(Narrado por Milena)
"Rita, dá pra você vir aqui na minha sala, por favor?"
Após assentir com uma voz um tanto chorosa, Rita Lina desliga o telefone do outro lado, e eu a aguardo. A cabeça está tão cheia. Sávio nem imagina que eu sequer dei início aos procedimentos para ajudá-lo a se desapaixonar da Anna. Não tenho a mínima ideia do que fazer. Minha criatividade para ter um bom plano deve estar de férias, e sem previsão de volta. E ainda tem meu pai prestes a retornar para o Amapá com Dana e as gêmeas.
Rita bate na porta.
"Entra", autorizo.
Ela entra lentamente, segurando um lenço usado na mão. O rosto está úmido e vermelho, assim como os olhos.
"O que é que cê tem? Tava chorando? Ou tá gripada?", indago, preocupada.
"É o novo álbum da Adele", explica ela, crispando os lábios como alguém que está tentando controlar uma forte emoção, mas desata a chorar outra vez.
Como patroa, eu poderia ser bem grossa e condenar esse comportamento, mas em se tratando de Rita Lina, é necessário ter muita paciência e compreensão com a sensibilidade alheia.
Ela chora por quase dois minutos inteiros, até dar uma aliviada e ficar apenas fungando. Parece que precisa de outro lenço, já que o que ela segura está tão ensopado que já começa a pingar no chão da sala. Aí já é demais!
"Desculpa, dona Milena. Em que posso ajudar?"
"Preciso que você saia pra comprar uma resma de papel, por favor".
"Tudo bem. Mais alguma coisa?"
"Sim. Por favor, quando for ouvir Adele, evite ter objetos cortantes por perto, entendeu? Só isso".
"Desculpa mesmo. É que os Valpixianos otimizaram minha sensibilidade em 100%, então as minhas emoções são muito mais intensas".
"Nesse caso, não precisa vir trabalhar quando estiver de TPM", eu brinco, só para não cortar a onda dela e suas viagens psicóticas com seres de outro planeta.
Ivan surge, deixando apenas a cabeça à mostra pelo vão da porta que ficou entreaberta. Ele sorri, com a sobrancelha erguida, dando a entender que quer entrar.
"Mas que surpresa, amor!", digo, entusiasmada.
Ele entra, depara-se com Rita tentando se recompor.
"Tô atrapalhando alguma coisa? Posso esperar aqui fora".
"Eu já tô saindo, moço", explica Rita, fungando irritantemente, além de soluçar. "Com licença, dona Milena".
Ao passar por ele, Rita se detém, encara-o como se o estivesse reconhecendo. Mas, ao que parece, estou enganada, embora Ivan tenha um ar meio assustado no olhar. E Rita aproveita para soltar a seguinte e intrigante pérola:
"Com todo o respeito, mas o seu cérebro é lindo! Conheço gente que daria tudo por uma belezinha dessas".
E se retira, com seu lenço deixando pequenos rastros de lágrimas pelo caminho.
Ivan e eu nos entreolhamos, a cara dele impagável pela primeira interação com a minha secretária temporária.
"Não liga pra ela, Ivan. Ela só tá supersensível porque tava escutando Adele".
"Ah, eu vou ligar sim. Ninguém jamais elogiou o meu cérebro. Até que enfim alguém reconheceu todos esses anos de trabalho duro".
Rimos. O senso de humor de Ivan sempre em prontidão para me proporcionar momentos tão agradáveis. Ele chega mais perto e me dá um abraço apertado. Ivan é tão atencioso!
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DESAPAIXONANTE-- 2a Temporada
HumorContinuação da websérie literária Desapaixonante