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Devia ter escolhido outro dia para ir até a academia. Estava com um mau humor de matar por causa da discussão com Harry. Não estava preparada para ser simpática com ninguém naquela altura do dia, mas precisava ser.

Entrei pelas portas da academia e já me arrependi de estar ali. O lugar estava enfestado de patricnhas e mauricinhos, a pior raça entre os seres humanos.
Não era só um CT de lutas como eu imaginava, a parte inteira inferior do prédio era coberto de aparelhos de musculação, anilhas de peso, alteres, esteiras, bicicletas e todos os tipos de aparelhos imaginaveis para emagrecer e ganhar massa muscular. A academia era de ultima tecnologia, cheirava a novo e tinha as paredes decoradas com fotos dos maiores lutadores da história.

Bem na entrada encontrava-se um balcão para registros e pagamentos, assim como uma roleta por onde os alunos entravam. Daquele ponto em especifico eu podia ver uma escadaria que levava para o segundo andar, e nela havia um quadro cheio de medalhas, fotos e artigos de jornais que eu não conseguia ler de e identificar de longe.

-No que posso lhe ajudar?- perguntou uma garota com um olhar tão arrogante quanto o meu.

Olhei para ela tentando entender qual o motivo dela estar falando comigo daquele jeito.

-Vim falar com o Sr...- como era mesmo o nome dele?- Com o dono da academia.

Ela revirou os olhos, não gostando nem um pouco da minha presença ali.

-Você esta falando do mestre Alexandre?- disse ela.

Não gostei da forma como ela me olhava, nem do jeito que ela chamava ele. Mestre? Que tipo de pessoa chamava alguém assim?

-Mcgregor?- disse um homem chamando nossa atenção.

Olhei para Alexandre, que me encarava com as mãos na cintura. Ele estava com um sorriso estampado no rosto e vestia uma roupa estranha de tecido grosso e pouco maleável.

-Deixe ela passar Pan.- disse ele estendendo a mão na minha direção. – Vem garota quero lhe mostrar melhor a minha academia.

Pan, a garota de pouco bom humor, apertou um botão em cima do balcão liberando a minha passagem. Eu não estava com roupas adequadas para o ambiente, vestia meu jeans rasgado nos joelhos, minha camisa do Batman e meu all star surrado. Não pensei que teria que usar roupas especificas para o trabalho, muito menos que teria que usar roupas tão colantes como todas as outras garotas no ambiente.

Ele me levou direto para as escadas e me mostrou todas as medalhes que ele tinha ganho no decorrer da sua carreira como lutador de jiu jitsu. Me contou sobre tudo que fez para ser quem era, e como tinha sido difícil de montar aquele lugar. Em poucos minutos ele me fez ficar mais a vontade, me mostrando onde largar minha mochila e explicando mais como funcionava o seu lugar sagrado.

O andar de cima era quase que completamente um tatame, com exceção da sala de treinamento funcional, os vestiários femininos e masculinos e duas salas que ficavam mais ao fundo. O resto todo era coberto por uma espécie de colchão amarelo de contornos azuis. Um tatame enorme e cheio de alunos se agarrando no chão.

Todos eles vestiam o mesmo traje que Alexandre, alguns em azul, outros em branco, mas a maioria em preto. Com faixas de diversas cores amarradas na cintura. E todo mundo parecia compenetrado em arrancar alguma parte do corpo de alguém, como se aquilo fosse sagrado. Não se ouvia som nenhum além de respiração, o som dos corpos estalando no chão e a música que tocava no ambiente.
Aquilo era ACDC? Eu já estava gostando daquele lugar.

-Tempo!- gritou Alexandre ao meu lado me fazendo dar um pulo.- Formação!- disse ele depois.

Como num passe de magica todos os alunos se soltaram e levantaram rapidamente. Cada um arrumava seu traje até que ele ficasse completamente aninhado, assim como desamarrava a faixa e a amarrava de novo para que ficasse correta. Depois ele ficaram em fileiras, mas não simplesmente como robôs, parecia que cada um tinha um lugar especifico na fila, e não demorei para perceber que era a cor de suas faixas que diziam como eles deveriam se posicionar na fila. Assim que todo mundo ficou no lugar correto eles viraram para Alexandre, que tirava as sandálias e entrava no tatame como um leão em frente a sua matilha, e o reverenciaram como se ele fosse algum rei.

-Belo treino turma. Até amanhã.- disse ele. E como num coral ele gritou junto com todos os alunos.- OSS!

