Capítulo 2

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            Com o término da temporada, minha rotina se tornou mais tranquila. Hoje é sábado, e eu já estou em casa. Decidi trazer todos aqui para casa. Meu treinador, para mudar um pouco sua rotina, sua filha, para paquerar quem quer que fosse. Senhora Marcella, minha italiana favorita, dona dos almoços e jantas mais maravilhoso do mundo, para nos alimentar, deixei que ela trouxesse seu pequeno filho, pequeno Lorenzo, para ficar com a mãe, e meus seguranças.

A casa é enorme, temos espaço para todos, e nunca vi meu lar tão cheio de vida. Confesso que estou adorando isso.

Farei um almoço no jardim para alguns convidados, isso se tornou minha rotina, em todas as férias. Meus amigos aparecem, alguns membros da família, e minha equipe.

Apesar de ainda ser 9 da manhã, já escuto as panelas no fogão, o pequeno Lorenzo brincando, e uma voz aguda irritante cantando alegremente em algum canto da casa. Desço as escadas de casa, e vou até a cozinha, estava lotada. A como é bom ter gente em casa.

— Bom dia Pessoal. — Disse, por cima de todo o barulho.
— Bom dia! — Disseram todos, e eu sorri.

A conversa estava a mil, mas eu decidi não participar de qualquer que fosse o assunto, vou diferenciar essa manhã, preciso ir visitar meu bebê e dar uma volta pela propriedade.

Caminho até meu celeiro, comendo uma maça e levando outra. Sim eu tenho um celeiro na minha casa, como eu disse, o terreno era grande. Meus vizinhos não gostavam muito de ter animais perto de suas casas, mas eu nem me importei. Apenas tenho meus amiguinhos bem próximo de mim, e ali é meu cantinho de paz.

Lá está meu pequeno Perseu. A única coisa que me faz lembrar de meus avós. Eles sempre amaram estar ao ar livre, e como uma boa descendente de italianos e brasileiros, acho que puxei isso deles.

Quando cheguei ao celeiro, entrei tranquilamente, e cumprimentei a veterinária, ela cuidava bem dos meus amiguinhos, então eu confiava nela.

Me aproximei do único cavalo preto que estava quieto, e assim que ele me viu, se agitou.... Meu sorriso não cabia em mim, estava tomado em meu rosto.

— Oi meu garotão, como você está? — Pergunto, acariciando sua crina. — Que tal dar uma volta? — Digo, o guiando para fora.
— Senhorita Bernardi, Perseu não está cooperando muito, em seus passeios não permitiu que eu colocasse a cela nele. — Disse a veterinária, e eu apenas ri.
— Não se preocupe Gabi, esse pequeno arteiro é sempre assim, não gosta de nada o prendendo. — Pisquei, e sai de lá, com meu lindo ao meu lado.

Dei sua maça, e continuamos andando. Pouco tempo depois, percebi a impaciência do cavalo, e sabia exatamente o que ele queria. Montei, me segurei nele, e sussurrei um "Vai em frente", dando pequenos e fracos tapinhas em seu pescoço. E com alivio, talvez, ele corre, junto comigo, até os limites da propriedade. E é nesses momentos, que eu me sinto mais livre do que nunca.

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Já se passava das 11 quando voltei para casa. O almoço seria pouco mais da uma da tarde, mas alguns amigos já tinham chegado, e como sempre, estavam acabando com minha casa.

— Se querem detonar minha sala, por favor, deixem pelo menos a as coisas de valor intactas. — Observo todos me olharem, não eram muitas pessoas, mas o suficiente para atormentar e destruir um belo sofá, pela quinta vez.

Lorena estava no ombro de Kaio, meu amigo de longa data, que estava correndo atrás de Sophi, sua namorada e minha melhor amiga, que nesse momento estava em cima do meu sofá cor de creme, pulando feito uma gazela, próximo ao treinador que ria com o pequeno Lorenzo no colo, e alguns dos seguranças ao redor, tentando escutar o jornal que passava na televisão. Estava um caus.

— Livy! — Berrou a Sophi, correndo atrás de mim, me derrubando e me enchendo de beijos.
— Meu Deus, me larga sua louca. — Reclamo rindo, era sempre a mesma coisa.

