Capítulo 4 - David Peterson

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Primeira noite em uma fazenda e já tive pesadelos. Confesso que o silêncio me deixou em uma zona de conforto, estava habituado com isso, mas não diminuíram meus sonhos de guerra. Duas da manhã e já me vi de pé. Caminhei pelo corredor sem o mínimo de barulho, pois não queria acordar Jennifer.

Pensar nela me faz sorrir. Eu notei o quanto nervosa fica quando está comigo, só espero que ela não tenha percebido que também fico assim, e espero que seu nervosismo seja coisa boa e não por medo de mim. Abri a geladeira e bebi um pouco de água. Depois fui para o lado de fora observando tudo ainda escuro. Talvez aqui seja tranquilo mesmo, sem nenhum perigo como na cidade grande. Sentei no banco de madeira encostado na parede e divaguei por um tempo. Só percebi as horas quando o sol deu o sinal de sua presença pelos montes mostrando a lindeza do lugar. Entro na casa fechando tudo e volto para meu quarto ao mesmo tempo em que Jennifer sai do seu, me surpreendi por ela estar acordada tão cedo.

Suas pernas esbeltas e brancas à mostra chamam minha atenção por segundos e levo meus olhos para seu rosto. Consegue ser mais linda pela manhã, é tão natural que me pergunto como seria vê-la acordar entre os lençóis. Trocamos palavras rápidas e evitei ao máximo falar sobre meu problema com o sono, apesar de ela sacar que um ponto disso é o costume.

Ao entrar na cozinha já sinto o cheiro caseiro de café. Jennifer ainda coava o líquido preto, quando aproveitei o momento para fazer ovos mexidos e fritar bacon. Não passou despercebido seu olhar em mim e como movimentávamos em sincronia.

— Já pensou no que vai fazer hoje? — ela perguntou após um gole de café que por sinal está delicioso. Dei de ombros.

— Bem, não sei muito do que há para se fazer em uma fazenda.

— Hoje é meu dia de folga então se quiser, posso lhe mostrar o lugar. — diz graciosa e olho de soslaio.

— Folga? Você trabalha?

— Eu não diria trabalho... Tenho tarefas ao longo da semana, mas quando minha mãe não está eu tomo as rédeas das coisas.

— Interessante. — empurro meu prato limpo de lado e me apoio na mesa. — Que tipo de tarefas você faz?

— Eu cuido dos animais e da horta, às vezes faço a contabilidade da fazenda, mas isso ainda estou aprendendo. Por isso cuido mais dos animais. Todos os dias as tarefas são diferentes, senão são os cavalos, são as galinhas ou os porcos, enfim... O que estiver na lista.

Acompanho-a apontar para um papel pregado na lateral da geladeira e noto ser a lista, as letras é um pouco pequena, mas é possível ver um "ok", do lado de cada frase.

— Se precisar de alguma ajuda nos serviços é só avisar. — me ofereço e vejo seu sorriso crescer.

— Mas é claro! Achou que ia ficar de fora? Só estou te liberando hoje porque é meu dia folga e você não conhece o lugar.

— Você que manda! — brinco rendido e terminamos o café.

Do lado de fora, saindo pela porta da cozinha, vejo uma pequena plantação e alguns homens aguando-as, ela me informa que farei isso algum dia e escondo um sorriso com seu altruísmo em me comunicar. Ainda a pé, Jennifer me mostra o celeiro, a baia dos cavalos, o lugar dos porcos, das galinhas, dos patos, enfim, tudo era perto, em ordem e limpo.

— Tem uma fazenda bonita. — comento, enquanto ela dirigia uma picape, para o que eu achava ser o último lugar a ver.

— Isso porque ainda não viu o coração da fazenda. — murmura alegre e pego um encanto vir de seus olhos.

— Existe um coração? — indago interessado e vejo-a franzir a testa. Algo me diz que ela não queria mencionar tal coisa.

— Só vou lhe mostrar onde ficam as vacas e podemos ir para lá. — diz um pouco receosa.

