CAPITULO 8 - MILLINS

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A adrenalina da perseguição ainda fazia com que a ponta dos meus dedos formigassem de ansiedade. Eu sempre persegui uma vida tranquila, sem altercações, brigas ou atividades ilegais—A parte da legalidade é bem subjetiva pra falar a verdade. Quer dizer: Quem nunca fez download de um filme? Ou músicas? Muitas pessoas não usam drogas recreativas e costumam as condenar, mas... É difícil resistir a pressão dos seus amigos, especialmente quando você quer impressionar aquela gatinha com suas habilidades... E falhar miseravelmente.

Tirando a parte dos comedores de gente assassinos que tinham nos perseguido a alguns minutos, a experiência de dirigir pelo deserto era bem relaxante. Sem tráfego, leis de trânsito, gordos nova-iorquinos gritando e outros espécimes estressantes. O que era um difícil era o calor. Parecia que o sol vinha de todas as direções ao mesmo tempo me fazendo suar por todos os orifícios possíveis.
– Pra onde a gente tá indo, tenente? - Perguntou Mike, se abanando com um tapetinho que estava no banco de trás.
– Pra uma cidadezinha. Daí a gente vai pro QG. - Respondeu a Tenente, que se abanava com um pedaço de papel dobrado.
– E você sabe onde fica? - Indaguei, desviando o olhar para a Tenente por alguns segundos.
Ela estava esticada no banco, com os pés em cima do painel. Agora sem seu colete a prova de balas, o mesmo repousava no chão do carro, ao lado de seu cantil. Sua camisa estava desabotoada e a curvatura dos seus seios fartos estava bem visível – Como já tinha observado antes, era uma linda mulher.
-- CUIDADO LUKE! - Gritou a tenente.
Eu desviei o olhar de volta para a estrada jogando o volante para a direita instintivamente. Por pouco não me chocando contra uma rocha.
Os segundos que seguiram pareceram uma eternidade. Minha mente foi a mil tentando processar uma desculpa esfarrapada caso eu fosse pressionado pelo motivo de não prestar atenção na estrada.
– Respondendo sua pergunta. Sei sim. Aliás, essa rocha que a gente quase beijou é um dos sinais que estamos indo no caminho certo.
– Ah, que bom – Esbocei um sorriso amarelado e sem graça.
Senti o meu banco ir levemente para frente devido a um chute desferido por Mike. Seguido por uma risada
– Ha Ha! Você não perdoa mesmo, cara! - Caçoou Mike.
Resolvi que seria melhor se eu não desse atenção ao comentário. Não tenho nada a ganhar assediando uma mulher armada.
A não ser um tiro, é claro.
– Tenente, você ainda não disse seu primeiro nome pra gente. – Comentou Mike, obviamente interessado.
– Não mesmo. – Balancei a cabeça apoiando o comentário de Mike.
– Carol, meu primeiro nome é Carol. - Respondeu a Tenente – É que gosto tanto de ser chamada de "tenente".
– Se for assim quero ser chamado de Cockzilla – Mike disse, com um tom extremamente confiante.
– Cock-o-que? – Perguntou Carol.
– Cockzilla! É o nome de um cara magreloo que nem eu que tem um Pa--
– É idiotice! – Disse em um volume extremamente alto, interrompendo.
Admito que a piada seria incrivelmente engraçada. Até ri um pouco por dentro.
Mas de novo: cuidado com mulheres armadas.
– Sabe o que seria legal agora? - Indagou Mike, se colocando entre os bancos da frente.
– Água? - Respondi.
– Uma gaita, tocar um blues.
– Acho que tenho uma aqui. – Disse Carol, tateando os bolsos da calça.
Depois de alguns minutos ela encontrou um objeto metálico, retangular e incrivelmente castigado pelo tempo. Ela estendeu a mão até Mike que agradeceu com um sorriso infantil de orelha a orelha.
Eu incrédulo tive de indagar:
– Porque você carrega isso, Carol?
– Presente do meu pai. Ele tocava muito essa, passava dias com isso na boca.
Pelo retrovisor vi Mike, com uma faceta repleta de nojo, tirar a gaita recém-posta na boca e a limpar com a blusa de forma discreta.
