Deslumbramento! Este foi o sentimento mais nítido de que desfrutei ao entrar, pela primeira vez, no estádio do Metalusina, criança ainda, andarilho, num ensolarado domingo de manhã. Estava acontecendo um jogo (Flamengo e Jabaquara) e eu fiquei pasmo com as cores fortes e vivas das camisas dos times, principalmente com as camisas listradas do Flamengo, com a enormidade do campo, com a verdura do gramado e a intensa participação da torcida que lotava a arquibancada. Era um mundo novo e, com a repercussão da vitória brasileira na Suécia em 1958, o futebol passara a fazer parte indelével do cotidiano de quase todas as pessoas e as crianças não passariam incólumes. Assim, após esta ocasião, eu estava sempre passeando pelo campo, assistindo a jogos e, com o tempo, especulando, aprendi o nome de posições dos jogadores (beque, lateral, meio-de-campo, etc.) e nomes de jogadores famosos e não-famosos e, embora não pensasse em ser técnico, vi-me, à medida que o "aprendizado futebolístico" avançava, várias vezes discutindo táticas de jogos empregadas por treinadores: 4-3-3, 4-4-2, 5-4-1, e outras. Como era inevitável, fiquei torcedor do time da casa – o Metalusina – embora o time não estivesse permanentemente na ativa. O Metalusina tinha uma camisa linda, com faixas verticais amarelas e azuis brilhantes, interpostas, e era formado, principalmente, por empregados da siderúrgica e era, segundo alguns, considerado um dos piores times do Brasil, embora fosse tradicional. Seu campo tinha o tamanho oficial da FIFA e era considerado um dos melhores do interior do Brasil, sendo, por isso, usado em competições oficiais da Federação Mineira de Futebol. Quando ia disputar campeonatos, o time era reforçado por jogadores de fora da cidade e apareciam tipos que chamavam a atenção. Houve, por exemplo, um centro-avante contratado pela diretoria, moreno, de meia altura, meio velho, cheio de carnes, que não saía dos bares e botecos e tinha uma barriga enorme e, estranhamente, fazia gols. Em dias de jogos, alguns dos atletas "estrangeiros" já chegavam ao campo vestidos em seus uniformes, embora houvesse um grande vestiário sob a arquibancada, e vinham abraçados a mulheres da cidade. Em minhas andanças pelo campo do Metalusina, fiquei amigo do senhor que cuidava do gramado (seria "seu" Alcindo o nome dele?) e ele costumava sentar-se comigo no muro do estádio e, olhando saudosamente para o gramado sempre bem cuidado, contava casos do glorioso time de sua paixão. Falava do beque que tinha um chute fortíssimo e que, certa vez, num "match" importantíssimo, apanhara a bola em sua defesa, viera ameaçando chutá-la sobre quem ficasse à sua frente e, temendo a violência de seu portentoso chute, seus oponentes deixaram o caminho livre para ele e, na frente do gol, após atravessar ameaçadoramente todo o gramado, ele fuzilara o goleiro, que tentara segurar seu chute, e foram parar os dois – o goleiro e a bola – no fundo da rede, o goleiro desacordado. Embora o estádio fosse um local de grande congraçamento, visto que apareciam muitos tipos engraçados e a alegria corria solta na arquibancada, algumas partidas terminavam em grande pancadaria e mais de uma vez muitos jogadores deixavam o gramado expulsos e com as camisas sujas de sangue. Após os jogos, era bom passear dentro do gramado, sentir a grama pinicando a sola dos pés, sentir o cheiro suave da relva, e sentir-se, ilusoriamente, por alguns instantes, um craque – o que estava tornando-se um sonho de toda criança. Em minha visita a Barão de Cocais, entrei outra vez, no estádio. Ele não está a mesma coisa que antes – está melhor! Continua enorme, bem cuidado, os muros pintados, ganhou bancos de concreto, potente iluminação noturna e, como sempre, rodeado por belas e numerosas árvores em suas laterais externas. Fiquei satisfeito de revê-lo deste modo; ainda bem que nenhuma mineradora o transformou em um galpão nem plantou eucalipto em suas dependências. Campo do Metalusina – um local icônico de minha infância!
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MINHA INFÂNCIA FELIZ
No FicciónEstes textos, que talvez, serão posteriormente apresentados em livro, descrevem fatos e personagens de minha infância/pré-adolescência/adolescência na cidade mineira de Barão de Cocais, onde vivi muitas alegrias e não me deixei marcar pelas tristeza...