Depois de me soltar eu dei um beijinho no pequeno, que riu e continuou a brincar com o treinador, e abracei meu amigo. Mas percebi que tinha alguma coisa no ar, mesmo com todo aquele clima de brincadeira.

Kaio é advogado, ele é um dos únicos que sabem sobre minhas lutas, e sempre me mantem informada sobre esses lances de Justiça. Apesar de ter só seus 25 anos, era um dos melhores em sua área, era sério, mas brincalhão em seus momentos, e era bom para minha amiga, apenas por isso continua sem um olho roxo.

Sophi, minha melhor amiga de 23 anos, mas com mentalidade de 10, é a melhor. Animada, extrovertida, brincalhona, confidente e principalmente companheira. Essa vaca em forma de gente é a única que conheço que sempre vê minhas lutas e adora sempre. Completou a faculdade de fisioterapia a pouco tempo, e está trabalhando algumas vezes na semana na academia militar que fica próxima à cidade.

Eles me olhavam estranhamente, e isso estava me incomodando, apontei para cima, e disse "agora". Então fui para meu quarto, separar a roupa que usaria essa tarde. Escutei seus passos atrás de mim, e alguns sussurros, quase impossíveis de identificar.

— Amiga, temos que te contar coisa. — Sophi disse, meio sem graça.
— Falem.
— Meu primo está vindo para esse almoço, queríamos te apresentar para ele. E o pessoal da escola mandou essa carta enquanto estava na sua viagem. — Disse me entregando.

Era só o que me faltava. Durante os dois anos em que trabalho lá, quase de graça, nunca me mandaram nada, apenas me davam o salário e mais nada. Não que eu esteja reclamando, mas estou me perguntando para que isso. Encaro o envelope, e olho para o Kaio, sempre que chegam correspondências desse tipo dei a permissão para que ele lesse. Ele apenas deu de ombros, nervosamente.

Respirei fundo, e abri.

Quando terminei de ler, quase tive a porra de um infarto. Mas que porra esse cabeça de vento do diretor está fazendo? Como ele é capaz de cancelar a verba de um dos esportes mais procurados da escola só para investir na porra de uma estátua sem significado nenhum para os alunos? O que vai ser dos meus alunos que eu vejo um futuro no maldito UFC??? Afinal, eu posso não ter essa chance, mas eles sim.

A parte que mais fodeu minha mente, apesar de tudo foi: "... suas atividades estão temporariamente interrompidas, pedimos que venha buscar seus materiais na segunda feira, e assinar demissão...", e vários outros blá blá blá. Eu vou matar aquele maldito.

Meu ódio começou a me consumir, e sempre que isso acontece, dá merda. Ou eu quebro a casa toda, ou fico horas dentro da academia.

— Cancele o almoço, ou faça, foda-se. Quebrem a casa, botem fogo, só não me atrapalhem nas próximas horas. — Digo, raivosa.

Assim que joguei a carta amassada neles, coloquei minha roupa de treino, enfaixei minhas mãos, e desci. Passei esbarrando em tudo e em todos, sem me importar em pedir desculpas. Quando estava saindo pela porta, esbarrei com uma parede de músculos desconhecida, mas estava vendo tudo vermelho de tanta raiva, que apenas o empurrei e continuei meu caminho para meu centro e descontar esse ódio. Não acredito que fui demitida por uma babaquice de um diretor inútil, que gasta dinheiro dos outros a para alegrar a si mesmo e não aos alunos.

— Ei, vai com calma.

Se eu não estivesse prestes a socar o cara, por segurar meu braço, eu teria prestado mais atenção naquela voz, e nele.

— É melhor me soltar antes que se torne meu saco de pancadas, e saia da minha casa, eu nem te conheço.

Recuo, sem me importar com sua risada.

— Não liga cara, ela recebeu péssimas notícias. — Kaio disse em voz baixa.
— Sem problemas, já vi como ela pode fazer um estrago sem estar irritada, imagine assim!

Espera! O que? Depois preciso ter uma conversinha com esse filho de uma mãe que se denomina meu amigo. Corro para o galpão, e já começo minha sessão de socos.  

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