– Você sabe tocar, Carol? - Perguntou Mike, ainda limpando a gaita.
– Bem pouco. Eu sei tocar violão, no entanto.
– Que legal, a gente pode fazer um som depois. Eu sei tocar bateria – Disse, buscando ser inserido na conversa.
Mike terminara o serviço de limpeza e colocou a gaita na boca. Arriscando algumas notas, uma de cada vez.
– Pera, você sabe tocar? - Perguntei.
Mike deu duas sopradas na gaita emulando o som do que eu interpretei como sendo "sei sim".
Desviei meu olhar novamente para a tenente, balançando os ombros com sinal de indiferença. Ouvi o som de Mike molhando os lábios vigorosamente com a língua seguido do som de alguém limpando a garganta.
– Só espero que eu não fique com sede. – Disse Mike antes de começar seu show na gaita.
Os resultados foram melhores que esperados. Mike tocou de forma incrível algumas passagens de músicas famosas de Blues, Creedance e até Jazz.
O som agudo da gaita tinha deixado o ambiente mais leve. Admito que me empolguei e comecei a batucar no volante enquanto balançava minha cabeça para frente a para trás, soltando a voz em alguns momentos oportunos. Carol ao meu lado parecia ter se soltado um pouco mais, se permitindo alguns sorrisos entre notas destoantes da minha parte e tossidas de Mike.
O tempo passou ainda mais rapidamente enquanto estávamos distraídos. O sol já tinha diminuído a intensidade da sua ira quando Carol avisou que estávamos no fim de nossa viagem.
A cidade que tínhamos sido prometidos estava a vista. Era um aglomerado de prédios médios cercados por uma parede de concreto cru. No terreno vazio em volta estavam algumas guaritas, arame farpado e armadilhas de tanque. Parecia um lugar incrivelmente bem guardado. Um resquício de civilização talvez.
- Ô Luke, vai mais devagar. - Pediu a Tenente apontando para uma placa de "Reduza A Velocidade".
Foi o que eu fiz, desacelerei o carro para dez por hora enquanto entrava na estrada improvisada.
A estrada levava para um portão de ferro fundido guardado por alguns guardas mal encarados dentro das guaritas.
Desacelerei o carro completamente quando parei em frente ao portão fechado.
Um dos guardas saiu de dentro de sua guarita e foi até a janela do carro.
– Oi! - Eu disse, sorrindo.
– Cala boca, Luke – Disse a tenente esticando seu corpo por cima do meu, se dirigindo ao Guarda. – E ai, Billy! Pegou guarda hoje?
O guarda que antes demonstrava um gigantesco desprazer em nos ver agora sorria.
– E ai, Tenente! Pois é, o idiota do Lawrance resolveu ficar bêbado uma noite e caiu de cara num emaranhado de arame farpado, agora eu to aqui... – Respondeu o Guarda.
– Mas que grande imbecil! – A tenente riu – Você pode abrir pra gente? Eles são meus amigos. Vamos só reabastecer e dar o fora daqui!
– Claro, querida. Com prazer! - O guarda assoviou e fez um sinal com as mãos para o homem que ficava em cima do portão, sentado em uma cadeira de praia.
Com um ranger de quebrar os dentes o portão se levantou.
Acelerei para dentro da cidade e fui acompanhado pelo guarda que apontou para uma vaga de estacionamento ao lado da entrada.
– Estacione de ré, por favor.
– Que merda de serviço de Valet, hein? – Comentou Mike no banco de trás.
Foi um pouco difícil. Tive que fazer com que Mike saísse do carro e desse as direções para que eu pudesse estacionar corretamente. Quando o sinal de OK veio da mão de Mike desliguei o carro e botei a chave no meu bolso da frente, saindo do carro em seguida.
Pisei no chão de concreto salpicado de areia e minhas pernas responderam com um sonoro estalo. Aproveitei a situação para me alongar por alguns instantes. Abrindo os braços, me agachando e tocando a ponta dos pés com os dedos da mão finalmente parei quando senti os olhos repletos de julgamento de Carol e Mike recaírem sobre mim.

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