras. Jacob lhe fez muito mal. Sentiu tanta dor que apenas podia respirare de alguma forma, só Mikhail tinha percebido.- Terrivelmente a sério - Ele continuou andando, a grandes passos.Raven permanecia em silêncio, tentando solucionar aquele mistério. Ela sabia oque era o mal, tinha-o açoitado, banhou-se nele, na mente depravada e obscena de umassassino em série. Este homem falava da morte como se fosse algo normal. Mas nãopercebia maldade alguma em Mikhail. Sabia que estava em perigo, pois MikhailDubrinsky era um grave perigo para ela. Um homem com poderes ilimitados eprepotente no uso de sua força. Um homem que acreditava ter direitos sobre ela.- Mikhail? - Estava começando a tremer. - Quero voltar.Os olhos escuros baixaram novamente para seu rosto, percebendo as sombrassob seus olhos dilatados pelo medo. Seu coração pulsava alucinado e seu corpo miúdotremia.- Retornar para onde? Para a morte? Para a solidão? Não tem nada com todaessas pessoas e comigo tem tudo. Retornar não é a resposta. Antes ou depois não serácapaz de satisfazer suas demandas, suas petições. Cada vez que os ajuda, eles levam partede sua alma. Comigo cuidando de você, estará mais segura.Raven se equilibrou sobre o peito masculino, tentando empurrá-lo, mas suasmãos foram tomadas pelo calor que desprendia sua pele. Mikhail simplesmente estreitouseu abraço, a diversão em ver as inúteis tentativas de Raven, provocava calidez a seuolhar.- Não pode lutar comigo, pequena.- Tenho que voltar, Mikhail - Conseguiu controlar sua voz. Não estavacerta de estar dizendo a verdade. Ele a conhecia. Sabia o que ela realmente sentia, o preçoque pagava por seu dom. A atração entre eles era tão forte que mal ela podia pôr emordem seus pensamentos.A casa se elevou diante deles de repente, escura e ameaçadora, uma confusamassa de pedras. Raven se segurou à camisa de Mikhail. Sabia que em seu estadonervoso, não era capaz de controlar o gesto revelador.- Está a salvo comigo, Raven. Não permitiria que nada ou ninguém lhefizesse mal.Com os nervos à flor de pele, ela engoliu em seco, enquanto ele empurrava aspesadas portas de ferro da grade e subia as escadas.- Depois de você.Deixou que seu queixo acariciasse seu sedoso cabelo, sentindo como seu corpoestremecia em resposta.- Bem-vinda a meu lar. - Ele pronunciou as palavras docemente,agasalhando-a com elas, como se ela fosse a luz do fogo ou um raio de sol. Devagar e acontragosto, deixou-a em pé no chão da entrada.Mikhail passou a seu lado para abrir a porta, depois se afastou.- Entra em minha casa, por sua vontade e livremente? -Perguntou-lhe demodo formal, mas olhando-a de forma abrasadora, cravando o olhar em seus lábiosantes de olhar seus olhos.Ela estava assustada. Podia ler nela facilmente, um ser selvagem e cativo quequeria confiar nele, mas que se sentia incapaz de fazer, tentada a sair correndo,abandonada, mas desejosa de lutar até o último momento. Precisava dele quase como elea precisava dela. Tocou o trinco da porta com as pontas dos dedos.- Se disser que não, me levará de volta à estalagem?Por que queria estar com ele quando sabia que era um homem terrivelmenteperigoso? Ele a estava "empurrando"; ela podia perceber, porque seus poderespsíquicos estavam muito desenvolvidos para não se dar conta. Via-se sozinho,orgulhoso e seus olhos ardiam de desejo por ela. Estavam famintos. Não a respondeu,não tentou convencê-la, simplesmente ficou de pé, em silêncio, esperando.Raven emitiu um pequeno suspiro, sabendo-se derrotada. Nunca antes, haviaconhecido outro ser humano com o qual pudesse sentar-se e conversar, inclusive tocá-losem sofrer o bombardeio de pensamentos e emoções. Isso já era uma forma de sedução.Transpôs a soleira da entrada. Mikhail a pegou pelo braço.- Livremente. Diga.- Livremente. Faço-o por minha vontade. - Entrou na casa, olhando para ochão. Não viu a alegria selvagem que iluminou o rosto dele.

OlÁ!

*Meus queridos leitores, como vocês perceberam há bastantes palavras grudadas, então eu gostaria de saber se é muito incomodo, se for, postarei apenas três capitulo no máximo, por semana (revisado e com todos os erros corrigidos), se não, um por dia (assim como esta agora). Fica nas mãos de vocês, espero que tenham gostado.

*Sempre que postar um novo capitulo, dedicarei a um leitor, quem quiser ser dedicado basta pedir em comentário.

Beijos!

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Príncipe SombrioOnde histórias criam vida. Descubra agora