Capítulo 2

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 A pesada porta fechou-se atrás de Raven com um ruído surdo

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A pesada porta fechou-se atrás de Raven com um ruído surdo. Ela começou a tiritar e a esfregar os braços, estava muito nervosa. Mikhail lhe jogou uma capa sobre os ombros. Raven viu-se envolta por seu quente aroma masculino. Atravessou o saguão a grandes passos e abriu as portas da biblioteca. Acendeu o fogo num momento e mostrou-lhe uma poltrona, ao lado da chaminé. Era de respaldo alto e macia tapeçaria. Era uma peça de antiquário, embora não parecesse nada deteriorada nem desgastada. Raven estudou o aposento com certo temor. Era uma moradia grande, com um belo piso de madeira em forma de mosaico. Em três das paredes, viam-se estantes cobertas de livros. A maioria encadernados em couro e muitos deles antiguíssimos. As poltronas eram cômodas, a mesinha antiga, também estava em estupendas condições. O tabuleiro de xadrez era de mármore e as peças eram esculpidas à mão. - Beba isto. Esteve a ponto de pular da cadeira, quando o viu junto a ela oferecendo-lhe um copo de cristal. - Não tomo bebidas alcoólicas. Ele sorriu daquela forma que fazia seu coração bater rápido. Seu agudo sentido de olfato já havia percebido essa informação com antecedência. - Não é álcool. É uma mescla de ervas para sua dor de cabeça. Uma sensação de alarme se estendeu em seu interior. Tinha sido uma loucura estar ali. A situação era como tentar relaxar, sabendo que havia um tigre selvagem na casa. Ele podia fazer-lhe alguma coisa e ninguém iria a ajudá-la. Se a drogasse... Meneou a cabeça com decisão. - Não, obrigado. - Raven - Disse em voz baixa, acariciante, hipnótica. - Obedeça. Seus dedos se curvaram ao redor do copo, lutou para impedi-lo, mas a cabeça estalou com uma súbita e lacerante dor. Gritou. Mikhail estava a seu lado, de pé, cobriu com sua mão os dedos que seguravam o frágil cristal.

