Todo Mundo Tem Dias Nublados

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Você já teve uma daquelas manhãs em que logo ao acordar sente que vai dar tudo errado?

Eu passei um ano com esse pressentimento, meu primeiro ano junto com o João Pedro foi desse jeitinho, todos os dias surgia um motivo diferente para discutirmos, era um horror estar do lado dele. Claro que não era lá todos, mas a maioria, consigo contar nos dedos quantos foram nossos dias ensolarados.

O meu namorado era do tipo “sabe tudo” e eu odiava isso nele. Detestava a forma dele criticar tudo, e de sempre querer estar com a razão. Principalmente, odiava como ele me fazia chorar todas as vezes que me abraçava, todas as vezes que me pedia perdão por ser tão chato, e de como ele escrevia palavras tão bonitas sobre mim, que pareciam ter sido tiradas da internet, mas na verdade, elas só estavam guardadas no seu coração.

João Pedro também tinha pares de motivos para ter me deixado pra trás a mais tempo do que deixou. Eram tantas as coisas que ele não gostava em mim, que seria insuportável listar todas elas. Tipo eu chorar por tudo o que ele fazia. Odiava eu sempre reclamar sobre o clima, detestava quando eu criticava os filmes como se trabalhasse com isso a séculos, sendo que nunca trabalhei.

Nossa relação era mais do tipo amor e ódio, mas sem o amor, só com o ódio mesmo. As vezes tinha lá seus momentos calorosos, como os domingos que cavalgávamos pela vinícola, quando andávamos sem rumo pela cidade pequena no inverno, e confesso que me divertia quando o ajudava na loja de quadrinho nas sextas à noite.
Eu nunca me senti mal em lembrar dessas milhares de brigas, ou de naquela época tê-las cometido, pois nunca dormíamos de mal um com o outro, e todos esses fatos fortaleceram a nossa relação.

Nesse um ano de trocar alfinetadas, brigamos feio apenas uma vez, o que levou o nosso curto término.

Não me lembro bem qual foi o motivo da briga, se fosse o João Pedro a contar essa historia pra vocês ele lembraria, ele sempre se lembrava de tudo.

Era o último ano dele na faculdade de agronomia, não aqui na pequena cidade que morávamos, era na capital. Ele morava em um apartamento que dividia com outros três amigos, Ricardo, Luana e Mirela.

Mas enfim, acabamos brigando, era noite, e não ligamos para pedir perdão um para outro. Acordei no outro dia bem cedo, com J.P. na porta da minha casa, com o rosto pálido, olhos inchados e o carro cheio de malas.

“Olha, se quiser nunca mais olhar na minha cara, eu vou entender. É lógico que não suportaria ficar um dia sem você, mas não posso te obrigar”. O seu tom de voz me assustava, não compreendia o tamanho do seu desespero por causa do seu erro. “ O que aconteceu?”, perguntei desesperada, assim como ele.

Seus minutos seguintes de silêncio me matava por dentro, só fui acalmada por seu longo suspiro antes de começar a se justificar: “ é... foi a Luana, ela estava lá... eu estava com raiva, Madu, eu... eu... me perdoa, eu me sinto tão ordinário, não quero continuar com ela lá... peguei as minhas coisas, estou indo para casa, não posso ficar na capital, sendo que tudo o que me importa está aqui... e eu acabei de perder porque fui tão burro! Me perdoa? Não. Não responde, pense antes.” Antes mesmo que eu pudesse responder, João Pedro já tinha se virado e ido embora, murmurando um “Tchau Madu”.

Depois desse balde de água fria jogado em meu rosto na porta da minha casa, todas as minhas reações foram descartadas pelo meu corpo, chorar naquele momento não era alternativa, era só o que eu sabia fazer. O João Pedro tinha me traído e o que eu poderia fazer? Ele queria o meu perdão, e isso não sabia se podia dar, não naquele instante.

Depois que a poeira abaixou, umas duas semanas após a bomba atômica ser lançada diretamente na minha cabeça, meu pai conversou comigo, ele sempre foi compreensivo, e tão inteligente. Expliquei tudo o que havia acontecido, e ele chorou comigo como um melhor amigo faria. “Então você esta me dizendo que ele se arrependeu do que fez, e deixou tudo na capital só porque errou?” meu pai perguntou.

“ Se eu tivesse traído minha namorada, nunca que eu sairia atrás dela para pedir perdão, ela nem saberia.” Ronaldo, o namorado da minha irmã comentou, o que levou o término do namoro dos dois, e foi aí que eu me toquei, quem teria coragem de fazer isso?

Então é isso, o meu futuro só dependia de mim mesma, e chegar o mais rápido possível na vinícola.

Deixa Que Eu Te ContoOnde histórias criam vida. Descubra agora