Fiquei com vontade de dizer que não precisava, mas creio que isso a desagradaria já que ela foi a culpada por ter comentado, então ignorei de certa forma, mas não pude deixar de expressar minha curiosidade pelo lugar, confessando até uma ansiedade.

Na picape, olhei para o lado de fora da minha janela e imaginei como eu seria se tivesse crescido no campo. Talvez o mesmo homem, quer dizer, estaria provavelmente casado e com filhos, tendo como chatice apenas os animais e agricultura. Não demorou muito para ver os pastos com mais ou menos dez vacas. No entanto, a movimentação à frente me dizia que algo estava fora do normal e a tensão vinda do corpo de Jennifer me confirmou. Ela parou o carro e no mesmo instante um funcionário se aproximou preocupado.

— O que aconteceu, Roger? — ela perguntou cuidadosa e quase senti pena dela, sem saber o porquê.

— É que uma das vacas sumiu outra vez dona. Suspeito que ela tenha ido para o lago aqui perto.

— O lago? Outra vez? Mas nessa época do ano aquilo lá deve estar só o lamaceiro. — praguejou em lamúria.

— Eu sei dona. Mas já estamos resolven...

Um grito alto interrompeu o homem chamado Roger e olhei para frente ao mesmo que tempo que os dois ao meu lado, vendo um homem caído no chão. Um arfar do meu lado tirou minha atenção e virei-me olhando para uma Jennifer aflita.

— Está tudo bem? — indago preocupado e ela dá de ombros.

— Espero que sim, vou ver o que aconteceu. Pode me esperar aqui? Volto rápido. — pede sem me olhar, não me dando a chance de responder após sua escapada.

Acompanho Jennifer andar pelos funcionários sem o ar de superioridade. Mesmo sem isso, noto o quanto é respeitada. Foi difícil não analisá-la com a calça jeans e a blusa de mangas curtas que usava. Jennifer tem pernas bonitas e isso não tinha como negar. A nuca descoberta com apenas alguns fios do cabelo amarrado, fazia meus dedos coçarem e isso estava ficando cada vez mais estranho para mim. É apenas uma moça! Eu sabia que era por isso mesmo que estava tão... Melhor esquecer. Desci do carro e segui para onde ela estava, apesar do respeito, muitos a olhavam com outros olhos e estranhamente não gostei disso.

— Foi apenas uma torção dona. — explicou o homem que estava em pé apoiado em uma cerca de madeira.

— Mesmo assim temos que checar isso. Roger, por favor, leve-o para o hospital.

— E quanto a vaca, senhorita? — Roger perguntou e achei que era hora de intervir.

— Eu e Jennifer a buscaremos. — digo e todos me olharam com certo espanto.

Não precisei olhar pra Jennifer para saber que me encarava com uma interrogação. Talvez estivesse pensando em me corrigir, afinal ela prefere Jenny, ou talvez estivesse pensando que tipo de pessoa seria ela se o fizesse participar disso, logo no meu segundo dia aqui. Optei pelo segundo pensamento assim que ouvi sua resposta.

— Não precisa David. Posso deixar você em casa e depois volto para levar um deles comigo.

Ela e um funcionário? Sozinhos? Nem pensar!

— Não é incômodo para mim e eu quero ajudar. — retruco cruzando meus braços e fitando-a com esperteza.

— Não, não mesmo. Se minha mãe sabe disso... E esqueça quanto às atividades, você é convidado aqui.

— Irei me sentir um inútil. — digo pondo um tom mais sério e sinto seu olhar murchar. Depois do que eu acho que foram cinco minutos, ela se dá por vencida.

— Tudo bem. — arfa e faço o possível para não rir enquanto ela continua. — Roger, depois me diga a gravidade da perna dele e quanto a você... — aponta o dedo para mim. — Espero que realmente me ajude.

Voltamos para a picape e fomos resgatar a vaca. Eu já havia ajudado a tirar um tanque de guerra de um lamaceiro, não seria difícil com uma vaca. Eu realmente esperava que não.

Amor em Combate - Os PetersonsOnde histórias criam vida. Descubra agora