- Por que me desafia por coisa tão insignificante? As lágrimas lhe queimavam a garganta, mas não ia chorar. - Por que me obrigaria a tomá-la? Ele levou a mão a garganta dela, rodeou-a e elevou o queixo. - Porque sente dor e quero que a dor desapareça. Podia ser tão simples? Seus olhos aumentaram com a estupefação. Doía-lhe a cabeça e queria que a dor desaparecesse? Era realmente tão protetor ou simplesmente divertia-se em fazê-la aceitar sua vontade? - Eu quem devo decidir. Nisso consiste a liberdade. - Vejo a dor em seus olhos, sinto-a em seu corpo. Sabendo que posso ajudar, é lógico que permita, que continue sentindo-se mal simplesmente porque quer demonstrar alguma coisa? - Sua voz denotava confusão - Raven, se tivesse intenção de fazer-lhe algum mal, não precisaria drogá-la. Deixe-me ajudar. - Movia o polegar sobre sua pele com uma carícia ligeira, sensual, seguindo a linha do pescoço, desenhando sua face até chegar ao lábio inferior. Raven fechou os olhos e deixou que ele aproximasse o copo de seus lábios, fazendo o líquido agridoce descer por sua garganta. Sentiu que estava pondo sua vida nas mãos daquele homem. Suas carícias eram possessivas. - Relaxe, pequena. - disse ele, brandamente - Me fale de voce. Como é que pode ouvir meus pensamentos? - Seus fortes dedos iniciaram uma relaxante massagem sobre as têmporas de Raven. - Sempre fui capaz de fazer essas coisas. Quando era pequena, pensava que todo mundo podia ler os pensamentos dos outros. Mas era terrível ouvir o mais profundo de cada pessoa, seus segredos. Ouvia e sentia coisas a cada minuto - Ela nunca falava de sua vida, de sua infância, a ninguém e muito menos a um completo estranho. Mas Mikhail não era um estranho. Parecia formar parte de sua vida. Uma parte de sua alma. Era importante que contasse - Meu pai pensava que eu era uma espécie de monstro, um demônio, até minha mãe se assustava de mim. Aprendi a não tocar em ninguém, a não me colocar em meio a muitas pessoas. Era melhor estar sozinha, em lugares solitários. Era a única forma de não perder a razão. Durante um segundo os dentes de Mikhail apareceram, ameaçadores, queria estar a sós com seu pai. Só alguns minutos, para ensinar o que era realmente um demônio. As palavras de Raven haviam despertado a ira em seu interior. Era uma situação alarmante e interessante. Saber que ela estava só há tantos anos, que tinha suportado a dor e a solidão estando ele no mundo, o enfurecia. Por que não havia ido procurá-la? Por que seu pai não a havia amado e protegido como devia? Suas mãos estavam operando milagres, deslizando-se até a nuca, seus dedos eram fortes, sua massagem hipnótica. - Faz poucos anos, um homem estava assassinando famílias inteiras, crianças pequenas. Eu vivia com uma amiga do instituto e quando voltei do trabalho, encontrei-os todos mortos. Quando entrei na casa pude sentir a maldade, seus pensamentos. As coisas que passavam por minha cabeça me davam náuseas, mas fui capaz de localizá-lo e finalmente guiar à polícia até ele. Mikhail acariciou a grossa trança com as mãos, até encontrar a presilha que a prendia. Soltou-a e desfez as compridas e sedosas mechas, ainda úmidos pela ducha que ela havia tomado horas antes. - Quantas vezes fez o mesmo? - Ela deixava que a informação fluísse. O horror, a dor, as faces das pessoas que ajudavam, enquanto ela realizava seu trabalho, atônitos, fascinados e enojados pela habilidade que possuía. Ele viu todos os detalhes compartilhando sua mente, lendo suas lembranças para conhecê-la realmente. - Quatro. Persegui quatro assassinos. A última vez me derrubou. Estava doente e ele era muito perverso. Senti-me suja, incapaz de tirá-lo da cabeça. Vim para cá, esperando encontrar paz. Decidi que jamais voltaria a fazer o que fiz. Atrás dela, Mikhail fechou os olhos, por um momento, para acalmar-se. Ela se sentia suja! Podia ver seu interior, sua alma e seu coração, cada segredo. Ela era luz e compaixão, força e amabilidade. Jamais deveria ter visto as coisas que presenciara. Esperou até que sua voz esteve calma e serena. - Dói-te a cabeça ao usar suas habilidades telepáticas? - quando ela assentiu com um movimento de cabeça, continuou - E ainda assim, quando me ouviu, dolorido e desesperado, chegou até mim sabendo o preço que iria pagar. Como podia explicar-lhe Sentiu-o como um animal ferido, irradiando tanta dor, que ela pôs-se a chorar. Compartilhavam a mesma solidão. E ela havia percebido sua intenção de acabar com a dor, com a vida. Não podia deixar que o fizesse, sem se importar com o que acontecesse. Mikhail deixou escapar o ar de seus pulmões lentamente. A bondade de seu caráter e sua entrega o deixou-o atônito e impressionado. Estava duvidando, não sabia se poderia expressar com palavras, o porquê de se colocar em contato com ele, mas Mikhail soube que era natural nela, entregar-se de forma desinteressada. Também descobriu que ela ouviu sua chamada tão intensamente porque, esse algo profundo nele que alcançou sua mente, havia descoberto em Raven, tudo o que necessitava. Aspirou seu perfume, abraçando-o, desfrutando da maravilhosa visão de tê-la em seu lar, de respirar seu aroma, de sentir seu cabelo sedoso entre suas mãos, sua pele suave sob seus dedos. A luz do fogo arrancava reflexos azulados de seu cabelo. A necessidade o golpeou com força, com dolorosa urgência e se deleitou nesta dor porque agora era capaz de sentir. Sentou-se ao outro lado da mesa, em frente a ela, arrastou seu olhar prazerosamente por suas tentadoras curvas. - Por que se veste com roupa de homem? - perguntou-lhe. Ela soltou uma risada suave e melodiosa, os olhos a iluminaram com esta pequena travessura. - Porque sabia que te incomodaria. Mikhail jogou a cabeça para trás e gargalhou. Desta vez, o riso era genuíno, puro, real. A felicidade o enchia e o carinho começava a agitar-se em seu interior. Não era capaz de recordar como eram esses sentimentos, mas as emoções que o atravessavam eram agudas, claras e deixavam seu corpo docemente dolorido. - É necessário me incomodar? Ela ergueu uma sobrancelha e o olhou, deu-se conta que a dor de cabeça havia desaparecido por completo. - É tão fácil... - brincou Raven. Ele se inclinou sobre a mesa, diminuindo a distância entre ambos. - É uma mulher desrespeitosa. Quer dizer que é muito perigoso. - Hum, possivelmente um pouco perigoso também - Ela afastou o cabelo do rosto com um movimento da mão. O gesto era um hábito inocente, mas incrivelmente sensual. Deixou à vista a perfeição de seu rosto, a plenitude de seus seios e a suave curva de sua garganta.

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