Essas palavras... ah como eu as odeio. “Vocês ainda são jovens, podem tentar novamente daqui dois meses”, eu não preciso acrescentar muitas coisas para você já saber sobre o que se trata.
Nunca tivemos planos de ter filhos, só conversávamos algumas vezes sobre isso, sabe quando algum amigo nosso se tornava pai e víamos a alegria em seu olhar dizendo “você só descobre o que é amor verdadeiro quando tem um filho”, quem não quer sentir esse amor que tanto falam a respeito de uma criança com fraldas sujas?
E quando fiquei grávida a primeira vez foi o maior susto que já tomei. Se não me engano, estávamos casados a mais ou menos um ano e meio, e foram seis testes de farmácia que me confirmaram isso. Naquela hora eu me senti uma adolescente, o nosso casamento estava dando super certo, e naquela época não estávamos em pé de guerra (tínhamos acabado de sair de uma). Eu não imaginava qual seria a reação do João Pedro quando eu lhe dissesse, mas também não poderia esconder, alias, estávamos casados.
Nos morávamos em um apartamento no centro da cidade, e quando ele chegou levei um susto, não sabia aonde esconder os testes de farmácia. E se ele não quisesse o filho? Eu não o entregaria em um orfanato, de jeito nenhum. Foi aí que achei melhor contar logo, de uma vez.
“João!” gritei assim que sai do banheiro, seus olhos arregalaram parecendo mais como jabuticabas maduras. “É... eu tenho uma coisa para te contar”, ele riu me fazendo rir também (mas de nervoso), “pois estão, conte.” Ele sorriu mais uma vez e me lembro que no mesmo instante, comecei a imaginar ele como pai, este sorriso dizendo que ficará tudo bem quando algo de ruim acontecer com o nosso filhinho, quer saber? Talvez não seja má ideia ter um bebê.
“Eu estou grávida ... ou seja, esperando um bebê”. “Eu sei o que grávida significa” disse João Pedro com um sorriso no rosto enquanto resmungava “um bebê... um bebê”. “Você tem certeza?” perguntou depois de se sentar no sofá. “Porque se for... temos que comprar um berço, certo? Onde vamos colocá-lo quando ele nascer? Bebês gostam de nascer assim do nada.” Seus olhos brilhavam como as estrelas em uma noite na praia de Copacabana.
Em meu primeiro pré-natal confirmou tudo, ainda não dava para ouvir o coraçãozinho dele batendo, era muito pequenininho, mas foi um momento de sentar e aprender mais sobre esse mundo de mãe. Compramos um berço naquela semana, mesmo já sabendo que bebês não nascem com um mês de gestação, mas sempre é bom prevenir, certo?
No segundo pré-natal, o pequeno coração do meu bebezinho era tão audível como o barulho que fazia a festa em que eu e João Pedro nos falamos pela primeira vez, e era tão rápido, parecia um carro de formula um, eu torcia para que ele não estivesse a beira de um ataque cardíaco, por sorte a médica disse que era normal, crianças são agitadas mesmo.
Já o terceiro pré-natal, foi bem diferente dos anteriores. Tentaram nos ensinar como superar a dor de não ter mais um bebê de coraçãozinho agitado, diziam que é normal isso acontecer em uma primeira gestação. Pra mim não era normal, e nunca iria ser. Ninguém consegue ensinar como superar esta dor, é algo particular.
O bercinho ganhou outro dono. Paulo José, o irmão do João Pedro iria se tornar pai a poucos meses, e damos o berço para a Analu, sua filha.
É incrível como algo que não está nos seus planos, acaba acontecendo e desencadeia um objetivo novo em sua vida, mesmo que sem querer.
Como o médico nos orientou, dois meses depois tentamos novamente. Nada. Passou mês atrás de mês, até que em um belo dia de inverno... não, eu não estava grávida, mas minha irmã sim, do Gabriel.
Um ano mais tarde, a nossa hora chegou, um belo bebezinho a caminho. Era um menino. Não tínhamos decidido o nome, concordamos que olharíamos seu rostinho antes de escolher.
Infelizmente não tivemos a chance de ver seu rostinho, muito menos decidir seu nome. O parto foi algo complicado, e como naquela época as ultrassons não eram lá tão avançadas, só descobrimos quando o bebê nasceu, que ele tinha uma síndrome rara.
“Foi melhor assim” disse o médico “vocês são jovens, podem tentar daqui dois meses”. Eu não sabia se queria tentar novamente, mas ainda tínhamos a opção da adoção.
Só que também não deu certo, as agências de adoção acreditavam que pelo João Pedro ser dono de uma vinícola (sim ele era o braço direito do pai, que falecera um ano após nosso casamento), poderia causar alcoolismo precoce a criança.
O jeito foi continuar vivendo a dois. Bem... até ela aparecer.
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Deixa Que Eu Te Conto
Short StoryConta a vida que cada conto tem um gostinho diferente. Bem, acho que ela sempre está certa. Se você está entediado e procura algo emocionante... tcharam! Acabou de encontrar algo encontrável, mas difícil de se achar. Seja bem-vindo para rir, chorar...