A Cor Mais Triste

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Já faziam duas semanas, desde a última vez que a vi. Queria negar mas sentia dolorosamente sua falta, aquela dúvida estava me sufocando. Não imaginava ficar tão mal com essa situação, sem sua presença eu estava como uma casca vazia. Não tinha mais ninguém tão próximo.

Nunca tinha pensado por esse lado, me afastar dela. Éramos inseparáveis, mas agora... Isso não pode ser normal, nunca me senti assim. Não posso estar apaixonado. O quão irônico isso soaria? Se apaixonar por um beijo. Li tantas histórias, e ria dos personagens por serem tão ingênuos, e cá estou eu, sofrendo pela ausência de minha melhor amiga.

Decido tomar uma atitude, eu queria estar com ela. Rir como sempre fazíamos, sentir seu doce cheiro, seu toque quente e apaziguador.

Já era tarde da noite, por volta das 23, mas sabia que ela estaria acordada, pois ela sempre fica pintando até tarde, a conhecia melhor que ninguém. Ela não morava muito longe, era uma casa laranja no fim da rua, ela odiava aquela cor — costumava dizer que uma quando menos esperassem ela pintaria a casa toda novamente.

É inverno, devia estar fazendo muito frio lá fora, então peguei meu casaco e apressadamente saí.

A casa estava completamente escura mas as luzes do quarto dela estavam ligados, atirei pedras em sua janela. Ela me viu. Me ignoraria novamente ou desceria pra falar comigo? Minha cabeça estava explodindo, tinha tantas coisas para falar, mas agora era hora, iria ficar tudo bem. Ela abriu a porta, estava suja de tinta, das pinturas presumi.

— Lena... Eu... — Senti novamente aquela olhar pesar sobre mim, se fixou em uma expressão de desdém e surpresa, e então me interrompeu.

— O que está fazendo aqui? — Sua expressão mudou, estava com raiva e tristeza, mas logo se recompôs, tentando fracassadamente apagar aquela expressão — Eu realmente estou muito cansada, está tarde, não posso falar agora — já estava se inclinando para fechar a porta, quando então explodi.

— LENA, EU GOSTO DE VOCÊ, SERÁ QUE NÃO ENTENDE? — ela empalideceu, e agora me olhava confusa — Você do nada se afastou de mim, me reprimiu, o que aconteceu? Você nem se importou de como eu me sentiria. Não faz ideia de como foi passar meu dias sem você, que sempre foi tão presente na minha vida. Sei que nunca fui de demonstrar, mas é assim que me sinto, e aquele beijo...

— PARE! Pare, agora mesmo! — já perdendo a calma. Seus olhos estavam inundados de lágrimas. — Eu te entender? E você? Nem sabe como me sinto, apesar doa anos, não faz ideia de quem sou. Ah, você não sabe de nada, vive nos seus mundos de conto de fadas em seus malditos livros. Você se afogou tanto neles, que esqueceu do que era real ou não, esqueceu de mim, — ela já estava em um tom de desespero e raiva, e começou a elevar a voz — você já não é o mesmo, EU já não sou mais a mesma. Sabe Ben, tudo sempre se tratou de você, pra mim, vivi por ti, sofri por ti, e amei a ti, mas nem isso você foi capaz de notar. Você quem não se importava com o que eu sento, nem de perto sabe o sentimento que por ti eu tinha. Eu estive ali sempre, esperando, para que você me entendesse, me correspondesse. Tentei apagar o que sentia por você buscando afeto em outros relacionamentos, mas o tempo foi cruel, apenas me machucou.

— Lena, porquê, porquê só agora? — eu estava em choque, meus olhos queimavam, meu coração queria saltar pela boca. Então recuperei o fôlego — Eu não imaginava que era assim que você se sentia em relação à mim, mas agora é diferente, eu juro. Eu não suporto mais a ideia de ficar um dia longe de você,  sem seu abraço, seu cheiro. Lena... Eu te amo — Tentei me aproximar, mas ela me reprimiu.

— Não, não se aproxime de mim. E não, você não me ama, nem de fato me conhece. É, eu até pintei o cabelo mas pra representar tristeza que eu senti por você, é um azul triste Ben. Foi nisso que você me transformou. Foi VOCÊ, quem partiu meu coração. — sua sensatez ruiu, seu rosto se enchia de mágoa — A vida é um tabuleiro de xadrex, o seu amor por muitas vezes me deixou em xeque, até que eu finalmente aceitasse minha derrota. Você está em xeque, o que pretende fazer? — Eu estava parado, perplexo com suas palavras. Ela estava firme. Enxugou as lágrimas, e continuou — Sugiro que volte para seus contos de fadas, onde não pode se machucar, ou machucar à mais ninguém.

Naquele momento pude ver a verdadeira cor de seus olhos, em seus olhos tristes cor verde mel com traços castanhos, vi minha melhor amiga e primeiro amor virar as costas e ir embora. Eu sinto tanto...

Espero que você encontre a pessoa certa algum dia. Alguém cuja presença seja o bastante para amenizar sua dor* — disse ela, e isso acabou comigo.

Eu estava destruído, nunca senti tanta dor na minha vida, as lágrimas começaram a queimar em meu rosto em contraste com aquele frio que me sufocava. Me virei, e cada passo pesava uma tonelada, eu ia deixá-la, eu nao suportava, eu a machuquei, a pessoa que mais amava, nunca iria me perdoar, nunca.

— Ben! — Me virei rapidamente, confesso tive esperança. Ela segurava algo na mão — Eu escrevi essa carta, eu iria te entregar só não sabia se teria estômago para isso — peguei a carta e com força a apertei na mão, virei as costas e novamente continuei a caminhar. Andei cada vez mais rápido, e mais rápido, eu corri, eu fuji, se possível queria que a dor não me alcançasse, que o vento  frio que em meu rosto soprava, viesse e a levasse.

* Citação do anime Tonari No Kaibutsu-kun

Azul É A Cor Mais Triste - Empty Colors Vol. 1 Onde histórias criam vida. Descubra agora