Um por um, cumprimentou o professor, com um bater de braços nas laterais do corpo e um reverencia, como se fossem todos militares e Alexandre seu superior. Depois formaram uma nova fila ao lado de Alexandre para receber dos seus colegas menos graduados o mesmo comprimento que o professor recebia. Foi só ai que eu percebi a ordem das cores das faixas, primeiro vinha os pretas, que eram dois além de Alexandre, depois os quatro marrons, em seguida os sete roxas, mais doze faixas azuis e oito faixas brancas. Eu não sabia o que diferenciava os das mesmas cores, mas parecia que alguns tinham alguma superioridade em cima de outros.

Deixa-me explicar melhor. Entre os quatro faixas marrons tinha um que era superior aos outros, como se ele fosse mais graduado mesmo que tivesse a faixa da mesma cor que seus outros colegas. Até a sua postura era diferente em meio aos outros, a forma como ele caminhava ereto e sorria com confiança.

E se eu tinha gostado da forma como via Nathan se mover, fiquei maravilhada com a sagacidade nos movimentos daquele faixa marrom. E mesmo que eu tivesse que perder um braço naquele lugar queria um dia ter aquela confiança que ele tinha.

Assim que eles terminaram os comprimentos e aos pouco foram saindo de cima do tatame vi que eles, além de reverenciar Alexandre, reverenciavam o tatame. Como se aquilo fosse algo completamente sagrado para eles. Havia respeito, disciplina e gratidão na atmosfera. Mesmo com eles completamente cansados e com aspecto de detonados eu podia sentir que para eles qualquer esforço compensava estar ali. Eles não lutavam por que achavam legal, aquilo era um estilo de vida para eles. Quase uma religião.

Foi naquele segundo que me apaixonei pela primeira vez por aquele mundo. Não havia ninguém sendo babaca, parecia que todo mundo tinha o mesmo objetivo, mas mais do que isso, parecia que eles estavam dando tudo de si por um bem maior.

-Nem acredito que você veio.- disse Nathan sentado num dos bancos que margeavam o tatame, onde a maioria dos homens e mulheres largavam a parte de cima de suas roupas e pegavam seus pertencesses para depois ir para os vestiários.- Achei que você ia desistir antes mesmo de começar.

Revirei os olhos para ele e depois sentei do seu lado.

-Eu pareço do tipo que desisti?- perguntei a ele com ironia.

El sorriu e eu desviei o olhar. Ele ficava bonito de mais quando estava com aquela roupa e ria daquele jeito. Não queria ficar como aquelas garotas da faculdade, mas foi difícil não corar com o gesto simples dele. E aquilo me fez gritar de ódio por dentro. Definitivamente eu não era mais aquele tipo de garota, mas alguma coisa em Nathan tinha despertado a antiga Anne em mim.

Nathan levantou e tirou a parte de cima da sua roupa. Enquanto eu encarava o chão ao mesmo tempo que meu coração acelerava no meu peito, maldito garoto.

-Ei Nathan!- gritou Alexandre do centro do tatame.

O garoto mal teve tempo de ver e logo Alexandre jogou algo na sua direção. Eu não consegui ver muito bem o que era até que Nathan segurasse em suas mãos com o reflexo de um gato. Ele olhou para o pacote transparente que guardava uma faixa roxa, sem entender o que ele queria dizer, mas logo voltando a olhar para Alexandre com uma ruga entre as sobrancelhas.

-Meus parabéns!- disse Alexandre para ele.

Foi então que Nathan me surpreendeu mais uma vez. Seus olhos se encheram de lagrimas e um sorriso enorme se espalhou em seu rosto.

-Obrigado Mestre.- disse ele reverenciando mais uma vez.

Eu fiquei ali olhando aquela cena sem entender nada, como se tivesse atrapalhando alguma coisa intima entre os dois, mas ao mesmo tempo gostando do que estava vendo.

Nathan colocou de volta a parte superior da sua roupa e depois amarrou a nova faixa na cintura com força. Dava para ver como ele se sentia orgulho em carregar o tecido na cintura, mas jamais esperei que alguém como ele chorasse sem nenhum tipo de vergonha na frente de todo mundo. Assim que seus colegas de treino saíram do vestiário e viram ele no tatame abraçado em Alexandre começaram a assobiar e gritar parabenizando o garoto pela conquista.

Só ali entendi que ele tinha sido graduado.

Quase, sem quererOnde histórias criam vida. Descubra agora