MEU ANJO DA GUARDA, DOUTOR HÉLIO
Há certas lembranças que jamais nos abandonam, por mais anos que vivamos ou por mais experiências, alegres ou tristes, que passemos. Assim se deu comigo: lembro-me da primeira vez - eu ainda criança, em Barão de Cocais, na zona siderúrgica mineira, cidade onde vivi dezoito anos e meio - em que ouvi o cântico de um tico-tico, o que me deixou pasmado. Achei lindo! Assim também a primeira vez que atentei para a beleza de uma flor chamada "bonina"; que vi na beira do rio; achei, aquela, a cor mais bonita do mundo, mas, depois, fui descobrindo outros cânticos de pássaros e outras cores de flores, e notei que o mundo possuía muitas belezas escondidas, que se iam revelando à medida que meus olhos iam se abrindo e eu começava a caminhar para estradas mais longe de casa. Depois, a descoberta dos livros para colorir, o cheiro dos lápis de cor e as gravuras de elefantes voadores, porquinhos, lobo-mau, os contos de fadas - reis, rainhas e súditos. Seguindo, passei para os gibis de faroeste, revistas de aventuras e de mistérios. Aos domingos, eu punha um monte de revistas (gibis) debaixo do braço e saía fazendo trocas com leitores de vários bairros, principalmente da vila operária, hoje extinta. As letras entravam em minha vida. Então, eu entrando na adolescência, meu pai foi trabalhar na siderúrgica, ficou amigo de um certo engenheiro chamado Hélio, para quem ele começou a fazer móveis. Doutor Hélio, homem culto, que eu, infelizmente não conheci, se pôs a presentear meu pai com coleções de Seleções do Reader's Digest, revistas, discos de música clássica e, principalmente, com obras de Monteiro Lobato. Reinações de Narizinho me cativou. Eu passava a mão no livro, arranjava um lugar bem sossegado no terreiro, abria o livro e viajava com Emília, Dona Benta, Visconde de Sabugosa e todos os personagens da fazenda. Tais leituras levaram-me a buscar livros mais difíceis, inclusive em inglês - língua que conheci no colégio e que me encantou como um cântico de pássaro - e, ao entrar no Caraça, foi o ápice da revelação literária. Lá, eu tive grandes professores de línguas (latim, inglês, português), de literatura, participei do grêmio literário, vim a conhecer autores exponenciais da literatura brasileira e mundial, participei de concursos, convivendo num meio excepcionalmente culto. Ao deixar o Caraça, as coisas das letras e do colégio estavam mais fáceis e de melhor apreensão. A entrada na universidade (Universidade Federal de Viçosa) foi um resultado natural de minhas aventuras literárias, mas, ao olhar para trás, lembro-me de meu desconhecido benfeitor e amigo Dr. Hélio que, inadvertidamente, apresentou-me às belezas das letras e, sem dúvida, deu um direcionamento à minha vida. Por isso, sempre lembro-me dele e digo; Obrigado, meu amigo, Dr. Hélio, onde quer que esteja! Você pavimentou a minha estrada literária e, porque não?, a estrada de minha vida!
LEMBRANÇAS DE UM PÉ-DE-POMBA:
Quando morava em Barão de Cocais, criança ainda, um dos meus hobbies prediletos (entre tantos outros) era andar, sozinho ou acompanhado, pela cidade e seus entornos; ia a Brumal visitar a igreja de Santo Amaro, que, na época, estava escancarada e entregue aos morcegos, ia à prainha de seixos (que procurei e não encontrei ao voltar depois de muitos anos [os construtores carregaram as pedras e a areia, segundo me foi dito, e a Vale contaminou a água do rio!]), ia a pé a Santa Bárbara, passando pela linha férrea, ia a uma localidade chamada Bau (que não consegui achar ao retornar), ia passear no aeroporto (que a Vale transformou em um enorme depósito), fazia demoradas caminhadas pelas plantações de eucaliptos, sem falar nas recorrentes estadas na porta da siderúrgica para observar o movimento dos passantes e as pessoas. Certa vez, eu estava andando na saída da cidade, na direção de São Bento, e notei uma infinidade de pessoas revirando uma enorme montanha de refugos da siderúrgica e perguntei o que era aquilo: "Algumas pessoas tiram seu sustento daí; estes refugos de aço e gusa são valiosos" - me responderam. Deste dia em diante, tornei-me um catador assíduo de refugos que, de fato, rendiam um bom dinheiro - e eu estava precisando tanto de din-din! (procurei pelo local onde fazia a catação e ele também desapareceu!) Entre tantas lembranças, uma das que mais me marcaram foi a visão da siderúrgica, que oferecia um belo quadro de onde minha família morava, na Vila São Geraldo; tanto durante o dia quanto à noite. Eu achava a companhia enorme, soberba, muito bonita. Após terminar meu curso de letras, principiei a escrever meus livros e estes fatos vieram à tona. Em meu livro de contos "Ruas Tortas" relato algumas destas passagens; espero que gostem..Um exemplo:
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MINHA INFÂNCIA FELIZ
Non-FictionEstes textos, que talvez, serão posteriormente apresentados em livro, descrevem fatos e personagens de minha infância/pré-adolescência/adolescência na cidade mineira de Barão de Cocais, onde vivi muitas alegrias e não me deixei marcar pelas tristeza...