A Prova de Jasão

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Dois dias depois o Argonauta já estava reparado e navegando. Tudo voltara ao normal, menos os sentimentos de Leonor. Seu coração batia forte sempre que ouvia a voz de Allister. Na maior parte do tempo ela sentia-se boba, desengonçada, deslocada. Nas noites apesar de sempre tratá-la com ternura e carinho ele permanecia dormindo na rede, o que a frustrou um pouco. Imaginava que depois da intimidade que haviam trocado em King Charles ele deixaria de lado toda essa formalidade e a acompanharia na cama mas ele permanecia distante, como se tivesse receio de se transformar em um monstro e atacá-la no meio da noite.
Mais dois dias se passaram. O tempo estava muito ruim naquela manhã e o mar, agitado. Leonor subiu ao convés, como fazia todos os dias afim de não pegar mofo trancada dentro dos andares inferiores, mas logo de arrependeu da decisão. O vento frio atravessava pelo xale de lá como se ele não estivesse ali.
- Senhorita Leonor, o que faz aqui em cima? - Booker perguntou, preocupado. - Vai acabar pegando um resfriado!
- Eu não consigo ficar confinada por muito tempo, você sabe disso. Sinto que no passado era uma pessoa reclusa, não sei dizer ao certo... - Ela tornou-se melancólica.
Booker a segurou pela mão, puxando em direção a escada para o andar inferior.
- Os rapazes estão fazendo uma pequena comemoração. Venha! - ele disse, ciente de que algo a tornara incomodada na conversa.
Lá embaixo o som da música enchia o ambiente. Um vapor delicioso de pão recém assado e peixe ensopado entrou pelas narinas de Leonor. Todos riam a cantavam, era uma grande família e ela sentia uma ponta de tristeza toda vez que pensava em ser separada deles.
Uma melodia alegre começou e Booker pôs-se a frente dela.
- Concede-me a honra desta dança? - ele perguntou.
- Booker, eu não sei dançar! Ou pelo menos não me lembro...
- Não se preocupe, Srta.Leonor. Nenhum de nós sabe!
O rapaz segurou uma se suas mãos, envolvendo com a outra a cintura dela e puseram-se a rodopiar pela sala, enquando os outros marinheiros cantarolavam e aplaudiam.

Allister saiu da cabine com os olhos cerrados. O tempo estava uma porcaria e o navio chacoalhava bastante. A maioria dos homens do turno se esforçavam para manter o barco estável, mas a tarefa era árdua. Uma chuva moderada caía e as ondas castigavam o casco com violência.
Ele balançou a garrafa de rum já quase vazia e desceu para apanhar mais na pequena adega da cozinha. Lá embaixo os homens festejavam e tocavam rabeca e acordeom. Uma roda havia se formado, Allister aproximou-se, curioso. Leonor e Booker saltitavam descoordenados, numa espécie de dança esquisita. Os dois sorriam com naturalidade, o que fez o rosto do capitão se fechar numa carranca mal humorada. Ele seguiu até a cozinha, pegando mais uma garrafa do destilado de sua adega pessoal.

A música parara. Leonor estava ofegante, mas havia se divertido muito. Quando Booker a soltou ela o reverenciou de uma forma afetada, fazendo com que os homens gargalhassem. Estava faminta. Ela se virou para sair da roda e sentar-se para saborear o ensopado, quando sentiu que Booker a puxava suavemente pelo braço, fazendo-a se virar novamente para ele. Estava bem próximo dela.
- Srta. Leonor. A algum tempo quero dizer isso. - Ele fez uma pausa, nervoso. - Me faltava coragem para dizer, mas não aguento mais e penso que se não disser isso para você antes que parta vou enlouquecer!
Ela já imaginava o que o jovem diria, e lamentava muito ter que recusa-lo.
- Booker eu... - Ela começou, mas foi interrompida pelo garoto.
- Por favor. Leonor. Deixe-me terminar. Não sei se terei novamente esta coragem. - ele a segurou pelas duas mãos. - Eu gosto muito de você, muito mesmo. Acho que te amo...
Os homens gritavam e assobiavam. Leonor o empurrou delicadamente, quando sentiu que ele era puxado de forma abrupta enquanto todos se calavam.

Allister estava furioso. Jogou o garoto no chão com um soco e montou sobre o mesmo, batendo furiosamente.
- Nunca mais se aproxime dela, entendeu? NUNCA MAIS! - ele berrava.
Jason e alguns homens o puxavam, tentando separar os dois. O pobre Booker já havia perdido a consciência e provavelmente um dente ou dois.
Leonor gritava, em desespero.
Com muito custo Jason finalmente conseguiu soltar o capitão do navegador.
- Acalma-se garoto! O que aconteceu?? - O velho perguntou, confuso.
- Eu mato qualquer um que se aproximar de Leonor, ouviram? - ele dirigia-se a todos. - Estripo o filho de uma vaca e penduro a pele no mastro principal, para que sirva de exemplo! - Gritava, furioso.
Todos ficaram em silêncio, apenas Leonor manifestou-se.
- Você é um idiota, Allister Turner! Um imbecil! - subiu as escadas cambaleando a cada onda que estremecia o barco.
Havia prometido a si mesma que tentaria entender o homem, mas isso já era demais!
- Leonor, espera! - Allister soltou-se dos homens que ainda o seguravam e a seguiu. Os ciúmes e a bebida haviam cegado sua razão.
- Eu realmente tento te entender, mas é difícil demais! Por que acha que tem direito sobre mim? De onde saiu com isso?
Ele a segurou pelo braço.
- Eu fiquei furioso... Não há perdão...
Ela puxou o braço.
- Me solte! Você pedirá perdão a Booker assim que ele acordar!
Ele tentou se aproximar mas uma vez mas ela puxou o braço novamente, recuando alguns passos.
Neste momento uma onda forte castigou mais uma vez a lateral do barco, fazendo Leonor perder o equilíbrio. Em um piscar de olhos ela era catapultada no mar revolto.
- LEONOR!! - sem pensar duas vezes Allister agarrou um pedaço de corda que estava enrolado em uma carretilha, envolvendo em sua cintura enquanto pulava na imensidão do mar, desaparecendo junto a amada.
Os homens puderam apenas assistir impotentes enquanto os dois eram levados pela forte correnteza das águas bravias.

Do Mar(FINALIZADO - Sem Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora